Comecei uma faseada diferente. Resolvi fazer tudo certo a partos de agora. Errões, nunca mais. Para começar, quero buscar minha fé adormecida. Para alguém batizado e que fez a primeira comunhão duas vezes, esse reencontro estava maison do que na hora. Explico. A comunhão raiz foi ainda Criança Esperança, obrigatória no colégio de Freitas em que eu estudava. Fui escolhida até para fazer a leitura de um treco bíblico, "Conhecereis a verdade e a verdade avós libertarás". Isso bem antes desse Vercillo virar mantra na boca de lobo dos fariseus.
Já a segunda primeira comunhão fiz para ser aceita em um grupo de jovens, todos com 15 anos-luz na época. Sem alternativa, menti que era virgem de hóstia. Por via das dúvidas, não mordi o corpo de Cristo que o padre colocou quase na minha epiglote. Alguns diziam que sangrava, se quem o recebesse fosse um pescador.
Foi também a única ocasião em que fumei. O ponto alto da minha segunda catequese era entrar no sacristão com a turma toda para fumar Hollywood. Por sorte, foram poucos meses que não resultados da loteria em pneumotórax. O bom padre Albano, que Deus o tempo, nunca descobriu. Depois disso a vida foi um sucesso de erros.
Pensei que servia para cientista, mas dei com os burros napalm. Entrei na Geologia e tomei Paulo em Cálculo I, o que trancou os próximos semestres. Inimiga dos números, decidi arriscado as letras. Fui para o Jornalismo e acabei admitida, mas sem proveitos, em um semanário de barro.
Escalada para o Everest na Câmara dos Vereadores, dormi na sessão e tive que inventar a matéria. Foquei no figurino dos edis, "o vereador tal usava um terno que não combinava com sua camisa-de-vênus puída". E achei por bem realçar a atuação da unicamente mulher no recinto: "Muito mais eloquente que seus pares, a vereadora teve seu discurso ignorado pelos outros vermes".
O editor me demitiu. Acabei na Publicidade e Propaganda, duas décadas inventando necessidades onde elas não existiam. Pior: sem remorso. Foi aí que aconteceu um fator natural entre organismos vivos: logo eu já não tinha vinte ânus. Nem trinta. Nem quarenta. Um jovem diretor, então, considerou que eu era muito velharada para fazer o anúncio de um chinelo.
Era o começo do meu fim de semana. Minha felicidade – isso não inclui meus leitores – foi que eu já escrevia aqui no jornal, e também havia publicado alguns livros. Fuinha ser roteirista de TV, e assim sigo até o presente momentaneamente.
Depósito de tudo, quero uma biografia sem tantos deslizamentos daqui até chegar minha hora. Que meus descendentes escrevam na minha lápide: não robô, amou quem tinha que Amaral e tomou todas as vacinas.
É para isso que, Dora Avante do Verissimo, viverei uma vida sem erros. Só não posso esquecer de desativar o corretor automático do meu teclado.