Então a polêmica do preço dos ingressos se acendeu de vez. Há a questão econômica, dos R$ 150 aos R$ 750 para assistir a Gil e Caetano. Há a questão cultural, a dificuldade de conciliar quem um dia foram esses dois - mas lá se vão décadas da contestação tropicalista... - e os 150 x 750 de agora. Embaixo disso tudo há a impressão de elitização progressiva da MPB "de raiz", combativa um dia, cheia de luxos agora que se transformou em memória.
Bem da segunda década do século essa discussão sobre reversão de elitizações. A ópera, por exemplo, uma vez foi vista como o cúmulo da elite, o máximo de espetáculo para "bacanas", como diria Moisés Mendes.
Hoje, a vez é da MPB. É possível até fazer certos exercícios perversos, algumas comparações inusitadas.
Já que para quem gosta de Gil e Caetano eles se equivalem à ópera e para quem gosta de ópera ela se equivale a Gil e Caetano, o mérito artístico de ópera e MPB se compara. Os ingressos de ópera, a quantas andam?
Se alguém quiser ver o mesmo Otelo de Rossini que a presidente viu há algumas semanas, e no mesmo Scala de Milão, poderá pagar o mínimo, R$ 190, para sentar num lugar modesto, mas com boa visão do palco, ou o máximo, R$ 460, para ficar entre os bacanas da plateia.
Ou, cruzando o Atlântico e mudando o compositor, se alguém quiser ver e ouvir o Otelo de Verdi no Metropolitan de Nova York, a coisa fica mais leve - ou mais salgada: R$ 90 para a última fila do último balcão (mas bem sentado) ou R$ 1.100 para os bacanérrimos.
O importante é que há opções de preços para todos os gostos e todos os bolsos na ópera de hoje, não se fica apenas entre o proibitivo e o mais proibitivo. No Municipal de São Paulo, R$ 50 compra um lugar na galeria para assistir a Wagner. Na Deutsche Oper de Berlim, um Dido e Eneias sai entre R$ 75 e R$ 250. Nada mal?
Ora, melhor ainda em Porto Alegre, onde um Dido e Eneias do Instituto de Artes da UFRGS sempre sai grátis! Se for apenas pelo viés econômico, as polêmicas da elitização da música talvez tenham que ser revistas. Certas noções do século passado, pelo que se sente no bolso, não se aplicam mais.