O descaso de décadas com a manutenção do Museu Nacional e a responsabilidade pela falta de investimentos são alguns dos pontos que norteiam as discussões de pesquisadores nesta segunda-feira (3), ao analisarem os reflexos na cultura após o incêndio no espaço cultural. Estudiosos ouvidos por GaúchaZH acreditam que se trata de uma perda irreparável para as futuras gerações.
“Tudo acabou”
Segundo Marina Bento Soares, professora do Departamento de Paleontologia e Estratigrafia da UFRGS, não existe na história do país uma tragédia desse vulto. Além disso, a omissão de governantes nos últimos anos para os investimentos na área ficou evidente com o ocorrido.
— Entra governo, sai governo, todo mundo é omisso. Ninguém valoriza a educação, ninguém valoriza a ciência nesse país. E aí está o resultado. O Museu estava precisando de uma reforma há muito tempo — pontua.
Marina também é esposa do diretor do Museu Nacional, Alexandre Kellner, e acompanha as movimentações em frente ao espaço cultural. Ela conta que o clima é de muita tristeza, em que as pessoas estão chegando — como funcionários, professores e técnicos — e choram, não acreditando no que estão vendo.
—A gente olha para a frente do Museu e vê uma carcaça. São paredes ocas, mais nada. Eram mais de 20 milhões de peças de 200 anos de história da ciência no Brasil que acabaram. Coleções únicas que jamais serão repostas. Jamais. (...). Pesquisadores desenvolviam trabalhos de anos com esses materiais, e tudo acabou.
"A responsabilidade é de muitos governos"
O doutor em História da Arte e ex-curador chefe do Margs, José Francisco Alves, fala que o incêndio no Museu Nacional representa uma perda em vários aspectos, sendo a arqueológica de maior importância.
— Havia o crânio da Luzia. A parte marinha também, a parte paleolítica, nossos dinossauros mais antigos. Seria o equivalente a um incêndio no Museu La Plata, na Argentina, um dos maiores do mundo em paleontologia — compara.
Alves acredita que se trata de uma “catástrofe cultural” e, que se houver uma reconstrução, não será uma restauração do espaço cultural, e sim uma “reciclagem”. Ainda em 2009, o doutor visitou o Museu e já lembra da precariedade de diversos espaços, como um sarcófago egípcio que estava pegando sol, sem o mínimo de climatização.
— Aquele aspecto de casa antiga do Museu Nacional me lembra um pouco o Museu Julio de Castilhos, em Porto Alegre. A gente entra, e o piso faz barulho. Parece que a qualquer momento vamos atravessar o chão. Tive essa sensação no Museu Nacional. Em 2009, a situação já era precária. A responsabilidade é de muitos governos.