Claro que vocês não sabem disso, mas eu adoro poesia. A boa poesia e a grande poesia, o que significa que eu adoro mais ou menos 0,00000001% da poesia que já foi escrita neste mundo vasto mundo. E um dos meus poemas favoritos começa assim "Something there is that doesn't love a wall". Olhem que beleza. Something there is. Algo há, algo há, que não gosta de muros.
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Algo há que não quer que Saul se dê bem nesta ou em qualquer outra vida, é o que vemos ao assistir o soneto que é Better Call Saul. A conspiração contra Saul, que, aliás, se chama Jimmy, é cósmica, e nos comovemos com a luta de Jimmy em sua fase pré-Saul contra o universo que o desencanta com uma frequência tão constante quanto maldosa. Jimmy é o não eleito, o não pródigo, o sujeito condenado a ser uma versão inferior de si mesmo, uma sombra do homem que ele tenta desesperadamente ser, antes de desistir e virar Saul.
Breaking Bad é herdeiro de Os Sopranos e The Wire, grandes textos, grandes personagens, grandes destinos se impondo a pequenos homens. Better Call Saul herda a maluquice de Twin Peaks, mas sem a sua loucura. Um dos personagens sofre de "alergia a eletricidade", o que quer que isso seja. O escritório de Saul, por hora Jimmy, fica em um salão de cabeleireiros. Mike, o grande solucionador de problemas insolúveis em Breaking Bad, em Better Call Saul, trabalha em um posto de cobrança de estacionamento. A ordem, até aqui, é a da desordem, e se coisas rimam é porque a vida exige isso: do caos, de qualquer caos, sai um universo, e é a este universo improvável e encantador que temos acesso, como espectadores e cúmplices de Jimmy.
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Sabemos o que ele vai virar, e isso dói, ao mesmo tempo em que fascina. Os melhores personagens são aqueles com os quais nos importamos, e Jimmy já é o personagem mais irresistível desde que inventaram o personagem irresistível.
A nova televisão tem dono, e é a Netflix, que nem TV é. Ironias, ironias e a vida, tal qual a grande poesia, está cheia delas.
Do lado de cá, nos resta aproveitar e ao máximo, enquanto der.
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