Zélia Duncan e Martinho da Vila cantam, juntos, É de Estarrecer, cáustica canção de Itamar Assumpção. Certeiro, Itamar põe o dedo na ferida: ser e estar, o verbo to be em inglês, "parece a mesma coisa, mas não é". Essa indistinção aglutinadora explica muitas das tergiversas ações americanas ao longo da História.
Americanos agem como se fossem a polícia do mundo e correm atrás de quem não lhes legitima o posto, tanto faz se terroristas do Estado Islâmico ou mafiosos da Fifa. To be. Uma palavrinha tão pequena, uma confusão semântica dos diabos. Ser e estar, a mesma coisa? É de estarrecer.
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Tergiversar, em sua sequência de consoantes duras, é uma das minhas palavras preferidas. Desassossego é outra. Linda no significado e na sonoridade, obsessiva, excessiva pela repetição da mesma letra sibilante, poética, perfeita. Desde que comecei a ler A Ilha da Infância, terceira parte de Minha Luta, as memórias de Karl Ove Knausgard, ando assim: desassossegado, com todos os "esses" a que tenho direito.
Hoje uma das mais potentes vozes da literatura mundial, o norueguês faz parecer fácil o que é extremamente difícil: imantar o leitor à leitura do início ao fim. Knausgard me devolveu a sensação de querer devorar vorazmente as páginas de um livro. Editados pela Companhia das Letras, temos já os três primeiros volumes da série. São seis. Outro escritor que tem minha total atenção é Gonçalo M. Tavares. Narrativas curtas, influências kafkianas, fluência absoluta, humor e dor na medida. Segundo nos afirmou Saramago, será o próximo ganhador do Nobel em língua portuguesa.
Na semana em que estreio Crime Woyzeck, no Theatro São Pedro, registro outra peça local, maravilhosa, conectada à dramaturgia alemã: As Quatro Direções do Céu, inspirada direção de Camilo de Lélis. No auge de sua maturidade, Camilo contribui decisivamente para fortalecer nossa qualidade cênica. 2015 marca uma temporada teatral que tem oferecido à cidade diversão e arte em altíssimo nível. Não dá pra ignorar.