Após a polêmica envolvendo a Secretaria da Saúde e o grupo Falos & Stercus – que realizaria a nova temporada do espetáculo Mithos nas dependências do Hospital Psiquiátrico São Pedro –, a companhia teatral organizou uma manifestação de resistência em frente ao local onde a peça seria encenada. Marcada para as 20h deste sábado, o ato busca abrir um canal de diálogo entre a Secretaria da Saúde e os grupos teatrais, que têm o apoio da Secretaria de Cultura. Além do Falos, também participam do ato os outros grupos que realizavam apresentações no São Pedro (Oigalê Cooperativa Teatral, Povo da Rua e Grupo Neelic).
Marcelo Restori, diretor do Falos & Stercus, alega que até a última sexta-feira não havia sido feito nenhum comunicado sobre a impossibilidade da realização do espetáculo – e que o grupo está também impedido de encená-lo em outro local, já que os objetos usados em cena ficaram dentro do Hospital.
– Eles quebraram o nosso cadeado, botaram outro e estão inviabilizando que as pessoas entrem lá. A gente não tem nem como tirar nossos figurinos, o material todo está lá. Material de rapel, som, luz, tudo – conta Marcelo Restori.
O chamado para o ato ocorreu pela página do Facebook do Condomínio Cênico do HPSP. De acordo com o texto, um ator do grupo teria sido agredido fisicamente por um dos diretores da Secretaria de Saúde, Carlos Pinto Sobrinho, ao tentar gravar a conversa.
O diretor-geral da Secretaria de Saúde, Francisco Bernd, informou que o grupo Falos & Stercus poderá retirar o material de trabalho mediante solicitação por escrito. Após formalizado o pedido, será autorizada a entrada de alguns representantes, que deve ocorrer com o acompanhamento de técnicos em segurança do trabalho do Hospital Psiquiátrico São Pedro.
Leia abaixo a carta de Restori em resposta à ação tomada pela Secretaria da Saúde.
"O limitado entendimento e o descaso do secretário da saúde do estado do Rio Grande do Sul com a importância da cultura, nos faz sentir violentados pelo próprio estado.
A falácia de suas ações são recorrentes - no início do ano mentiu pra sociedade e para seu colega de governo, o secretário de cultura, ao declarar publicamente que todos os 6 pavilhões do hospital psiquiátrico São Pedro, tombados pelo patrimônio histórico, por serem mais adequados a cultura, seriam passados para a SEDAC, assim como já havia acontecido com o 5 e 6 na gestão anterior.
Agora, sem nenhum diálogo e de forma truculenta ele rompe o acordo que ele mesmo propôs e impede que muitos trabalhadores da cultura exerçam seu trabalho e possam viabilizar seu sustento, assim como impossibilita o acesso do cidadão a esse bem cultural.
O Falos & Stercus entrou no hospital no final de 2000 para a realização do espetáculo In Surto, na época o diretor Régis viu nessa proposta, a possibilidade de humanizar as relações com os pacientes e nos ofereceu os pavilhões 5 e 6 que estavam ociosos a uns 10 anos. Desde então, nós e nossos colegas do Oigalê, Povo da Rua, Neelic e Caixa Preta não só humanizamos as relações com os internos, funcionários e população do entorno, que se reuniam frequentemente em nossas apresentações, ensaios e oficinas, como também revelamos o espaço para a sociedade, dando um novo significado a aquele lugar deteriorado pelo descaso do estado criando processos poéticos em diálogo com a sociedade até sermos proibidos de fazer tudo isso no governo Yeda.
Eu pessoalmente, como artista e cidadão quero cobrar do governo do estado uma resposta mais qualificada no entendimento do valor da cultura e saber: se vamos ser expulsos do hospital, onde irão viabilizar outro espaço para o nosso trabalho e o acesso da população a esse bem cultural?
Aproveito também para questionar publicamente a responsabilidade do corpo de bombeiros, por ter interditado apenas os 6 pavilhões históricos do hospital mesmo estando ciente de que todo o hospital psiquiátrico São Pedro apresenta visível deterioração estrutural e não possui PPCI?
Pois, como profissional e pai, estou me sentindo violentado pelo estado por não poder exercer meu trabalho e ter presenciado o tétrico ato do soco do senhor Luiz Carlos Pinto Sobrinho em meu filho - situação nem comentada pelo secretário de saúde, que pelo visto aprova a atitude autoritária e criminosa de seu assessor.
Espero sinceramente que o governador não compartilhe dessa atitude e nos dê uma resposta mais inteligente do que seu secretário, pois toda vez que se rompe com a cultura, a sociedade se desumaniza e a barbárie se instaura."
Marcelo Restori, diretor do Falos & Stercus