Na noite de domingo, quando cerca de 80 homens de 12 quartéis do Corpo de Bombeiros ainda lutavam contra o fogo no Museu Nacional do Rio de Janeiro, um segundo grupo de heróis fazia o possível para resgatar parte da história do Brasil das chamas. Cerca de 30 servidores do museu, alguns deles já aposentados, entraram no prédio durante o incêndio. Homens como o biólogo gaúcho Paulo Buckup, que conseguiu salvar “alguns milhares” de exemplares de moluscos descritos por pesquisadores dos séculos 19, 20 e 21. O biólogo ficou das 20h30min até as 22h na parte de trás do prédio — até ser retirado de lá por bombeiros.
— Estávamos pensando nos nossos ancestrais pesquisadores. O que salvamos vai permitir a continuidade de pesquisas de colegas. Na hora, só me ocorreu que ali estavam a minha vida e a vida de colegas — disse Buckup, que pesquisa a evolução de peixes. O material de trabalho do biólogo não estava no prédio.
Entre outras preciosidades, perderam-se no domingo uma coleção de múmias egípcias, o fóssil do maior dinossauro já montado no Brasil e o fóssil de Luzia, a mais antiga habitante da América Latina. Apenas o primeiro meteorito encontrado no Brasil, exposto na entrada do museu, manteve-se intacto.
A resistência do meteorito, porém, não se compara à resiliência de homens e mulheres que, todos os dias, trabalham em condições precárias para manter em pé instituições culturais e centros de pesquisa e preservação da memória como o Museu Nacional. Em um momento de luto profundo pela perda de um acervo que jamais será reposto e de autoestima em baixa pela repetição de erros antigos, o esforço de Buckup e de seus colegas revelou a grandeza e a coragem de quem nunca desiste de apostar na esperança e no futuro — mesmo em meio às cinzas.