Prometi a mim mesmo não escrever mais sobre Mário de Andrade. Depois de ter feito a crônica dos embates entre andradianos e internacionalistas na música de concerto brasileira, até na presença do próprio Hans Joachim Koellreutter, mentor dos internacionalistas, achei que bastava. Além disso, essas coisas paulistanas foram deixando de me interessar: modernismos, semanas de arte moderna, os debates culturais de outros tempos. Restou o interesse pela arquitetura paulistana, que prossegue inabalável.
Mas neste ano correm os 70 anos de Mário de Andrade e até a recém-encerrada Festa Literária de Paraty fez as suas homenagens ao escritor. Por um momento, ele voltou a ser o assunto da hora. Talvez por isso e sem nenhuma razão específica comecei a ler Eu Sou Trezentos, de Eduardo Jardim, lançamento recente e que é uma biografia do Mário através da obra. De repente, chegando à metade do livro, encontrei o motivo que me levou a investigar um assunto que não me interessa mais.
Lá está, bem colocada, a diferença entre o Mário de Andrade poeta - que eu admiro - e o Mário de Andrade cronista da música - que admiro pouquíssimo. Até agora, eu nunca tinha conseguido conciliar estes dois lados, o poeta e o teórico, isso que tenho até uma peça para piano chamada Sobre um Poema de Mário de Andrade.
Na verdade, essa peça é o meu "opus 1", que o pianista Ney Fialkow toca muito bem. Mas: como liberar o Mário poeta do Mário autor de Ensaio sobre a Música Brasileira?
O livro de Eduardo Jardim resolve o impasse: "a produção poética (de Mário de Andrade) fica preservada das imposições doutrinárias", o aspecto mais antipático do Ensaio. Depois dessa frase, estou em tranquilo. Posso voltar a ler o Noturno de Belo Horizonte com toda a tranquilidade, talvez até ouvindo um trecho do poema que o compositor Camargo Guarnieri colocou em música, "Serra do Rola-Moça". Música e poesia se reconciliam. Ficam para trás as doutrinas, estas coisas paulistanas no século passado.
Leia mais sobre cultura e entretenimento