
No começo da década de 1920, a rua que corta Hamburgo Velho foi rebaixada em dois metros em uma ousada e polêmica obra de engenharia. As casas situadas na região onde se inicia a história de Novo Hamburgo precisaram ter suas fundações refeitas. E, nessa complexa operação, cresceram para baixo, ganhando um novo andar térreo. À época, a transformação foi defendida como necessária para melhor atender o fluxo ali gerado pelo comércio e pela estação de trem.
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Hoje, o casario do bairro que ajuda a contar o início da colonização alemã no Estado está protegido. Em maio, Hamburgo Velho foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). É o ponto final de uma conquista iniciada em 1985 com o tombamento da casa mais antiga da região, de 1831, que abriga o Museu Comunitário Casa Schmitt-Presser.
- O tombamento de Hamburgo Velho é um reconhecimento ao valor histórico da região e significa que tudo deve ser preservado, que nada pode ser destruído nem descaracterizado e que qualquer alteração deve passar por análise e aprovação - diz Eduardo Hahn, superintendente do Iphan no Estado.
A batalha pela preservação do patrimônio da histórica região começou ainda nos anos 1970, com a abertura da Fundação Ernesto Frederico Scheffel na mais imponente construção situada à Rua General Daltro Filho. Erguido em 1890, o casarão pertenceu a Adão Adolfo Schmitt, filho daquele que é considerado o fundador de Hamburgo Velho, o comerciante João Pedro Schmitt. Além de residência da família, era espaço de comércio e hospedaria de viajantes. E, em seu amplo salão, eram realizados eventos sociais da comunidade, como bailes e pioneiras projeções de cinema.
Ao longo do século 20, abrigou um hospital na epidemia de gripe espanhola, virou escola do Estado e definhou ao se transformar em uma espécie de cortiço. Deteriorado pelo descuido, o imóvel foi restaurado para, em 1978, receber o acervo de Ernesto Frederico Scheffel, o garoto que nasceu em Campo Bom em 1927, cresceu em Hamburgo Velho e estudou arte em Porto Alegre e no Rio de Janeiro até partir para Florença, a terra do Renascimento italiano, onde fez sua carreira.
Nos anos 1970, quando começou a passar maiores temporadas no Brasil, Scheffel reencontrou suas memórias de infância e se lançou na missão de lutar pela preservação da região.
- Scheffel estudou na escola e, quando retornou, se surpreendeu com a deterioração - conta Angelo Reinheimer, curador da Fundação e biógrafo do artista. - Como havia um movimento da prefeitura em acolher suas obras em um espaço, ele viu a oportunidade de salvar a casa. Na região, não se tinha experiência de patrimônio histórico. Por isso, a iniciativa reverberou e passou a despertar atenção.
Contudo, não foi um processo fácil, especialmente em uma cidade em que o boom calçadista gerou especulação imobiliária.
- Scheffel chegou a fazer mutirões de pintura, dizia que era para redescobrir a beleza dos imóveis e sensibilizar as pessoas e as autoridades. Mas muitos queriam demolir. E ele foi mal interpretado pelos donos de imóveis que achavam que perderiam a propriedade. Scheffel chegou a ser agredido. Por isso, a virtude dele e da Fundação foi nunca deixar essa peteca cair, incentivando a restauração e cobrando as autoridades - conta Reinheimer.
No começo do ano, a Fundação chegou a ficar fechada pela falta de pagamento de telefone e luz e atrasos nos repasses da prefeitura de Novo Hamburgo. Com o tombamento, há uma previsão otimista para o futuro.
- Agora, entramos em outra etapa, com a possibilidade de buscarmos recursos para a manutenção e a nossa operação. Queremos voltar a funcionar aos fins de semana, como fizemos por 36 anos - prevê Reinheimer.
Fundação Ernesto Frederico Scheffel
> Rua General Daltro Filho, 911, em Hamburgo Velho, bairro histórico onde se iniciou a colonização alemã em Novo Hamburgo.
> Visitação de terça a sexta-feira, das 8h30min às 11h30min e das 13h30min a 17h. Informações no fone (51) 3593-6233.
> Ingressos a R$ 5 e R$ 3 (estudantes e idosos).
> O museu: guarda e apresenta 400 pinturas, desenhos e esculturas do artista Ernesto Frederico Scheffel, além de móveis e objetos de época.
> Preste atenção: na casa ao lado da Fundação Scheffel, funciona o Museu Comunitário Casa Schmitt-Presser, que conta a história da colonização alemã em Hamburgo Velho com objetos e documentos. Entrada gratuita.