Os direitos das mulheres caminham a passos lentos, nem sempre acompanhando as evoluções da sociedade. Até 1962, era vedado a elas viajar sozinhas e trabalhar fora sem a autorização do marido. Foi só a partir do Estatuto da Mulher Casada que estes e outros direitos foram garantidos por lei. Para quem acredita que o poder patriarcal é coisa do século passado, pasme: até março deste ano, as mulheres precisavam ter o aval do marido para realizarem o procedimento de laqueadura tubária.
Pois é, em pleno 2022, a decisão sobre planejamento familiar ainda estava nas mãos dos homens. A mudança foi aprovada pela Câmara dos Deputados e, até o momento, segue em tramitação no Senado Federal.
Se até as leis, às vezes, parecem ter parado no tempo, imagine a mentalidade de quem teve uma criação mais tradicional, que mantém a instituição matrimonial como algo sagrado, na qual a esposa deve obedecer ao marido sem discutir. É o caso de Tenório, personagem de Murilo Benício na novela Pantanal. Casado com Maria (Isabel Teixeira), adotou o apelido de Bruaca para se referir à esposa, fato que ela sempre tolerou.
– É uma relação de violência emocional, onde o outro aniquila a autoestima da parceira para que ele possa realizar suas fantasias em outros lugares – aponta a psicóloga Andréia Alves, colunista da seção Falando de Sexo do DG.
De uns tempos para cá, no entanto, a submissão começou a cair por terra. Após descobrir que o marido mantinha outra família, Maria passou por um processo que mistura raiva, culpa, dúvidas e crises existenciais.
– Vem uma raiva de tudo aquilo que o outro destruiu e ao qual ela se submeteu, ela começa a tirar forças para reagir – explica a psicóloga.
Nas redes sociais, os fãs da novela vibram com cada passo dela para longe do casamento falido e chegam a comemorar até as traições, vistas aqui como um "troco bem dado" ao marido enganador.
Em uma relação repleta de humilhações, o caminho da traição é mais comum do que se imagina, explica Andréia:
– Quando alguém começa a enxergá-la, se sente existente, que ela gera também emoção no outro, que há uma mulher bonita dentro dela, começa a ter forças para reagir.
Maria Bruaca não está sozinha nesse processo de libertação. Em novelas anteriores, personagens submissas também enfrentaram o rompimento das amarras que as prendiam a relacionamentos tóxicos e abusivos. Relembre!
/// Um apelido depreciativo também fazia parte da rotina de Iolanda (Eliane Giardini) em Renascer (1993). Chamada por Teodoro (Herson Capri) de Dona Patroa, ela aceitava calada as humilhações, mas só até se aliar a Joaninha (Tereza Seiblitz). Juntas, as duas armaram uma arapuca para o Coronel, que teve a lição que merecia.
/// Em exibição no Vale a Pena Ver de Novo, A Favorita (2008) traz de volta a história de Catarina (Lilia Cabral), vítima da violência do marido, Leonardo (Jackson Antunes). Com a ajuda de Stela (Paula Burlamaqui), a dona de casa colocou fim ao histórico de abusos e se libertou do canalha. Apesar de se envolver com Vanderlei (Alexandre Nero), é com Stela que Catarina resolve se aventurar pelo mundo, viajando e aproveitando a vida como merece.
Na inesquecível trama de Tieta (1989), um dos personagens mais odiosos era Zé Esteves (Sebastião Vasconcelos, 1927 – 2013), que mantinha as filhas e a esposa sob seu domínio. Quem mais sofria nas mãos do marido era Tonha (Yoná Magalhães, 1935 – 2015), mas a virada veio em grande estilo.
Com a ajuda e o incentivo da enteada Tieta (Betty Faria), Tonha ganhou um banho de loja e recuperou sua autoestima. Não à toa, a mudança da personagem tinha como trilha sonora a canção Nova Mulher, de Simone: “Quero ser assim, senhora das minhas vontades e dona de mim”.
/// O conto de fadas de Clara (Bianca Bin) virou pesadelo ainda na lua de mel. A mocinha de O Outro Lado do Paraíso (2017) conheceu o lado violento e possessivo de Gael (Sérgio Guizé). Ainda pior do que o filho, Sophia (Marieta Severo) prendeu a nora em um manicômio durante anos. Ao conseguir escapar, Clara voltou à cidade poderosa:
– Vocês não imaginam o prazer que é estar de volta.
Muita gente foi alvo dessa vingança, incluindo o ex-marido abusador.
/// Em Fina Estampa (2011), Celeste (Dira Paes) justificava todas as humilhações que sofria do marido, Baltazar (Alexandre Nero). Porém, quando Griselda (Lilia Cabral) ficou milionária, ajudou a levar a vida da melhor amiga junto para o topo, dando o empurrão de que Celeste precisava para se livrar do machão que a oprimia.
/// Em Paraíso Tropical (2007), Ana Luísa (Renée de Vielmond) fingia não ver as traições do marido, Antenor (Tony Ramos). Fabiana (Maria Fernanda Cândido) e Bebel (Camila Pitanga) foram algumas das amantes do rico empresário, que não se preocupava em esconder as puladas de cerca. Ana Luísa sofreu, mas acabou dando um basta no casamento e encontrando o amor nos braços de Lucas (Rodrigo Veronese), com quem adotou um menino.