Eu não vou explicar aqui o que significa o Dia da Consciência Negra, #dáumgoogle. E, ao invés de dizer muitas coisas, prefiro perguntar algumas: não te dá nem um pouco de aflição pensar que em pleno 2017 precisamos ainda DESPERTAR a consciência sobre o valor e a importância de outro ser humano?
E não te intriga ainda mais que a maior parte dos veículos, empresas e instituições só param ou se dedicam a essa “consciência” um dia do ano, quando pensam a temática das relações raciais?
E que, nos outros 364 dias do ano, convivam com as manifestações do racismo sem preocupação e sem ação nenhuma para combatê-las?
Não te intriga nós negros sermos mais da metade da população brasileira e ainda assim ser necessária uma lei que obriga as escolas a terem a nossa história nos livros escolares?
Não te intriga? Então, o que é afinal, pra ti, essa “consciência”? Ela desperta em ti? Ela desperta quando tu entras nas galerias de arte e a maior parte das representações do negro não vão muito além da escravidão ou dos estereótipos do que se pressupõe ser o lugar do negro: a favela, o desfile de Carnaval, as rodas de rap e os bailes funk? Podem ser, lógico, mas serem somente esses lugares onde nós negros podemos estar e existir, não te intriga?
Essa consciência desperta em ti quando um artista negro é sempre “artista negro”? Nunca artista e ponto. Ser artista e ser negro no Brasil já é um ato político, mas estar obrigatoriamente atrelado à temática racial é também opressor.
Bom, não quero dar lições nem discorrer linhas e linhas sobre a importância dessa consciência e o que ela significa. Ao invés disso, prefiro partir do pressuposto de que todos e todas querem ser melhores, e para essas pessoas eu deixo aqui umas boas dicas para lembrar que a arte, em todos os seus formatos, sempre foi uma superferramenta para que essa consciência não seja só um despertar mas sim um existir. Porque nós, pessoas negras, existimos todos os dias, e o racismo existe, insiste e resiste lado a lado.
10 atrações para conhecer
1) Ela Quer Tudo
Série de TV baseada no primeiro filme do cineasta americano Spike Lee (She’s Gotta Have It, em inglês), de 1986. A trama acompanha Nola Darling, uma jovem de 20 anos (na série vivida por DeWanda Wise, na foto ao lado) que tenta conciliar a busca por seus sonhos, a pressão social e o amor de três homens.
Estreia na Netflix na próxima quinta-feira.
2) Afros e Afins
Graduanda em Ciências Sociais pela Universidade Federal de São Paulo, onde se dedica ao estudo da educação crítica com recorte étnico-racial e participa de coletivos feministas ligados aos movimentos negros no espaço acadêmico, Nátaly Neri é a idealizadora e produtora do canal do YouTube Afros e Afins. A proposta é estimular a autonomia financeira, intelectual e estética da mulher negra, com bons papos sobre consumo consciente, racismo e empoderamento feminino.
3) Afroflix
Plataforma online colaborativa e gratuita que tem como critério veicular filmes, séries, webséries, vlogs e videoclipes produzidos, escritos, dirigidos ou protagonizados por pessoas negras. Assista aqui.
4) O Último Black Power
Blog e canal no YouTube nos quais o designer carioca Jota C Angelo comenta tendências de moda e estilo para homens negros – e também questiona os padrões impostos a eles dentro do universo fashion. Veja aqui e aqui.
5) A Nova Segregação: Racismo e Encarceramento em Massa
O livro de Michelle Alexander revela os alicerces do racismo dentro da democracia liberal moderna. Boa reflexão sobre o sistema carcerário. Publicado em 2010, vendeu cerca de 600 mil exemplares e permaneceu na lista de mais vendidos do The New York Times por mais de 120 semanas.
6) Blogueiras Negras
O portal criado por escritoras negras reúne aproximadamente 200 autoras que usam a escrita como combate ao racismo e estímulo à produção textual entre as mulheres negras. Promove a disseminação do conhecimento sobre diferentes temas. Veja em aqui.
7) What Happened, Miss Simone?
Indicado ao Oscar de melhor documentário, What Happened, Miss Simone? (2015), de Liz Garbus, conta a história de uma das maiores lendas da música americana, que sacrificou a vida pessoal e a carreira ao lutar contra o racismo. Nina Simone foi pianista, cantora, compositora e uma obstinada ativista pelos direitos dos negros norte-americanos. Disponível na Netflix.
8) Cidade de Deus: 10 Anos Depois
Um dos filmes mais importantes do cinema brasileiro, Cidade de Deus (2002) é revisitado neste documentário de 2013, de Cavi Borges e Luciano Vidigal. A produção mostra o que mudou nas vidas dos jovens intérpretes do longa de Fernando Meirelles, que retrata a desigualdade social e a ascensão da violência na favela homônima do Rio de Janeiro. O documentário destaca os caminhos da construção social no Brasil, que desumaniza a população negra, e aborda a participação dos negros na produção audiovisual nacional, quase nunca fora dos estereótipos.
Disponível na Netflix.
9) Eu Não Sou Seu Negro
Com narração de Samuel L. Jackson, o documentário indicado ao Oscar é baseado no livro inacabado de James Baldwin. O diretor Raoul Peck espelha as propostas dos líderes ativistas Medgar Evers, Malcolm X e Martin Luther King (na foto acima) em questões raciais contemporâneas.
Disponível na Net Now
10) Engravidei, Pari Cavalos e Aprendi a Voar Sem Asas
Inédita no Estado, a peça da dramaturga e escritora mineira Cidinha da Silva aborda a temática da solidão da mulher negra. O texto, escrito para o coletivo teatral Os Crespos, foi produzido com base em 55 entrevistas com mulheres negras de diferentes perfis: presidiárias, universitárias, catadoras de material reciclável, trabalhadoras de salões de beleza, sambistas, estrangeiras e moradoras de rua, entre outras. Veja o teaser do espetáculo aqui.