Em 1982, quando a minissérie Quem Ama Não Mata foi ao ar, o assassinato da socialite Ângela Diniz pelo namorado, o playboy Doca Street, ainda estava fresco na memória dos espectadores. Crimes passionais eram já comuns naquela época, mas a morte de Ângela Diniz apanhou o país no momento em que já começava a soar anacrônico que um assassino conseguisse escapar da prisão alegando "legítima defesa da honra". Doca Street disse que havia matado a namorada "por amor", o que ofereceu a deixa para os cartazes de protesto e pichações que começaram a tomar conta do país logo depois do crime: "Quem ama não mata".
A minissérie de Euclydes Marinho, porém, era menos um manifesto contra a violência doméstica do que uma espécie de radiografia das relações amorosas da época. O Brasil que já sonhava com a redemocratização, e logo iria às ruas pedir Diretas Já, assistia então ao nascimento de uma nova família, formada por mulheres que trabalhavam fora e homens que já não eram senhores da casa. Na trama, Alice (Marília Pêra) é a mulher submissa que obedecia ao pai, não por acaso um general gaúcho, e depois ao marido. Já sua irmã, Laura (Susana Vieira), era a mulher separada, independente, que choca a família por suas escolhas, enquanto sua filha, Júlia (Denise Dumont), simbolizava as jovens que já viviam uma relação de igual para igual com os namorados.
Narrando as histórias dos casais da família Drummond - os pais, Norma (Selma Egrei) e Dionísio (Perfeito Fortuna), e os filhos e suas mulheres, Cláudio (Enrique Diaz) e Marília (Maria Fernanda Cândido), Hugo (João Miguel) e Tânia (Adriana Esteves) e Joel (João Baldasserini) e Suzana (Carol Abras) - o primeiro capítulo de Felizes para Sempre?, exibido na segunda-feira, mostrou que a minissérie também promete inventariar relações amorosas contemporâneas. Questões como laços conjugais frágeis (o título da nova minissérie, aliás, parece remeter tanto aos casamentos efêmeros quanto à falência do próprio sonho de amor eterno), traição, tédio no casamento e relações virtuais ganham destaque. Euclydes Marinho e o cineasta Fernando Meirelles, porém, parecem pretender ir ainda mais fundo na radiografia dos costumes da nossa época, com liberdade para tocar em um tema que ainda era tabu na televisão aberta em 1982: a política e as relações perigosas entre sexo e poder. Com Brasília como cenário e empreiteiros corruptos em primeiro plano, a nova minissérie mencionou no primeiro capítulo tanto as passeatas de 1968 quanto as manifestações de 2013.
Não faltaram detalhes "da hora" como o suco verde no café da manhã dos ricos, o vício em gadgets e o recurso, já bastante usado no cinema, de colocar na tela da TV os diálogos do smartphone. Como na primeira minissérie, quem morreu e quem matou só vamos saber no último capítulo - mas, até lá, a jornada promete ser divertida.