
Com pelo menos três longas-metragens sendo filmados em diferentes cidades, o Rio Grande do Sul reforça seu potencial como cenário para produções audiovisuais locais e nacionais. Dois desses títulos têm como locação a Serra - O Filme da Minha Vida, de Selton Mello, e A Espera de Liz, de Bruno Torres -, enquanto Mulher do Pai, produção gaúcha assinada por Cristiane Oliveira, está sendo rodada na região da fronteira com o Uruguai.
Para além das paisagens, um dos fatores que têm atraído os cineastas, sobretudo os de outros Estados, é a iniciativa de municípios gaúchos em criar chamada film commission, órgão governamental (municipal, estadual ou federal) que tem por objetivo facilitar uma produção audiovisual articulando trabalhos de agentes públicos e privados.
- São lugares com história. É visível na textura das paredes, do piso, do solo. É um lugar tão bonito que o desafio é não se perder na paisagem - disse Mello em recente entrevista a ZH, quando afirmou que seu desejo em trabalhar na região é antigo, vem desde que começou a frequentar o Festival de Cinema de Gramado. Com filmagens previstas até o final de maio, O Filme da Minha Vida mostrará imagens registradas em Bento Gonçalves, Monte Belo do Sul, Santa Tereza, Garibaldi, Cotiporã, Farroupilha e Veranópolis.
Selton Mello roda O Filme da Minha Vida na Serra
Dois anos atrás, quando Selton Mello mirava o Rio Grande do Sul como cenário para emoldurar seu terceiro longa-metragem como diretor, encontrou em Ivane Favero uma interlocutora preparada para ajudá-lo. Secretária de Turismo e Cultura de Garibaldi, Ivane ajudou a criar a film commission do município no ano passado. Em 2010, quando ocupou o mesmo cargo em Bento Gonçalves, ela esteve à frente da formatação da film commission instituída no Estado .
- O primeiro passo é pedir que nos mandem a sinopse, para que a gente entenda quais são as necessidades do diretor em questões como cenários e infraestrutura - explica Ivane. - Nosso trabalho não envolve recursos financeiros, mas parcerias com rede hoteleira, restaurantes, comércio, órgãos de segurança pública e apoio em serviços de transporte e logística, entre outras atribuições, que podem envolver contato com o Daer para o bloqueio de uma estrada e ajuda na seleção de figurantes.
Assim como Bento e Garibaldi, municípios como Pelotas, Santa Maria e Bagé adotaram iniciativas semelhantes. No âmbito estadual, o então governador Tarso Genro sancionou em novembro de 2014 a criação da Film Commission do Rio Grande do Sul, órgão sob a coordenação da Agência Gaúcha de Desenvolvimento e Promoção do Investimento (AGDI), braço da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia.
- Como não havia verba para sua operacionalização, e também não há neste novo governo, é um projeto que, por enquanto, existe no papel - afirma Leo Sassen, presidente do Sindicato da Indústria Audiovisual do Rio Grande do Sul (Siav), uma das entidades articuladores do projeto, junto, entre outras, à Fundacine e à APTC.
Sassen ressalta que o Estado é locação também de comerciais, que representam, segundo ele, um mercado maior do que o cinematográfico:
- Produtoras do centro do país encontram aqui técnicos e atores qualificados por valores mais atraentes. Uma film commission regional é importante para que se contemplem diferentes oportunidades. Se uma produtora quiser realizar uma cena em uma cachoeira, a film commission poder apresentar um banco de dados com as opções que temos, assim como uma lista de produtoras qualificadas para um determinado serviço. A ideia é que o diretor da produção possa vir com equipe reduzida e contar com profissionais e equipamentos daqui.
De acordo com a recém-criada Rede Brasileira de Film Commissions (Rebrafic), existem no país um total de 25 entidades, entre já constituídas e em formação, em 14 Estados e no Distrito Federal. Uma comitiva da rede marcou presença no Festival de Cannes, encerado no domingo passado, apresentando a realizadores opções de parcerias em diferentes regiões
Responsável pela produção de Mulher do Pai, Aleteia Selonk, da Okna Produções, coordena uma equipe que, até meados de julho, terá como cenário principal a Vila de São Sebastião, em Dom Pedrito:
- Para uma film commission existir, é preciso compreender a complexidade de uma produção audiovisual, que envolve a parceria de várias partes, de agentes públicos e privados. Isso agiliza os contatos locais, a pesquisa histórica, ajuda a atrair projetos, não diz respeito apenas às áreas do turismo ou da cultura.
No caso de Mulher do Pai, Aleteia costurou uma ação conjunta com os municípios vizinhos de Lavras do Sul e Bagé - também serão registradas cenas em Aceguá.
- O apoio logístico envolve, por exemplo, a melhoria de uma estrada de terra prejudicada pela chuva, uma ação que beneficia toda a comunidade - diz Aleteia. - Os moradores se mobilizam, incrementa a circulação de renda na região.
Sobre o envolvimento da comunidade nas produções, Ivane ressalta que a ação de uma film commission costuma envolver contrapartidas:
- Podem ser detalhadas em contrato questões como uso de atores locais, doação de figurinos e cenários e realização de cursos. Foi muito gratificante ver na seleção de elenco de O Filme da Minha Vida pessoas já com dois, três filmes no currículo. Tem jovens que, de tão motivados por essas produções, vão fazer cursos de atuação e direção. A gravação de comerciais é importante, mas presença da região em um filme tem outra dimensão, fica perene.