O poeta Manoel de Barros nos ensina que "a importância de uma coisa não se mede com fita métrica, nem com balanças, nem barômetros etc., a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós". Nos últimos dias, tive a oportunidade de assistir a dois espetáculos singulares: o lançamento do projeto Sul e uma viagem musical por este sul no show Noites Gaúchas.
No Theatro São Pedro lotado, pude testemunhar o arrebatamento a que foi conduzida a plateia pela voz e pela música de Luiz Marenco junto aos versos de Sergio Carvalho Pereira. Pairava no ar o espírito da reverência. Os artistas estreavam um repertório, e é sempre arriscado montar um espetáculo apenas com canções inéditas.
Mais, canções intimistas, com letras densas, pictóricas, como se fossem fotografias da alma do campo, contudo, cada sílaba, cada nota, cada nuance instrumental - todas dentro de um coerente rigor estético - foi assimilada, degustada, fruída com gosto de coisa bonita. Quando ao final, Marenco, aplaudido em pé, concedeu um de seus sucessos - Cantador de Campanha -, a reverência transformou-se em êxtase. Uma consagração da arte regional num dos templos da cultura gaúcha.
Dias depois, no CTG Coxilha Verde, em Formigueiro, assisti maravilhado, mais uma vez, ao show Noites Gaúchas. Embarca-se em uma máquina do tempo que nos leva até a década de 1940 e de lá nos conduz pelo universo da canção regional.
Ricardo Freire, Ângela Gomes, Sérgio Rosa e Tuny Brum trazem para a mesma cena Conjunto Farroupilha, Irmãos Bertussi, Leonardo, Barbosa Lessa, Paulo Ruschell, Silva Rillo, Tocaio Ferreira, Nico e Bagre Fagundes, entre muitos. E tocam e cantam para produzir enlevo. A plateia quase levita de encanto.
Considerando o ensinamento do poeta pantaneiro, se as coisas valem pelo encantamento que são capazes de produzir, posso afirmar que presenciei dois eventos muito significativos da cultura popular gaúcha. Mais uma vez, presto reverência ao talento e ao engenho dos nossos artistas.