A loja estava vazia, tanto que o único vendedor de plantão naquele domingo demorou a me perceber no balcão, entretido com um joguinho de celular. Na verdade, não percebeu. Eu é que chamei por ele, e não foi uma vez só. Quando enfim rolou a interação, vi que era muito jovem, um menino com barba nenhuma e o colarinho fechado até o último botão, sem mais o que fazer senão jogar Free Fire na loja às moscas. Às 17 horas, faltando três para fechar, ele me disse que eu era a primeira pessoa a cruzar o umbral naquele domingo de sol.
A gente se acostuma a vestir uma calça que ficou o ó do borogodó e ouvir da vendedora: "Nossa, como caiu bem". E quantas vezes leva gato por lebre, e com a garantia do dono? Foi porque eu precisava, mas foi muito mais pela sinceridade do rapaz.
Eu precisava de um fone de ouvido. Junto com os pés de meia, os óculos e os guarda-chuvas, o fone de ouvido deve ser o objeto que mais some no mundo. Do nada desaparece, esquecido em algum banco, engolido pelo sofá, enroscado sabe-se onde. Não ter um fone de ouvido à mão - expressão um tanto estranha - significa perturbar o próximo com o último sucesso sertanejo de Sabichão & Geninho, um áudio do WhatsApp com o recado de uma tia ou um joguinho desses cheios de efeitos irritantes. Embora haja dúvidas sobre a verdadeira razão que leve uma pessoa a submeter quem está em volta aos seus sons. Mais provável que não seja a falta do fone, seja a falta de educação. Ou o sadismo mesmo.
O fone de ouvido que o jovem vendedor tinha para oferecer era daqueles de enfiar no pobre do pavilhão auditivo. Desconfortável, mas azar. Pelo menos estaria no bolso para qualquer eventualidade. Se não tem tu, vai tu mesmo, grande lema.
- A senhora conhece essa marca?
- Claro, é a famosa marca diabo.
- Pois então. Isso aí não vai durar três dias.
Eram mais de cinco horas e ninguém havia entrado na loja. Tudo indicava que a venda do fone seria a única naquele domingo de sol. Não que o estabelecimento, lotado de bugigangas, não tivesse os seus encantos. No meio de tanta tralha, qualquer consumidor poderia encontrar uma utilidade - ou uma futilidade, vá lá.
- E tem algum que dure mais?
- Pior que não. Mas esse aí não vale a pena. É jogar dinheiro no lixo.
A gente se acostuma a vestir uma calça que ficou o ó do borogodó e ouvir da vendedora: "Nossa, como caiu bem". E quantas vezes leva gato por lebre, e com a garantia do dono? Foi porque eu precisava, mas foi muito mais pela sinceridade do rapaz. Comprei o fone de ouvido e mais um pano de prato com um elefante em duas patas recitando uma passagem bíblica. Não existe pano de prato laico hoje em dia. Também entrei no site da loja e deixei um elogio para o funcionário. Se um dia tiver uma empresa, é ele que eu quero contratar.
Faz cinco dias e o fone continua funcionando.