Lançados na última sexta-feira pela Netflix, os oito episódios do seriado Irmandade colocam o espectador para refletir a realidade do sistema carcerário do país a partir da visão do preso.
— A dimensão ética vem muito ligada à artística em Irmandade, porque a arte não se separa da ética. Independentemente do personagem, sempre há uma discussão no lugar dessa construção e uma reflexão sobre o que era o sistema carcerário nos anos 1990 e o quanto a gente ainda vê isso nos tempos atuais — explica Pedro Wagner, que interpreta o presidiário Carniça.
Para estabelecer esse discurso, a advogada Cristina (Naruna Costa) é incumbida de uma difícil missão no primeiro episódio. Após facilitar a vida do irmão Edgar (Seu Jorge), líder da facção chamada Irmandade e comandada de dentro do presídio, ela precisa manter sua ficha limpa e é obrigada a se infiltrar no grupo. A intenção é descobrir qual braço opera os planos da quadrilha do lado de fora das grades.
Segundo Wagner, as facções naquele período da história surgiram, a princípio, como uma reação e uma necessidade de sobrevivência dentro desse “sistema tão violento e tão cruel, em que você entra ladrão de galinha e sai assassino”.
— Eu acredito muito que a violência, a maldade, não é uma coisa que a gente nasce com isso. Ao mesmo tempo, a violência e a maldade fazem parte da configuração humana. Então, como entender um personagem que tem essa violência e essa maldade tão maximizada, dilatada? Para mim, isso se deu muito nas conversas com ex-detentos, no entendimento das circunstâncias que levantam esses totens extremamente violentos — analisa.
Memória
Um dos integrantes da Irmandade é Ivan, interpretado por Lee Taylor (o Camilo da novela A Dona do Pedaço). Após ser libertado das grades, graças a uma ajuda de Cristina, ele tenta se desligar da facção, mas acaba enredado. Por isso, as semelhanças entre Ivan e o marido de Vivi Guedes (Paolla Oliveira), na novela das nove da Globo, são inegáveis.
— Os dois são estrategistas. Muito racionais, eles não dão nenhum passo que não seja extremamente calculado. Coincidentemente, essa racionalidade acaba sendo abalada pelos acontecimentos externos e ambos acabam cometendo ações que, em situações normais, talvez não cometessem — compara Taylor.
Para Wagner, Irmandade também fala sobre a memória do Brasil. Como o seriado da Netflix consegue unir o entretenimento e o debate da ética em sua obra, ele acredita que o resultado final se constitui uma “raridade”:
— Assistir a Irmandade neste momento, pensando que ela se desloca no tempo, é também ajudar para não deixar que essas injustiças voltem.