Vamos avançando na cronologia das músicas vencedoras do troféu Calhandra de Ouro. A terceira edição da Califórnia da Canção Nativa realizou-se entre 6 e 9 de dezembro de 1973 e contou com 30 canções concorrentes. Como já havia referido em texto anterior, surge nessa ocasião mais um dos marcantes personagens das canções do festival uruguaianense: Gaudêncio Sete Luas.
Nascido do gênio literário de Luiz Coronel e da maestria musical de Marco Aurélio Vasconcelos, o personagem é o centro de uma sofisticada peça cancionista, composta em 10 cantos que contam as peripécias vividas pelo gaúcho Sete Luas – aquele que, ao trovejar a gritaria, fazia relampejar sua adaga, afirmando "não vai ficar pra semente quem nasceu pra ventania".
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Naquele dezembro de 1973, a inspiradíssima parceria de Coronel e Marco Aurélio – que ainda viria a consagrar canções como Cordas de Espinho, O Tempo e o Vento e os cantos de Leontina das Dores – e que no ano anterior havia sido premiada em segundo lugar com Gaudêncio Sete Luas, concorreu com mais três dos cantos que compõem a referida obra: Gaudêncio Sete Luas Avalia Sua Guitarra, Gaudêncio Sete Luas Fala de Crendices e Assombrações e Canto de Morte de Gaudêncio Sete Luas. As duas últimas fazem parte do LP que registra a terceira edição do festival.
A canção pede silêncio e lenços em aceno. A voz majestosa de Rhosamaria, que combina tristeza e transcendência, numa das mais tocantes performances de interpretação da nossa música, anuncia que o "velho Gaudêncio pulou a cerca da vida". Introduzindo e pontuando o canto, um dos inexcedíveis talentos da música brasileira: o mago Plauto Cruz com sua flauta encantada. A Calhandra de Ouro pousa suavemente sobre o Canto de Morte de Gaudêncio Sete Luas.
Hoje, e creio que ainda por tempo largo, essa canção é pura novidade. Ouvi-la é manhã recém-raiada, que mesmo que suceda as noites de cada tempo sempre de alguma forma nos inaugura: "No eucalipto se sente que Gaudêncio virou brisa"! Não seria maravilhoso que os 10 cantos do velho Gaudêncio Sete Luas pudessem ser reunidos numa nova gravação? Muita gente, por certo, haveria de gostar muito!