Quando sua história estiver contada, ela estará contada
Johnny Cash, o grande cantor americano, já na velhice, gravava uma canção famosa. Depois da primeira de duas rodadas da letra, ele para. O técnico de som o adverte da falha, ao que ele contra argumenta: quando minha canção está cantada, ela está cantada. Isso vale para a sua história. Escute-a. De um miniconto a um romance, é preciso saber quando a história está contada. Nem mais, nem menos. Confie em seu ouvido.
Ensaio, performance e gravação
A escrita, como a música, pode ser exercida em três instâncias. O ensaio (ou prática): equivale na escrita às anotações, aos diários, aos esboços, etapas fundamentais do aprimoramento criativo. Performance (ou show): semelhante ao ato de escrever, é um espaço de liberdade e ousadia, de movimento, para que os personagens e cenários se desenhem, para que a trama apareça. Estúdio: o tempo do acabamento, da revisão, da regravação, quando se chega à forma acabada, assim está o disco para o livro.
A técnica liberta
Ao tocar um instrumento, aprendemos que a técnica liberta e não limita. Há um momento, depois de horas de prática, que o instrumento simplesmente desaparece. É quando a criatividade soa livre das amarras, das dificuldades de expressão. Escreva, escreva e escreva, todos os dias, como quem vence uma rotina programada de escalas e arpejos.
Cante com sua própria voz
Tantas vezes nas oficinas, escuto os participantes quererem cantar com uma voz que não têm. Querem escrever como os outros. Isto é como querer cantar com a voz do Frank Sinatra ou da Nina Simone. O máximo que atingiremos é um bom cover. Imite no começo, se preciso, mas só até encontrar sua própria voz. Vozes verdadeiras, amadas por seus donos e conhecidas em seus alcances, sempre soarão bem aos ouvidos de quem lê.
A verdade da respiração
Um antigo método de saxofone dizia que a respiração e que a vibração do som deviam soar sempre naturais. Para isso era preciso tomar consciência de como cada um de nós respira. Isto levaria à "verdade da respiração". O mesmo vale para a voz que narra. Ela tem de soar verdadeira, não em um sentido filosófico ou moral, mas humano. Uma verdade construída a partir do autoconhecimento da experiência de estar no mundo. A história perfeita será, assim, como uma coluna de ar perfeita. Inspire a história, suspenda-a, depois sopre com controle. O som sairá redondo, quente e convincente, como Dexter Gordon, ou talvez rasgado e dilacerante, feito Gato Barbieri, mas um som em que a técnica nunca aparecerá como artifício, refúgio dos falsos virtuoses.