A impunidade sofreu um pesado golpe na última quarta-feira. O senador Delcídio Amaral (PT) e o banqueiro André Esteves foram presos pela Polícia Federal na Operação Politeia. A música sempre foi uma maneira interessante de chamar a atenção para a política, através de canções de protesto contra injustiças e, especialmente, a corrupção. Muitas das letras compostas na época da ditadura, ou na década de 1980, se mantém atuais.
O professor de Literatura e escritor Luís Augusto Fischer listou e comentou algumas canções que podem servir de referência no atual momento do Brasil. Veja e ouça:
Apesar de Você
Veja um trecho:
Apesar de você
Amanhã há de ser
Outro dia
Eu pergunto a você
Onde vai se esconder
Da enorme euforia
– O samba “Apesar de você”, de Chico, canção lá de 1971, no momento mais agudo da ditadura, funcionava como uma senha para todo mundo que era de oposição, descontente com o regime militar. Era uma celebração da esperança, no contexto de uma letra meio cifrada, como costumava acontecer – não é claro quem é o “você”, mas é claro que a gente localizava nessa pessoa qualquer figura do regime, ou apoiador do regime.
Haiti
Veja um trecho:
Da fundação casa de Jorge Amado
Pra ver do alto a fila de soldados, quase todos pretos
Dando porrada na nuca de malandros pretos
De ladrões mulatos e outros quase brancos
Tratados como pretos
– Haiti é uma música impactante porque abordou de peito aberto o massacre do Carandiru, aquela truculência de Estado contra pobres presos indefesos, truculência que a classe média aplaudia e que o Caetano e o Gil atacaram de modo corajoso, justamente ao celebrarem os 25 anos da Tropicália. O tema parece que continua tão atual quanto na época.
Brasil
Veja um trecho:
Brasil!
Mostra tua cara
Quero ver quem paga
Prá gente ficar assim
Brasil!
Qual é o teu negócio?
O nome do teu sócio?
Confia em mim…
– A música que ficou famoso pelos dizeres "Brasil, mostra tua cara" atacava o status quo do momento e até hoje se mantém atual.
Vossa Excelência
Veja um trecho:
Sorrindo para a câmera
Sem saber que estamos vendo
Chorando que dá pena
Quando sabem que estão em cena
Sorrindo para as câmeras
Sem saber que são filmados
Um dia o sol ainda vai nascer
Quadrado
– Da geração mais atual, de Paralamas, Rappa, Titãs e tal, as coisas ficam mais explícitas ainda. Tanto a corrupção, com a denúncia dos 300 picaretas (referência à música "Luiz Inácio e os 300 Picaretas", dos Paralamas do Sucesso), quanto o caráter de classe da opressão contra os negros, "Todo camburão" (d'O Rappa), ou aquela do Farofa Carioca da mesma época, “A carne mais barata do mercado é a carne negra”, são enunciadas com todas as letras.