Depois de quatro sessões da peça Habitantes D'Ela no Instituto Ling, a dramaturga Maria Luíza Madureira usou as redes sociais para denunciar uma "tentativa de coerção" feita pelo centro cultural contra discursos políticos seus. Em um texto publicado nesta segunda em seu perfil no Facebook, a autora diz que fez discursos a respeito do fim do Ministério da Cultura (que acabou sendo reativado) e do que considera um "governo ilegítimo" de Michel Temer após as duas primeiras apresentações, nos dias 20 e 21 de maio. Antes da terceira sessão, na última sexta, uma funcionária do instituto teria a procurado e dito que "falar do Ministério da Cultura, tudo bem, mas de política, não". Para Maria Luíza, a atitude não pode ser configurada como censura – até porque o discurso foi repetido nas duas sessões seguintes, sem qualquer interferência do Instituto Ling –, mas uma intimidação "feita de forma delicada".
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– Eu falei por 40 segundos no primeiro dia, disse que os progressos sociais dos últimos 13 anos corriam riscos, que o Ministério da Cultura era só uma parte do problema, e gritei "Fora, Temer". Alguns aplaudiram, outros ficaram quietos, outros gritaram "Fora, Temer" e pronto. No dia seguinte, repeti quase a mesma coisa. Na sexta-feira seguinte, uma pessoa bate na porta, de forma muito delicada, falando calmamente, quase constrangida e me pede para não me manifestar sobre política. Eu fiquei olhando com uma cara de perplexidade – conta a dramaturga, por telefone – Respondi que não podia atender o pedido, afinal a Constituição garante meu direito de manifestação.
Ainda de acordo com Maria Luíza, a funcionária do Instituto Ling encerrou a conversa dizendo que aquilo "teria consequências". Neste momento, a dramaturga diz que ficou nervosa:
– Aí, eu fiquei braba. Falei "acho que tu não está entendendo, quero que tu preste atenção, porque é muito sério e grave isso que tu estás fazendo". É claro que tem consequência, tudo tem consequência, a reação dela também tem consequência.
Nas duas últimas sessões, além da manifestação política, Maria Luíza falou com o público sobre a conversa que tivera com a funcionária. Segundo ela, não houve qualquer reação do Instituto Ling a esses discursos – a peça saiu de cartaz no último sábado, sem que qualquer incidente tenha sido registrado. O Instituto Ling foi procurado pela reportagem pela manhã desta segunda, mas não enviou resposta até as 18h. A dramaturga afirma que não guarda qualquer rancor em relação ao Instituto, à funcionária (de quem prefere preservar a identidade) ou a qualquer um dos envolvidos:
– Pelo contrário, mandei uma carta para eles. De minha parte, não tem ressentimento, porque pouco interessa se eu estou triste o feliz, é uma questão pública. Eu acho que essa conversa aconteceu porque aquele ambiente é um ambiente onde o valor maior é a nobreza, os bons modos, a delicadeza. É muito estranho quando pessoas como eu fazem o que eu fiz. Eles só não foram libertários em tentar me intimidar.