Em vez de ganhar um adesivo de estrela no boletim depois de uma sequência de notas dez, Vivian Aguiar-Buff recebeu um convite de emprego em Hollywood. A paulistana de 32 anos foi concluir os estudos de música na Berklee College of Music, em Boston, e acabou se tornando produtora de trilhas sonoras de superproduções, como G. I. Joe: Retaliação, estrelada por Bruce Willis, e é uma das responsáveis pelo que os espectadores ouvirão em Turbo, animação da Dreamworks - prevista para estrear no Brasil no dia 19 de julho -, na qual ela terá seu nome nos créditos pela primeira vez na telona.
- Eu era bem nerd. Passava os fins de semana em casa estudando. Estava com 28 anos, gastando uma grana e quis fazer render - relembra.
Hoje, ela dá expediente no Remote Control Productions, estúdio fundado pelo alemão Hans Zimmer, vencedor do Oscar pela música de O Rei Leão (1994) e de cerca de outros 70 prêmios. Lá, Vivian é o braço direito de Henry Jackmann, compositor da trilha de produções como O Gato de Botas (2011) e Capitão América 2: O Retorno do Primeiro Vingador, em fase de pós-produção.
Por ter muitas divisões, o esquema de trabalho musical hollywoodiano faz Vivian misturar a criatividade com funções estritamente técnicas.
- Meu trabalho é muito próximo com o de editor de música. Sou responsável pela parte de logística da produção da trilha, desde falar com o contratante dos músicos da orquestra até tratar com diretores e produtores. Sou a ligação entre estúdios e o Henry Jackman. E faço assistência técnica dos computadores dele - descreve.
Mesmo com obrigações na coordenação técnica, ela garante conseguir criar também. - Como tenho base de música eletrônica, faço o design de som. Consigo fazer coisas criativas. Nas gravações, fico lendo as partituras do compositor. Ele fica mudando a orquestração na hora, se não gosta de algo. Ele vai dando notas e vou marcando.
Antes de se dedicar à música, quando entrou para o conservatório Souza Lima, Vivian estudou cinema em São Paulo, mas não tinha tanto empenho quanto nos últimos tempos.
- Levei na flauta - confessa. Na época, sem tantas preocupações com a vida acadêmica, começou a trabalhar com filmes por aqui. - Acabei aprendendo em campo, pois comecei com 19 anos - analisa.
Em seguida, encaminhou-se para a produção de música eletrônica. - Eu era minha própria banda, viajava com o computador - contou por telefone de Los Angeles, para onde se mudou em 2012.
Ser de outro país não fez a paulistana se sentir um peixe fora d'água no ambiente de trabalho. - Os norte-americanos têm uma ideia bacana dos brasileiros, admiram nossa música. Nunca me senti estrangeira aqui, pois 70% são estrangeiros. O Jackman é inglês, tem russo, coreano e outro brasileiro. Sempre fui bem recebida. Nunca senti falta de respeito nem trabalhei em dobro por ser de fora - defende ela, que, nos tempos de estudante, fundou uma associação para difundir a música do Brasil nos EUA.
A carga de trabalho é puxada. - Os prazos são curtos e tem o render (processo de salvar um arquivo de vídeo, que pode levar horas). Fico dias, durmo aqui, às vezes. Todos os sofás são 'dormíveis', têm travesseiro e cobertor. Também temos banheiro com chuveiro. Meu marido é que não fica muito feliz - entrega ela, que levou o companheiro, também brasileiro, na mudança para a costa oeste.
Mesmo lidando com nomes conhecidos, ela revela se deslumbrar de vez em quando. Um dos serviços recentes foi a trilha de É o Fim, longa codirigido pelo ator Seth Rogen, protagonista de O Besouro Verde (2011) e integrante do elenco da série Arrested Development, exibida pelo Netflix.
- Em uma das nossas reuniões, ele esqueceu os óculos escuros e eu fiquei de devolver. Aí, eu falei para as pessoas que trabalham comigo: 'Deixe eu colocar os óculos dele antes'. A gente fica tietando.
Até no meio do expediente Vivian tem momentos em que custa a acreditar que está inserida na indústria do cinema hollywoodiano. - Eu me surpreendo todos os dias. Fico andando pelos corredores, olhando a sala do Hans. Nunca imaginei estar aqui - conta.
Ela garante que os chefes ilustres tratam todos da mesma maneira. - É todo mundo amigo, todos almoçam juntos. Cada compositor é a própria companhia, pois o Hans alugas as salas. ê uma comunidade criativa. Se ele tem um projeto e não consegue fazer, passa para outro.
Por causa da distância, a paulistana acompanha as notícias do cinema nacional pela internet e pede DVDs a quem vai visitá-la. Apesar da dedicação à função, ela não cogita a possibilidade de voltar para casa um dia. - Seria um sonho. O cinema no Brasil está se desenvolvendo, a qualidade dos longas está melhor. Tenho muita vontade de voltar, mas tenho de me estabelecer aqui. Quero continuar a fazer filmes em Hollywood.