Comparar o cérebro humano a um computador é uma simplificação grosseira. Alguns processos mentais até podem ser equivalentes aos mecanismos digitais de uma máquina, e algumas metáforas podem ser educativas, mas nenhum cérebro, e muito menos uma mente, funciona como um computador. Uma mente está ligada a um organismo biológico complexo, a um corpo, e esta ligação ainda tem muitos elos que a ciência precisa desvendar.
Alguns anos atrás, depois de um debate sobre o filme The Wall, em que eu condenei - sem qualquer argumento realmente científico, mas com uma sincera certeza humanística - o uso de eletrochoques no tratamento de perturbações mentais, um grupo de médicos veio falar comigo e disse que meu discurso estava reforçando o lobby dos grandes laboratórios, pois, em alguns casos, o eletrochoque é mais eficiente, tem menos efeitos colaterais e é muito mais barato que certas pílulas amplamente adotadas.
Lembro até hoje da metáfora de um dos médicos: "É como dar um Ctrl-Alt-Del no cérebro do sujeito. Quando ele 'liga' de novo, está melhor organizado". Não tenho a qualificação necessária para debater a validade da comparação e continuo achando o eletrochoque uma violência a ser evitada, mas confesso que a metáfora me fez pensar no tamanho dos mistérios que ainda temos a enfrentar nos dois mundos: o biológico e o digital.
Na semana passada, meu computador teve seríssimas perturbações mentais. Ele não estava mais interagindo normalmente com a sociedade. Recusava-se a responder aos comandos mais simples e, mesmo com uma dose maciça de Ctrl-Alt-Dels, permanecia calado, de olhos fechados, num tal estado de depressão que temi o pior: total perda de funcionalidade e de dados. Morte. Então, numa última e desesperada tentativa de medicação caseira, apelei a uma terapia chamada "Recuperação de sistema", que permite escolher uma data (no passado) e mandar o computador voltar para lá. É como o velho seriado Túnel do Tempo, mas com menos efeitos especiais constrangedores.
Escolhi, sem muita convicção, um dia qualquer de outubro do ano passado e apertei as teclas necessárias. Ele ficou mudo, aquela luzinha do HD ficou piscando esquizofrenicamente por uma eternidade e, quando a tela reapareceu, bazinga!, meu computador estava de volta, como um sujeito saudável e confiável. E assim se mantém até hoje. Moral da história: no tratamento de cérebros perturbados, voltar ao passado e recuperar as configurações do sistema quando ele funcionava direito é muito melhor que ficar ligando e desligando o processador com choques aleatórios. Tá tudo resolvido. Aposentem psiquiatras e laboratórios médicos. Basta ter um túnel do tempo.