No já distante ano de 1999, o eterno artista Giba Giba, falecido em 2014, idealizou, em Pelotas, a primeira edição do Festival Cabobu – A Festa dos Tambores, que homenageou grandes representantes da música: Cacaio, Boto e Bucha, que emprestaram as duas primeiras letras de seus nomes para formar o título do evento, que foi criado para enaltecer a cena da música negra e a ancestralidade. O encontro artístico ganhou uma nova edição em 2000 e, desde então, artistas e público esperavam por um novo episódio.
E este momento chegou. A terceira edição do Cabobu, que é gratuito, ocorre desta sexta-feira (21) a domingo (23), com artistas que são destaques da cena musical gaúcha e nacional, como Marietti Fialho, Paulo Dionísio e Rafa Rafuagi. Os nomes confirmados representam os mais variados ritmos produzidos no Estado, do rap de Laddy Dee e Mano Rick ao reggae do grupo Quintal de Sinhá, passando pela MPB de 50 Tons de Pretas, pelo soul de Vagnotreta, pela música regional e africana de Kako Xavier e pelos grupos que destacam a percussão rítmica em suas apresentações, como a Xava Banda.
Os três dias de música também contam com a presença de DJs residentes em Pelotas e uma programação que enaltece o sopapo, instrumento de percussão genuinamente gaúcho, com grupos como Afroentes e Lugarejo, bem como mostras de danças. Toda essa cena musical será apresentada no palco que, claro, só poderia se chamar Giba Giba. O espaço fica no Largo Edmar Fetter, do Mercado Central de Pelotas. Os shows se iniciam às 17h.
— A nossa expectativa é cumprir a ideia daquele músico, percussionista e compositor chamado Giba Giba. Ele queria reunir as pessoas em uma unidade de conduta para que elas pudessem mostrar todos os seus talentos, a sua força do trabalho, que existe, mas parece que não é visível. A cultura negra tem tanta coisa proeminente, tanta coisa maravilhosa, que a gente quer distanciar daquela visão antiga de como o negro era tratado no Estado — conta Sandra Narcizo, coordenadora do festival e que foi produtora de Giba Giba.
Esta semente plantada por Giba Giba há mais de duas décadas geminou e foi importante para a trajetória da rapper pelotense Laddy Dee, que esteve na plateia do festival em suas primeiras edições e agora é uma das atrações do evento. Ela, que já tem 25 anos de carreira, viu-se inspirada no começo de sua jornada por este grande evento em sua cidade, assistindo a pessoas negras em destaque no palco.
— É um sentimento que só sabe quem sente, não tem como descrever. Estou muito feliz e ansiosa por esse momento, porque além de ser na minha cidade, também vai ser um grande evento, com um público enorme. É um ato histórico — aponta a artista.
A realização da terceira edição do Festival Cabobu está ocorrendo através de seleção no edital Natura Musical, por meio da Lei Estadual de Incentivo à Cultura do Rio Grande do Sul (Pró-Cultura). Antes do início das atrações musicais, na sexta-feira, às 15h, haverá um cortejo de abertura, com concentração na esquina da Secretaria Municipal da Cultura de Pelotas (Secult), contornando a praça Cel. Pedro Osório e indo até o palco Giba Giba.
Cultura
A terceira edição do Cabobu buscará a manutenção histórica da cultura preta do Rio Grande do Sul, apontando direções para a música, conhecimento, expressões e valores. E vai além das apresentações musicais. Nos três dias de evento, por exemplo, ocorre um ciclo de conversas com questões afrocentradas na sociedade, enfatizando a cultura preta por meio de debates e resoluções entre convidados e população presente. A Bibliotheca Pública de Pelotas receberá pesquisadores e mestres de diversas áreas, em encontros que acontecem todas as manhãs, a partir das 8h30min.
Em uma destas mesas-redondas, às 10h30min do domingo, estará Edu do Nascimento, filho de Giba Giba e um dos idealizadores da terceira edição do festival. A sua pauta será o próprio Cabobu e o sopapo. Para ele, levar adiante o projeto é como uma missão de sentir e enxergar o outro e a si mesmo, valorizando o legado deixado pelo seu pai e pelos ancestrais.
— Queremos mostrar não só a evolução artística desta caminhada de 24 anos como valorizar o negro, os grupos de dança e de música que foram formados, bem como os grandes mestres que levaram adiante os saberes familiares do nosso grande tambor negro ancestral. Nessa ancestralidade da passagem do bastão familiar natural é que está a legitimidade de continuação. Foi este legado que foi passado para mim. O festival vem com toda esta pegada de ideias, experiência e, principalmente, quando falamos de evolução, o olhar para a diversidade — ressalta Edu do Nascimento.
Já no turno da tarde, antes dos shows, no pátio da Secult, estão previstas cinco oficinas focadas nos tambores, em especial o sopapo. O enfoque está nos ritmos percussivos, na história e na fabricação de instrumentos. Uma delas é A Percussão Aplicada na Harmonia Musical - Se me Bater, Eu Grito, Se me Tocar, Eu Canto!, que será conduzida por José Batista, luthier, projetista de sopapo e coordenador pedagógico do Cabobu, além de ser filho de Mestre Baptista, um dos principais fabricantes do tambor ancestral.
Também no pátio da Secult, estão programadas exposições artísticas, como uma coletiva de artistas negros, com obras de Zé Darci e fotografias de Luis Ferreirah, além da exposição Giba Giba - O Guardião do Sopapo, que conta com o acervo de músicas, instrumentos, figurinos, imagens e objetos do músico pelotense. Esta última mostra teve curadoria de Sandra Narcizo e da museóloga Dóris Couto e está sendo apresentada no evento pelo Museu Julio de Castilhos.
Ainda está marcada para acontecer nos três dias do evento a Feira Negra Helena do Sul, que homenageia a escritora e pedagoga Maria Helena Vargas da Silveira, defensora dos direitos à educação antirracista no país. Ao lado da praça Cel. Pedro Osório, onde se situa a feira, estará ainda o Palco da Diversidade, com mostra de números artísticos produzidos por entidades assistenciais e periféricas da região.
Com todo este grande cenário montado, Sandra Narcizo acredita que 50 mil pessoas devem passar pelas atividades do evento nos três dias. E esta é uma grande celebração ao legado de Giba Giba:
— A presença dele nessa edição do festival é total. Seguimos os passos dele, cumprindo os seus desejos e mantendo esse evento vivo. E tem toda uma rede para esse evento se concretizar nessa magnitude. Giba Giba é o nome central deste evento.
Festival Cabobu - A Festa dos Tambores (3ª Edição)
- O evento, que é gratuito, ocorre desta sexta (21) a domingo (23), em Pelotas.
- Apresentações musicais: a partir das 17h, no Palco Giba Giba, no Largo Edmar Fetter - ao lado do Mercado Central de Pelotas (Praça Sete de Julho, 179 – Centro).
- Oficinas: a partir das 13h30min, na Secretaria de Cultura de Pelotas (Praça Cel. Pedro Osório).
- Mesas-redondas e debates: a partir das 8h30min na Bibliotheca Pública Pelotense (Praça Cel. Pedro Osório, 103).
- A programação completa, com detalhamento de todas as atividades, está disponível no site cabobu.com.