A maior banda de rock'n'roll do planeta deu o pontapé inicial da América Latina Olé Tour na quarta-feira com todo o gás. Os Rolling Stones apresentaram-se em Santiago do Chile, lotando o Estádio Nacional com mais de 50 mil pessoas – 21 anos depois da primeira passagem da banda pelo país. Os chilenos, aliás, viveram uma semana stone: o grupo chegou à capital no domingo e circulou pela cidade, passeando por locais turísticos e comendo em restaurantes. (Segundo a produção, eles resolveram relaxar em Santiago porque isso seria impossível na próxima parada, em Buenos Aires, por conta do fanatismo selvagem dos argentinos.)
A aguardada celebração começou em tom de reconciliação: o show de abertura ficou a cargo de Los Tres – respeitada banda chilena que, em 1995, recusou-se a abrir para os Stones em Santiago por discordar quanto ao cachê e ao horário em que tocariam. Os próprios roqueiros ingleses teriam selecionado o grupo liderado pelo vocalista e guitarrista Álvaro Henríquez. A decoração do palco de 58 metros de largura e 25 de profundidade é simples, mas de gosto duvidoso: duas molduras enquadram a boca de cena e o telão central – ainda há mais dois telões laterais –, exibindo estampas e cores berrantes em um estilo que lembra o pintor Romero Britto.
Os reparos, no entanto, cessam por aqui: a partir do momento em que começa a rodar no telão uma animação em vídeo, com mapas do Chile e da América Latina misturados a imagens dos Stones, o público é presenteado com uma irretocável celebração da vitalidade do rock. Mick Jagger, Keith Richards, Ron Wood e Charlie Watts, acompanhados dos músicos de apoio, iniciaram o concerto em alta voltagem com um trio de petardos dançantes: Start Me Up, It's Only Rock'n'Roll (But I Like It) e Let's Spend the Night Together. Vestindo no início um brilhante casaco de lantejoulas, Jagger levantou a galera e desafiou seus 72 anos com suas costumeiras coreografias aeróbicas e corridas pela passarela, que avança dezenas de metros sobre a multidão. Em seguida, o ritmo desacelera um pouco – mas não a empolgação no palco e na plateia – com o soul rock Tumbling Dice e com a climática Out of Control, que alterna momentos lentos e rápidos.
Desde o começo, o cantor comunicava-se em espanhol, lendo frases simpáticas que informavam o quanto a banda estava feliz em voltar ao Chile. Usando gírias e referências locais, Jagger disse que, nos dias em que descansaram em Santiago, visitaram diversos "locais culturais".
– Fomos à casa de Pablo Neruda e a um café con piernas – citando os cafés da capital chilena atendidos por garçonetes que circulam entre os clientes com roupas sensuais.
Leia mais:
Mick Jagger quer saber quais músicas os brasileiros querem ouvir no show
Ingressos para os Rolling Stones em Porto Alegre estão esgotados
Veja os pedidos de camarim dos Rolling Stones na Argentina
Outra média com os chilenos foi a execução de uma música escolhida em uma votação pelas redes sociais. A vencedora foi She's a Rainbow, canção do disco Their Satanic Majesties Request (1967) que eles não tocavam desde 1998 e na qual se destaca o piano de Chuck Leavell. Com Jagger no violão e Richards e Wood costurando a harmonia nas guitarras, a bela balada Wild Horses foi cantada em coro pelo estádio. Depois dos hits Paint It Black e Honky Tonk Women, veio o tradicional momento do show em que Keith Richards canta um par de temas. Todo sorridente, o veterano guitarrista interpretou You Got the Silver e Happy.
O ponto alto da noite foi o blues Midnight Rambler, que ganhou uma interpretação nada menos do que épica – com Jagger tocando harmônica e a dupla de guitarristas alternando-se em solos saudados pelo público, enquanto Charlie Watts segurava a batida com pulso firme na bateria. A sequência de clássicos continua com a trinca Miss You, Gimme Shelter (Jagger em dueto com a vocalista Sasha Allen) e Jumpin' Jack Flash.
Depois de uma rápida pausa em que sai de cena, Jagger retorna enrolado em uma capa até o chão, feita de plumas vermelhas e pretas: é a vez de Sua Satânica Majestade cantar Sympathy for the Devil, enquanto o telão mostra símbolos demoníacos como um pentagrama e uma cabeça de bode. Para finalizar, a dançante Brown Sugar. No bis, You Can't Always Get what You Want – que teve a participação de um afinado grupo coral local – e a indefectível (I Can't Get No) Satisfaction.
O final do memorável concerto provou que o tempo está do lado dos Rolling Stones: não havia sombra de cansaço ou desinteresse na performance dos roqueiros septuagenários – Ron Wood é o caçula da gangue, com 68 anos. Todos pareciam estar se divertindo tanto quanto seus fãs. Um episódio resume o espírito jovial do quarteto: em um momento de Satisfaction, Jagger correu de ré e sem querer tropeçou em Richards, também de costas; surpreendido, o guitarrista deu um coice de leve no vocalista, que revidou com um empurrão zombeteiro. Então, durante alguns instantes, esses dois moleques ficaram brincando de se provocar.
No dia 2 de março, será a vez de Porto Alegre receber no Estádio Beira-Rio esses velhinhos transviados. Será que você vai ter fôlego para acompanhá-los?
Veja o setlist do show:
- START ME UP
- IT'S ONLY ROCK'N'ROLL
- LET'S SPEND THE NIGHT TOGETHER
- TUMBLING DICE
- OUT OF CONTROL
- SHE'S A RAINBOW (PEDIDO DO PÚBLICO)
- WILD HORSES
- PAINT IT BLACK
- HONKY TONK WOMAN
- YOU GOT THE SILVER
- HAPPY
- MIDNIGHT RAMBLER
- MISS YOU
- GIMME SHELTER
- JUMPING JACK FLASH
- SYMPATHY FOR THE DEVIL
- BROWN SUGAR
- CAN'T ALWAYS GET (COM CORAL)
- SATISFACTION