Foi o Big dos Bigs porque reuniu, de modo organizado pela primeira vez, celebridades e anônimos, camarote e pipoca, num elenco controverso e diverso, gerando conflitos desde a estreia. Dessa vez, não teve período de trégua para apresentação e enturmamento. Na largada, houve panelinhas e louça quebrada, houve perseguição e ofensas. As semanas iniciais inspiraram aflição e ansiedade no lado de fora, pelo abuso psicológico e terrorismo de fofocas do grupo apelidado de “Gabinete do Ódio”, que culminou com a desistência de Lucas Penteado, que não aguentou o isolamento e as críticas sistemáticas ao seu comportamento.
Foi o Big dos Bigs porque representou a edição mais longa, com cem dias, mais do que os tradicionais três meses.
Foi o Big dos Bigs porque o programa contou com recordes de rejeição como nunca antes. A rapper Karol Conká quase alcançou 100%, com inacreditáveis 99,17% dos votos em sua saída, seguida do humorista gaúcho Nego Di, com 98,76%, e da youtuber Viih Tube, com 96,69%. O paredão triplo se reduziu a um único alvo.
Foi o Big dos Bigs porque o pernambucano Gil também quebrou uma escrita e obteve a menor rejeição da história, com 0,29% dos votos. Tornou-se o menos votado entre todas as edições do reality. Assim como Viih Tube figurou como uma das mais longas trajetórias sem ser mencionada no confessionário.
Foi o Big dos Bigs porque um dos favoritos do público não chegou na final, para a surpresa do Brasil. Gilberto do Vigor, rei dos bordões “O Brasil tá lascado”, “Ai, Brasil!” e “tchaki tchá”, que encantou com as suas cachorradas, com as suas explosões de raiva e afeto, com o seu dilema entre a sua religião (mórmon) e seus prazeres, que popularizou expressões regionais como “basculho” em suas discussões, que se notabilizou por competir e dançar até as últimas consequências, caiu no penúltimo paredão por menos de cinco por cento em relação à influenciadora Camilla de Lucas, depois de sobreviver a seis eliminações. Sua trajetória lembrou a Seleção de 1982, que ganhou a torcida com a sua arte em campo, mas não a Copa.
Foi o Big dos Bigs porque os participantes andaram aos pares. O romance não dominou a cena, não se assistiu a namoro no edredom, a amizade é que monopolizou a atenção, com a exaltação da cumplicidade pela formação de duplas inseparáveis: João e Camilla, Viih Tube e Thaís, Arthur e Projota, Sarah e Gil, Caio e Rodolfo.
Foi o Big dos Bigs pelas pautas sociais sérias levantadas ao longo da convivência, como bullying, depressão, racismo, homofobia, xenofobia e machismo. As polêmicas vividas pelos integrantes da casa serviram para ilustrar preconceitos e encontrar saídas para a desconstrução de estereótipos e comportamentos tóxicos.
Big Brother da esperança
Foi o Big dos Bigs pelas charadas do apresentador Tiago Leifert. Os concorrentes buscavam colher indiretas e sinais exteriores de seus desempenhos, e ele só queria confundir e colocar fogo no parquinho.
Foi o Big dos Bigs pelos memes a quem mais dormia, menos tomava banho, mais chorava.
Foi o Big dos Bigs pela implicância com dois perfis: a planta, caracterizada pela inércia, e o peixe, que morria pela boca, devido às suas incoerências e mentiras.
Foi o Big dos Bigs porque a paraibana Juliette, da turma da pipoca, durante o confinamento, ultrapassou o número de seguidores de seus colegas famosos, num fenômeno raro de identificação e popularidade.
Foi o Big dos Bigs pela rixa entre quarto do líder e xepa, entre a fartura da comida e o racionamento.
Foi o Big dos Bigs pelas fantasias exaustivas e extravagantes do castigo do monstro, que se assemelhava a uma prova de resistência à parte.
Foi o Big dos Bigs pelo fantasma do cancelamento, maior medo de quem aceitou expor a sua vida e as suas contradições por 24 horas.
Foi o Big dos Bigs pela afluência de pressentimentos e profecias em sonhos.
Foi o Big dos Bigs porque não bastava respeitar as regras para vencer, deveria existir o bom senso do fair play.
Foi o Big dos Bigs porque se consagrou como o campeão de anunciantes, de merchandising e de patrocinadores, numa abundância de prêmios por ação comercial.
O BBB 21 realmente foi o Big dos Bigs, acima de qualquer justificativa, porque nunca experimentamos um programa no meio de uma pandemia extrema, de um isolamento feroz. O anterior ainda se desenrolava no começo da propagação do vírus.
O telespectador invejou tudo o que não podia fazer: a rotina em bando, a paz de espírito, as tarefas desprovidas do receio de contaminação, a aglomeração contente, a mesa cheia, a pista de dança lotada, os shows gritados. Jamais um banho coletivo na piscina contou com tamanha adoração.
A residência cenográfica no Projac simbolizou uma bolha de normalidade, uma plataforma espacial com o que tínhamos condições de realizar antes da covid. Um elo perdido dos nossos hábitos antigos.
Pois não podemos abraçar os nossos amigos como os participantes, não podemos beijar alguém sem medo como eles, não podemos cantar em roda como eles, não podemos varar a madrugada em festas como eles, não podemos circular sem máscara como eles.
Todas as alegrias coletivas se mostraram possíveis no BBB. Simplesmente o Big dos Bigs.
Os finalistas Juliette, Fiuk e Camilla não têm ideia da mutação de suas personalidades. O vencedor será evocado, paradoxalmente, como um exemplo de esperança (agora milionário) e de nostalgia (de tempos loucos e livres).
* Fabrício Carpinejar escreveu a convite de GZH