Por Adriana Donato
Doutora em Políticas Públicas pela UFRGS, com pesquisa de Pós-Doutorado em Lei Rouanet
Em 2023, o presidente Lula autorizou R$ 16,5 bilhões para a Lei Rouanet? É o que tem sido veiculado, mas não corresponde à realidade, porque esse montante não foi liberado pelo Ministério da Cultura (MinC) e pelo governo federal.
Antes de falar em números, vale lembrar que, em 2019, no governo Bolsonaro, o MinC foi mais uma vez extinto e a cultura passou integrar o Ministério da Cidadania junto ao esporte e ao desenvolvimento social. Em 2020, em razão da covid-19, os projetos encaminhados ao mecanismo do incentivo fiscal da Lei Rouanet passaram por um período turbulento: atrasos nas análises, projetos aprovados sem a homologação de execução, bem como a não liberação de valores já captados pelos proponentes, além de diversos arquivamentos. A publicação da Instrução Normativa nº1, de 2022, trouxe uma série de restrições, ampliou o tempo das análises, tornou o processo mais burocrático; consequentemente, dificultou o encaminhamento de projetos, provocando uma demanda reprimida.
Nos últimos 15 anos, o valor dos projetos aprovados por ano esteve entre R$ 2 bilhões e R$ 5,6 bilhões, conforme dados do Sistema de Apoio às Leis de Incentivo à Cultura (Salic). Contudo, o teto para a renúncia fiscal oscilou entre R$ 1,3 bilhão e R$ 2 bilhões ao ano. O valor efetivamente captado permaneceu dentro dessa estimativa. Em 2023, a Lei Rouanet totalizou pouco mais de R$ 16,5 bilhões em projetos aprovados, porém o valor efetivamente captado, neste ano, foi de R$ 2,2 bilhões. Em 2022, ainda no governo Bolsonaro, o valor ficou em R$ 2,1 bilhões.
Cabe destacar que para aqueles projetos aprovados – com prorrogação automática – segue a captação por pelo menos dois anos, ou seja, esses valores ainda podem ser captados nos anos seguintes.
Em março de 2023, foi publicado o Decreto nº 11.453 de regulamentação da Lei Rouanet – que também estabeleceu regras e procedimentos gerais de outros mecanismos de fomento cultural: Lei Paulo Gustavo, Lei Aldir Blanc, Lei Cultura Viva e outras políticas públicas do Sistema Nacional de Cultura. Além dos seus objetivos, uniformizou a gestão dos recursos financeiros.
O novo decreto corrigiu algumas incongruências do anterior, por exemplo, excluiu os incisos que davam ênfase às atividades culturais de caráter sacro, clássico e de belas artes; uma vez que estas estão contempladas pelo segmento Artes Visuais, conforme disposto no Art. 18 da Lei Rouanet, lembrando que belas artes é um termo obsoleto, não mais utilizado.
O decreto regulamentou, também, a metodologia da prestação de contas que passa a ter critérios diferenciados para projetos de pequeno, médio e grande porte.
A Instrução Normativa MinC nº1, de 10 de abril de 2023, voltou ao limite de R$ 1 milhão aos projetos em geral, respeitadas as exceções; a I.N, de 2022, havia reduzido para R$ 500 mil. A remuneração, para captação de recursos limitada a 10%, voltou ao teto de R$ 150 mil por projeto. Custos de divulgação, no limite de 20%; antes, estava entre 5%, 10% e 20%, conforme a tipicidade do projeto. Aumentou o limite estabelecido para o pagamento de cachês artísticos: R$ 3 mil para R$ 25 mil por apresentação para artista, solista e modelo; de 3,5 mil para R$ 5 mil por apresentação e por músico; de R$ 15 mil para R$ 25 mil para maestro ou regente, no caso de orquestras.
A nova Instrução Normativa MinC nº11, de 30 janeiro de 2024, mantém os valores citados acima e traz outras alterações. Reduz o tempo de antecedência do início de execução – para apresentação das propostas – de 90 para 60 dias. O período de encaminhamento de propostas passa a ser entre o 1º de fevereiro e 31 de outubro de cada ano. Planos anuais e plurianuais, a data limite tem novo tempo: até 31 de agosto do ano anterior ao início de execução.Redução de 50% para 20% (do valor total do projeto) para remuneração do proponente (quando exerce função no projeto) e de um mesmo fornecedor. Estabelecimento de tetos para apresentação de planos anuais, a partir da série histórica de captação do proponente, com possibilidade de aumento de até 30%. Antes, não havia limite.
Houve uma mudança na análise preliminar. A partir de 2024, as propostas passarão por análise progressiva de admissibilidade, composta pelas seguintes etapas:
- Exame automatizado preliminar de admissibilidade; após o atendimento dos requisitos mínimos, será publicada a autorização para a captação de recursos.
- Após a captação mínima de 10%, o proponente poderá adequar o projeto à realidade de execução, no prazo de 20 dias; o projeto seguirá para análise da documentação, das medidas de acessibilidade, da democratização do acesso, das contrapartidas sociais e outros aspectos, podendo ser diligenciado para os devidos ajustes.
A tabela abaixo expõe a soma dos últimos anos, tanto os valores da projeção do teto para o exercício fiscal quanto o que foi efetivamente captado para realizar os projetos.
O teto para dedução:
- 2010 – R$ 1,319 bilhão
- 2011 – R$ 1,328 bilhão
- 2012 – R$ 1,642 bilhão
- 2013 – R$ 1,241 bilhão
- 2014 – R$ 1,419 bilhão
- 2015 – R$ 1,323 bilhão
- 2016 – R$ 1,304 bilhão
- 2017 – R$ 1,357 bilhão
- 2018 – R$ 1,427 bilhão
- 2019 – R$ 1,548 bilhão
- 2020 – R$ 1,279 bilhão
- 2021 – R$ 1,471 bilhão
- 2022 – R$ 1,830 bilhão
- 2023 – R$ 2,079 bilhões
O valor que foi captado:
- 2010 – R$ 1,167 bilhão
- 2011 – R$ 1,324 bilhão
- 2012 – R$ 1,277 bilhão
- 2013 – R$ 1,261 bilhão
- 2014 – R$ 1,335 bilhão
- 2015 – R$ 1,202 bilhão
- 2016 – R$ 1,148 bilhão
- 2017 – R$ 1,189 bilhão
- 2018 – R$ 1,297 bilhão
- 2019 – R$ 1,481 bilhão
- 2020 – R$ 1,505 bilhão
- 2021 – R$ 2,132 bilhões
- 2022 – R$ 2,114 bilhões
- 2023 – R$ 2,298 bilhões