Rir é o melhor remédio em qualquer época. Em tempos difíceis, dar boas risadas nos ajuda a esquecer um pouco a realidade árdua. Não é à toa que o horário mais leve e divertido da telinha é o das 19h. Entre os amores impossíveis das tramas das 18h e a tensão provocada pelas notícias no Jornal Nacional, vão ao ar histórias despretensiosas, que têm como principal objetivo distrair o público que, geralmente, está chegando em casa após um duro dia de trabalho.
É tradição, quase regra, exibir comédias às sete da noite, algumas beirando o surrealismo, com personagens que não caberiam a outro horário. Não por acaso, foi nesta faixa que assistimos a vampiros, histórias medievais, macacos pintores e até dinossauros. Sem compromisso com a realidade, os autores fazem a imaginação dos telespectadores voar.
No esquenta para o aguardado retorno das hilárias confusões de Salve-se Quem Puder ao ar, em 22 de março, GZH relembra 10 folhetins que arrancaram gargalhadas dos noveleiros. Confira!
Duelo de talentos
Colocar Fernanda Montenegro e Paulo Autran (1922 – 2007) em cena fazendo guerra de comida foi uma ousadia e tanto em Guerra dos Sexos (1983). Os responsáveis pela façanha, o autor Silvio de Abreu e o diretor Jorge Fernando (1955 – 2019), não devem ter se arrependido do feito, afinal, esta é uma das cenas mais marcantes da teledramaturgia brasileira.
Na primeira versão de Guerra dos Sexos, a dupla célebre do teatro brilhou na telinha como Charlô e Otávio, primos que viviam entre o amor e o ódio. A cena “pastelão” foi apenas uma das várias brigas que divertiram o público.
Em entrevista reproduzida pelo portal Teledramaturgia, Silvio de Abreu comentou o pioneirismo da sequência:
— Na medida em que você coloca atores da grandeza de um Paulo Autran e de uma Fernanda Montenegro levando torta na cara, isso passa a ser uma coisa importante e possível na telenovela, mesmo que, a princípio, espante todo mundo.
A nova versão da novela, em 2012, trouxe outra dupla talentosa nos papéis de Charlô e Otávio: Irene Ravache e Tony Ramos. Sem o peso da novidade, não teve a graça da versão original, mas também foi uma delícia de assistir. A cena clássica, é claro, não poderia faltar.
Terror ou "terrir"?
Uma das histórias mais diferentes e engraçadas do horário das 19h tinha vampiros nos papéis principais. Mas, de terror, Vamp (1991) não tinha nada, ainda que tenha assustado um pouco quem era criança na época.
Traumas de infância à parte, a trama de Antonio Calmon inovou ao levar sugadores de sangue para a telinha. O senhor das trevas Vlad (Ney Latorraca) bem que tentava assustar, mas o forte dele mesmo era fazer piada. Em uma das melhores cenas, o vampirão dança a coreografia de Thriller, de Michael Jackson (1958 – 2009) no cemitério.
Menção honrosa para a família Matoso: Mary (Patrícia Travassos), Matosão (Flávio Silvino) e Matosinho (André Gonçalves). O patriarca, vivido por Otávio Augusto, tinha só um canino afiado, tornando tudo ainda mais hilário.
Confusões no céu e na terra
Uma novela que tinha no elenco ninguém menos do que Dercy Gonçalves (1907 – 2008) só poderia ser uma comédia. Em Deus nos Acuda (1992), a humorista interpretava a anja (sim, acredite), Celestina, cuja tarefa era cuidar do Brasil.
Já naquela época, a missão celestial não era nada fácil, e a personagem enlouquecia com seus protegidos e, por isso, sempre pedia o auxílio do anjo Gabriel (Cláudio Corrêa e Castro, 1928 – 2005). Escrita por Silvio de Abreu, Alcides Nogueira e Maria Adelaide Amaral, a novela trazia de volta a hilária dona Armênia (Aracy Balabanian), direto de Rainha da Sucata (1990), que continuava querendo colocar tudo "na chon".
Destaque para Claudia Raia como Maria Escandalosa, dona do bordão: "Quando eu me espalho, ninguém me junta".
Empoderadas e vingativas
Muito antes de ouvirmos falar em empoderamento feminino, Carlos Lombardi criou uma trama com quatro mulheres e um objetivo em comum: vingança contra os homens que as fizeram sofrer. Hoje em dia, o tema pode parecer corriqueiro, mas, na época, Quatro por Quatro (1994) foi inovadora.
Humilhadas, traídas e abandonadas, Auxiliadora (Elizabeth Savala), Bibi (Betty Lago, 1955 – 2015), Tatiana (Cristiana Oliveira) e Babalu (Leticia Spiller) selaram um pacto e começaram a infernizar os seus respectivos pares. É claro que os planos renderam muitas confusões e trapalhadas, além de novas paixões para o quarteto.
A revelação da trama foi a então estreante Leticia Spiller, ex-paquita que mostrou levar jeito para a atuação. Babalu cativou o público e ditou moda nas ruas.
