Se é um bar, tem música ao vivo e o repertório inclui covers, não há dúvida: o set list deve passar por Djavan, Lulu Santos e Caetano Veloso. Mesmo com o reinado do sertanejo universitário e o espaço conquistado por novos artistas da MPB ao rock, esses músicos mantêm cadeira cativa nos rankings que evocam banquinho e violão.
Quem garante é o Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad): dos compositores brasileiros que mais faturam com a execução de suas faixas nos estabelecimentos com música ao vivo, Djavan é o rei. O alagoano liderou o top no primeiro trimestre deste ano - assim como em 2014 e 2013 -, seguido por Lulu, Renato Russo e Caetano. Prova de que, para figurar entre os mais tocados nesse segmento Brasil afora, não precisa estar nas paradas de sucesso atuais ou entre os discos mais vendidos no momento. Ao menos não agora. O que a maioria dos nomes entre os 10 que mais lucram com shows em bares e afins têm em comum é ter feito muito sucesso antes dos anos 2000, quando um artista ainda "estourava" em rádio e TV, com exposição massiva e centenas de milhares de álbuns comercializados. Basta ver o exemplo de Djavan: entre as mais pedidas do repertório do músico, estão canções como Flor de Lis (1976), Se (1992) e Eu Te Devoro (1998).
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- Esses compositores funcionam na música ao vivo porque têm hits variados, que as pessoas ainda cantam junto. Acaba sendo um repertório confortável para o público de bar - avalia Juarez Fonseca, jornalista, crítico musical e colunista do 2º Caderno. - É o cânone da música brasileira, que atravessa gerações.
Em vídeo, confira a opinião do músico Rafael Brasil e do público de bar sobre o porquê desses autores fazerem sucesso na noite
Na opinião do professor e compositor Guto Leite, esses autores oferecem um repertório que possibilita o meio-termo entre o som ambiente e a música que gera identificação e traz uma mensagem:
- Eles têm canções que se prestam a isso. Quem está indo lá para ouvir o formato voz e violão geralmente não quer dançar e ficar passando pelas mesas. Vai lá pela canção.
Com mais de 20 anos de estrada na noite gaúcha, o músico Rafael Brasil nem espera os constantes bilhetes do público pedindo músicas dos reis do banquinho e violão. Já é praxe ter Djavan, Lulu e Caetano no repertório.
- Procuro tocar aquilo de que gosto somado com o que funciona - conta Brasil. - Tem que agradar.
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Mas não basta tocar os compositores confirmados. O público quer também os sucessos confirmados - sem muito espaço para os lados B. Atração dos bares porto-alegrenses, Zeco Darde diz que, se quer tocar Lulu, por exemplo, não se pode deixar de fora Toda Forma de Amor. E o mesmo vale para outros autores.
- Não se pode fugir dos lados A nesse clima de barzinho e boteco. Minha função é animar o pessoal. Por isso, aposto em músicas como Se e Te Devoro (ambas de Djavan). São as mais pedidas e todo mundo canta - ressalta.
Tocando há mais de 15 anos na noite, a cantora Lais Tetour tem outra explicação sobre por que a lista dos mais pedidos do público se mantém com pouca variação há tanto tempo:
- Hoje, faltam letras com mais poesia, e esses autores, principalmente o Djavan, exploram isso. O Lulu, por outro lado, tem melodias muito chiclete. As pessoas cantam a letra e tomam para elas o significado. Uso muito como uma música coringa.
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Aos poucos, a lista de autores que mais arrecadam no segmento música ao vivo deve se transformar. No levantamento do Ecad do primeiro trimestre deste ano, Bruno Caliman, autor de hits do sertanejo universitário como Domingo de Manhã, e Ronny dos Teclados, do arrocha, estão entre os 10 primeiros.
- A sensação que tenho é que vamos ter outro cânone de bar. Essa geração que gosta de se divertir com o sertanejo vai querer seguir com isso. Mas deve ocorrer a longo prazo, não agora - afirma Leite.
Essa substituição natural por compositores pós-2000, incluindo novos nomes da MPB e do rock, deve encontrar barreiras na música ao vivo. Com a internet e o consumo mais segmentado, a consolidação de um hit pode demorar mais.
- O sucesso precisa de repetição. Esses caras do pós anos 2000 não terão a oportunidade de estourar no rádio - ressalta Fonseca. - Vai mais da pessoa se interessar individualmente. Isso é diferente do que acontecia antes.