Paris – No dia treze de novembro de 2015, uma sexta-feira, a correspondente de guerra e escritora gastronômica Wendell Steavenson estava em Tbilisi, na Geórgia, para filmar um episódio da série de viagens culinárias de Anthony Bourdain, "Parts Unknown". E foi para a cama cedo.
Na manhã seguinte, acordou para descobrir uma série de e-mails na sua caixa postal. "Todos falavam dos 130 mortos em Paris. Pensei: 'Estou no lugar errado'."
Bourdain teve que se virar sem ela, que se desculpou e pegou o primeiro voo para a capital francesa que conseguiu – e naquela mesma noite já concluía a primeira de várias histórias sobre os ataques terroristas para o site The New Yorker. Aos 47 anos, a anglo-americana já conhecia bem a Cidade Luz, pois se mudara para Montmartre em 2007 e, desde então, passa períodos intermitentes ali. Há algumas semanas, nós nos sentamos em um café movimentado de seu bairro.
Steavenson é autora de três livros de não ficção, incluindo "Circling the Square: Stories From the Egyptian Revolution", lançado em 2015. Agora escreveu o primeiro romance, "Paris Metro".
Quando nos encontramos, ela estava toda agasalhada para se proteger do frio, levava no pulso um relógio G-Shock tipo cebolão, amarelo, e tinha óculos de aros grossos pendurados na ponta do nariz.
Sua intenção original era escrever um livro de não ficção sobre o massacre de 2015 na sede do semanário satírico Charlie Hebdo.
"Eu estava trabalhando com contrato, mas a coisa estava lenta, amarrada. Não me sentia à vontade para tentar pressionar o pessoal que já estava traumatizado com uma tragédia horrorosa; eu me sentia a própria intrusa." Aí vieram os ataques de novembro e ela decidiu parar o livro de vez. "Os atentados de novembro me pareceram uma situação mais ampla; achei que era hora de perder o 'complexo de romance'. Sempre quis escrever ficção e embora o jornalismo não fosse um desvio, minha primeira intenção sempre foi escrever boas histórias."
Quando o protagonista de um romance se parece com o autor – como nesse caso em que Catherine Kitteridge, ou Kit, também é uma correspondente de guerra anglo-americana –, é tentador avaliar até que ponto a obra é autobiográfica. "Por mais estranho que pareça, inventei tudo. Foi ótimo e maravilhosamente libertador", confessa, rindo.
O livro começa no subúrbio de Saint-Denis, com a polícia se preparando para dar batida em uma casa onde vários terroristas se refugiaram. Kit está ali para cobrir o cerco para um jornal norte-americano qualquer. Ela desenvolveu o hábito de arquivar suas histórias sob os nomes das estações de metrô da cidade, como Voltaire e Bonne Nouvelle – "infalível para confundir espiões de quarto de hotel e agentes alfandegários". Daí o título da obra.
"Paris Metro" também se passa em Bagdá, Beirute e na ilha grega de Cós. Paris supostamente seria o santuário de Kit, o lugar onde pode criar o filho adotivo iraquiano em paz, após anos cobrindo conflitos violentos. Porém, quando perde um grande amigo no ataque à Charlie Hebdo, os valores liberais em que sempre acreditara são substituídos de forma insidiosa pelo medo e o ódio. "Há um grande risco, quando algo desagradável ou horrível acontece, de a pessoa surtar e espalhar a culpa de forma generalizada, que é o que a Kit faz. E só acorda quando percebe o mal que está causando ao filho", explica a autora.
Steavenson, que estudou História na Universidade de Cambridge, cobre o Oriente Médio desde 2002. Já passou pelo Afeganistão, Iraque e Síria, e fez reportagens no Líbano durante a guerra, em 2006. Morou um ano e meio no Cairo, durante a Primavera Árabe, e passou um ano em Jerusalém. "Senti que a minha perspectiva era única por ter passado tanto tempo no Oriente Médio e estar em Paris para testemunhar o que ocorreu depois dos ataques terroristas. O livro foi uma maneira de descrever todos esses fiapos de conversas, reclamações e reações diferentes."
Steavenson cita "O Zero e o Infinito", de Arthur Koestler, "Bonequinha de Luxo", de Truman Capote, e "O Americano Tranquilo", de Graham Greene como obras fundamentais. "Nas três, cada minúcia da trama se torna o próximo gancho; é tudo superorganizado. Psicologicamente são fascinantes porque dá para perceber direitinho como o levam de um lugar para o outro." Quando começou a escrever "Paris Metro", ela pediu ao seu agente que entrasse em contato com Matt Weiland, editor da W.W. Norton & Co. – que, uma década antes, trabalhara na revista Granta e editara três artigos longos seus sobre o Iraque e o Líbano.
"Quando um repórter diz que quer escrever ficção, geralmente corro para as montanhas", brinca Weiland, em entrevista por telefone. "Mas revisitando as matérias da Granta, deu para ver que a escrita da Wendy destaca seu olhar incrivelmente natural para a análise do personagem e um talento absurdo para montar as cenas. Ela conseguiu se aproximar muito rápido das pessoas que estava entrevistando; assim, você fica com a impressão de que as conhece e torce por elas. Acho que essa é uma característica do que os melhores romances podem e/ou devem fazer."
Por Tobias Grey