Programa de índio
O humor de Carlos Lombardi fez história na faixa das 19h. Em Uga Uga (2000), um índio loiro, um herói musculoso e intocável e uma noiva fujona eram alguns dos personagens bizarros que povoaram a trama.
Criado por uma tribo indígena, Tatuapu (Claudio Heinrich) era herdeiro do milionário Nikos Karabastos (Lima Duarte). O elenco tinha ainda a inesquecível Nair Bello (1931 – 2007) como Pierina, Vera Holtz (Santa) e Humberto Martins (Bernardo Baldochi).
Comédia escrachada, romances ardentes e muitos homens "descamisados", marcas registradas do autor, não poderiam faltar nessa divertida história.
Novas mordidas
O autor Antonio Calmon retomou o tema vampiresco mais de uma década após o sucesso de Vamp. Em O Beijo do Vampiro (2002), o poderosão era Bóris, interpretado por um surpreendente Tarcísio Meira.
Mais uma vez, os seres da trevas ganharam um tom hilário, conquistando o público jovem e trazendo de volta a "vampiromania", presente em canecas, camisetas, álbuns de figurinhas e outros itens de colecionador Bóris era temido, mas quem ditava as regras era a voluptuosa Mina (Claudia Raia). A gravidez da atriz na vida real foi aproveitada na trama, com direito a uma fofa Pandorinha, tão sedenta de sangue como a mamãe.
Um fato curioso: Ney Latorraca fez uma participação especial, revivendo Vlad, de Vamp.
Diversão garantida
Uma cidadezinha chamada Deus me Livre, cuja economia girava em torno da produção de jacas, onde quem mandava era o milionário Último Botelho Bulhões (Fúlvio Stefanini). Apenas por esse resumo já temos uma ideia de quão engraçada era Pé na Jaca (2006), última trama de Carlos Lombardi na Globo.
Uma das grandes sacadas foi escalar um elenco que nunca havia feito comédia, como Juliana Paes (Guinevére), Murilo Benício (Arthur) e Deborah Secco (Elizabeth).
Entre tantos momentos hilários, os melhores eram protagonizados por Arthur. A gagueira e dificuldade de acertar os nomes das pessoas faziam o público rolar de rir. Guinevére virava Guilhotine, Tico (Marcos Pasquim) virava Teco e Último variava entre Primeiro, Segundo, Terceiro... Gargalhadas garantidas!
Macacadas na telinha
Na novela Caras & Bocas (2009), de Walcyr Carrasco, quem pintava o sete era o macaco Xico, responsável pelas famosas telas atribuídas a Denis (Marcos Pasquim). E foi esse artista "animal" quem protagonizou as cenas mais hilárias da história. Não poderiam faltar sequências com as famosas guerras de comida, já tradicionais nas tramas com a assinatura da dupla Walcyr e Jorge Fernando.
Quem também roubou a cena foi Cássio, vivido por um novato Marco Pigossi. O bordão "Tô rosa-chiclete" caiu na boca do público. Outras frases que grudaram na memória dos telespectadores foram: "É a treva", dita por Bianca (Isabelle Drummond), e "Não me absorva, Fabiano!", de Ivonete (Suzana Pires).
Uma hilária rivalidade
Um das adaptações mais bem-sucedidas de todos os tempos, escrita por Maria Adelaide Amaral, volta ao ar em março, no Vale a Pena Ver de Novo. Após a trama dramática de Laços de Família (2000), as tardes terão a graça de Ti-ti-ti (2010). A história original foi ao ar em 1985, criada por Cassiano Gabus Mendes (1929 – 1993).
A rivalidade entre Victor Valentim (Murilo Benício) e Jacques Leclair (Alexandre Borges) movimentou fãs e dividiu torcidas. Em uma divertida disputa, a dupla tentava dominar o mundo da moda, mas só se metia em confusões. Mestre na comédia, Claudia Raia fez de Jaqueline Maldonado uma das melhores personagens da novela.
Valeu a pena rir de novo
Quando foi anunciada a nova versão de Sassaricando (1987), a grande dúvida era se alguma atriz estaria à altura de Claudia Raia na pele de Tancinha. Logo aos primeiros capítulos de Haja Coração (2016), Mariana Ximenes surpreendeu muita gente e criou uma Tancinha toda sua, mas com muitas características marcantes da original.
O adorável sotaque da feirante e suas pérolas – como "Eu me tô divididinha" e "Eu me amo você" – conquistaram o público da novela, atualmente reprisada às 19h. Na reta final da história, a expectativa é pelo final diferente, escrito por Daniel Ortiz e gravado por Mariana e João Baldasserini em 2020. Será que Tancinha terminará nos braços de Beto desta vez, não nos de Apolo (Malvino Salvador)?
Outra personagem que ganhou novos contornos foi Fedora Abdala, interpretada por Tatá Werneck. Em uma grande sacada, Cristina Pereira, a Fedora da primeira versão, entrou em cena como Safira.