Os desfiles de Vila Isabel e São Clemente trouxeram de volta à Sapucaí na segunda-feira os temas políticos, já abordados na primeira noite pela Mocidade, que usou Dom Quixote contra a corrupção e os desvios na Petrobras. A Vila contou a vida de Miguel Arraes e a São Clemente levou até panelaço.
Já a inovação coube aos drones do Salgueiro, que saiu aos gritos de "é campeão", e a uma Portela com carros renovados por Paulo Barros. Sem títulos desde 1984, a Portela foi a grande surpresa, com Paulo Barros trazendo suas alegorias animadas – incluindo Moisés indo no voo da águia até o Monte Sinai e soltando água na pista. As cores e as coreografias, que o tornaram famoso na Tijuca, também estavam lá. Até o enredo indicava: no voo da águia, uma viagem sem fim.
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Logo no começo do segundo dia, a comissão de frente de Jaime Arôxa, da Vila Isabel, trouxe um cortejo fúnebre nordestino, com corpos carregados em redes, e a morte pairando sobre a avenida – um belo efeito da patinadora Telma Delelis, que não parecia patinar, mas deslizar. Para homenagear o centenário de Arraes, as mazelas sociais que ele enfrentou foram lembradas na avenida pela Vila: a seca, as moradias sobre palafitas, as dificuldades dos cortadores de cana, o analfabetismo.
A São Clemente, terceira a desfilar, também trouxe crítica política, ao replicar, ao fim de seu desfile, os panelaços que tomaram o País no ano passado contra o PT e a presidente Dilma Rousseff. Seu enredo foi: mais de mil palhaços no salão. Em duas alas de palhaços, as tampas de panelas deram o tom, assim como na última alegoria. O tom político já havia sido sentido na avenida no domingo, durante o desfile da Mocidade. A escola falou de Dom Quixote de La Mancha e ousou ao comparar os moinhos enfrentados pelo personagem de Miguel de Cervantes aos percalços da vida do brasileiro; entre eles, a corrupção. A comissão de frente fazia alusão ao escândalo na Petrobras.
Já o Salgueiro lançou mão de drones – uma forma de ver o desfile "do alto" e combater "buracos", acertando a harmonia. O enredo ópera dos malandros e o samba empolgaram a plateia e a escola encerrou o desfile aos gritos de "é campeão". O mesmo reconhecimento teve a Beija-Flor, destaque da primeira noite. A escola homenageou Cândido José de Araújo Viana, o Marquês de Sapucaí, outro político influente durante o Império, que nomeia o sambódromo.
As duas últimas escolas que passaram no Sambódramo da Marquês de Sapucaí apresentaram enredos em homenagem a ídolos da música brasileira. A Imperatriz Leopoldinense levou para a avenida a dupla sertaneja Zezé Di Camargo e Luciano. Os dois estavam no último carro, que fazia referência à música É o Amor, sucesso que marcou a trajetória dos irmãos. Mas eles não foram os únicos artistas no desfile. A cantora e compositora Paula Fernandes se apresentou no tripé Abelha Rainha, simbolizando a polinização das abelhas entre girassóis de campos goianos. O ator Ângelo Antônio e a atriz Dira Paes, que representaram o seu Francisco e dona Helena, mãe da dupla, no filme Os Dois Filhos de Francisco, vieram fazendo encenações de um casal em uma casa simples do interior.
O encerramento da noite ficou por conta da Mangueira, em um desfile que emocionou o público. A homenageada foi a cantora Maria Bethânia, pelos 50 anos de carreira. O enredo Maria Bethânia – a menina dos olhos de Oyá permitiu uma Mangueira diferente dos últimos anos. A escola tinha uma alegoria intitulada Abelha Rainha, mas era uma relação de como a cantora é chamada após ter gravado a música Mel. Neste carro vieram vários amigos da cantora como as também cantoras Ana Carolina, Adriana Calcanhoto e Zélia Duncan, o compositor Moacyr Luz, e a diretora de teatro Bia Lessa, que já dirigiu vários espetáculos de Bethânia. No fim do desfile, Maria Bethânia, emocionada, acenou para o público das arquibancadas populares da Praça da Apoteose. Ela desfilou no último carro, chamado de Céu de Lona Verde e Rosa, ao lado das afilhadas Nina e Júlia, de 12 anos, e enquanto dava um abraço nelas ouviu o público consagrando a escola com o grito de "é campeã".
Enfrentando a crise
Todas as escolas haviam anunciado que este era um ano de contenção de despesas, uma vez que não foram encontradas fontes de patrocínio dos enredos na iniciativa privada nem em prefeituras e governos mencionados direta ou indiretamente. A Mocidade, no entanto, estava rica, e se sobressaiu no primeiro dia. Na Grande Rio, outra que adotou drones, tampouco havia sinal de crise. Mesmo sem o patrocínio esperado da prefeitura de Santos, cidade homenageada, a escola de Duque de Caxias fez um desfile luxuoso, com bonitos efeitos especiais. Os coreógrafos Priscilla Mota e Rodrigo Negri foram à Argentina buscar a tecnologia para uma imensa bola de futebol, que era inflada e encobria a Fonte de Itororó.