Fitas amarelas com letras pretas avisam: "Não ultrapasse, é uma cena de crime". Mas tudo bem: há séculos o público está acostumado com crimes ficcionais. Sherlock Holmes os solucionava com dedução, Hercule Poirot, com a ajuda das pequenas células cinzentas. Foi só no início dos anos 2000, no entanto, que um novo ator cruzou as fitas e entrou no palco: a ciência.
CSI: Investigação Criminal estreou na televisão americana, pela rede CBS, em 6 de outubro de 2000, há exatos 20 anos. Foi um sucesso instantâneo. No lugar dos detetives tradicionais, um grupo disforme de cientistas nada malucos com maletas. Revelando digitais, usando luz fluorescente para descobrir manchas de sangue, saliva, sêmen, fazendo complexos testes de DNA, quebrando janelas, vidros, carros, traçando trajetórias de balas e reencenando crimes com maestria. Tudo isso ao som de The Who.
A verdadeira ação estava no laboratório ou no necrotério. Seguindo o livro da ciência, eles inventavam hipóteses, faziam experimentos, comprovavam ou não suas teses até o culpado emergir sem sombra de dúvida. E o público adorava: a série original ficou no ar por 15 anos, além de ter dado vida aos spin-offs oficiais CSI: Miami, CSI: NY e CSI: Cyber, sem contar as séries inspiradas na investigação forense, como Bones e NCIS.
O pesquisador Felipe Borges, doutorando e mestre em Comunicação e Sociabilidade Contemporânea pela Universidade Federal de Minas Gerais, autor do artigo Reinvenções da figura do detetive nas séries policiais de televisão, compara os personagens principais da série com produções anteriores:
— Não temos um gênio à la Sherlock Holmes ou um policial durão e violento como na tradição hard-boiled e noir, mas uma equipe competente que se divide em diferentes especializações.
Ele se refere, é claro, ao chefe Gil Grissom (William Petersen) e seu séquito de investigadores: Catherine Willows (Marg Helgenberger, indicada duas vezes ao Emmy de melhor atriz pelo papel), Sara Silde (Jorja Fox), Nick Stokes (George Eads) e Warrick Brown (Gary Dourdan). Na iluminada Las Vegas, eles resolvem crimes cada vez mais absurdos em cassinos, hotéis e bares da cidade ou no deserto ao seu redor.
Borges comenta que a série era "muito competente em sua proposta". Em menos de uma hora, eram apresentados os casos, as provas e os suspeitos. Depois de algumas contradições, a solução surgia a partir de "complexas explanações científicas" capazes de "construir uma intricada sequência de eventos e explicações sobre o caso, suficiente para amarrar todo e qualquer pormenor". Como um romance policial semanal no horário nobre da televisão.
As audiências rapidamente compraram essa ideia. Ainda em 2002, CSI já era o segundo programa mais assistido da televisão nos Estados Unidos. Na temporada seguinte, ele tomou a primeira posição. A série chegaria ao ponto de se tornar a mais assistida pelo maior número de vezes, estando seis vezes no topo da audiência.
Efeito CSI
Queridinha do público, no entanto, CSI não passou incólume pelos críticos. A começar por sua visão fantasiosa da ciência: nenhum crime estava além das provas, nenhum assassinato era cometido sem que pelo menos um fio de cabelo fosse deixado para trás. Uma visão, no mínimo, muito ingênua da realidade.
Se é possível argumentar que era apenas uma série, as coisas logo ficaram mais sérias e o fenômeno de falsas expectativas geradas pela produção ganhou até um nome: CSI effect ("efeito CSI"). Usada pela primeira vez ainda em 2004 pelo jornal USA Today, a expressão se tornou comum para falar das ideias erradas que a séries (e títulos similares) criaram nas pessoas.
"Alguns advogados de defesa dizem que CSI e programas semelhantes fazem os jurados confiar demais em descobertas científicas e não querem aceitar que essas descobertas possam ser comprometidas por erros humanos ou técnicos", narrou a reportagem. Os promotores também tinham reclamações: "Os programas podem dificultar a obtenção de condenações na grande maioria dos casos em que as evidências científicas são irrelevantes ou ausentes".
Produções que surgiram após CSI vêm se beneficiando de uma visão mais crítica, tanto das provas quanto das instituições. Borges cita os títulos True Detective, Mindhunter, Top of the Lake, Luther e River como séries que vêm explorando as contradições dos investigadores e da própria polícia:
— Nessas produções, acompanhamos detetives imperfeitos e perturbados, que são muitas vezes parte do problema. A ciência não resolve tudo, e há espaço para dúvidas: mesmo quando há resoluções, pode permanecer um grau de incerteza e incômodo, pistas perdidas ou contraditórias ou a sensação de que aquilo é apenas a ponta do iceberg.
Ainda assim, é difícil imaginar uma safra tão grande de produções do gênero, atualmente, não fosse a iniciativa de CSI, há duas décadas.
Quem quiser relembrar esses tempos mais simples pode ficar ligado nas maratonas do canal por assinatura AXN. De segunda a sexta, o canal está exibido a série das 11h às 22h e da meia-noite às 6h. No fim de semana, a exibição começa por volta de 9h e vai até as 20h aos sábados. A maratona é retomada à meia-noite de sábado para domingo, seguindo no ar até 18h15min (aproximadamente). A primeira temporada começou a ser exibida na segunda-feira (5).