Já são quase 180 anos de história. O Theatro Sete de Abril foi inaugurado na época do charque, quando as damas da sociedade pelotense eram facilmente reconhecidas pelo linguajar francês. Fez-se conhecer por Dom Pedro II - a figura ilustre que inspirou seu nome - e assistiu à vila de São Francisco de Paula se transformar na cidade de Pelotas.
Fechado há dois anos à espera de uma restauração, o Sete de Abril tem as portas reabertas no livro O Teatro do Imperador (Libretos, 192 páginas, preço médio de R$ 50), que será lançado no mês que vem pelo jornalista Klécio Santos.
Veja o antes e depois do Sete de Abril:
Em um ano de pesquisas, Klécio garimpou as melhores histórias, vividas no palco, na plateia e até fora do teatro. O livro é um compilado de momentos marcantes, contados na forma de uma grande reportagem. São 23 capítulos, que reúnem curiosidades, fotografias, recortes de jornais antigos, novidades, como textos inéditos do escritor Simões Lopes Neto e histórias de Lobo da Costa, e ainda episódios pouco explorados, como a apresentação de Abomah, uma norte-americana de 2m35cm.
- O que um jornalista sabe fazer é contar boas histórias, e o teatro tem excelentes histórias, tanto que daria para fazer uma enciclopédia com o Sete de Abril - diz o autor.
Na Capital, o Theatro São Pedro foi inaugurado somente 25 anos depois da casa de espetáculos pelotense - assim, até 1858, o Sete de Abril era a referência para as grandes companhias europeias e escala para artistas internacionais em viagem a Montevidéu e Buenos Aires. Por lá passaram as principais companhias líricas, divas da dramaturgia, como Ismênia dos Santos, Lucinda Simões e a italiana Clara Della Guardia, e nomes célebres como o galã português Furtado Coelho.
Com edição da Libretos, O Teatro do Imperador terá lançamento em Pelotas, no dia 6 de novembro, às 19h, no Instituto João Simões Lopes Neto, e no dia 7, às 18h, na Feira do Livro da cidade. Em Porto Alegre, será lançado na Feira do Livro, no dia 10, às 19h.
Visitas imperiais
Antes da inauguração da sede definitiva, o Sete de Abril funcionou em um armazém onde hoje fica o centro de Pelotas. Foi em 1831, mesmo ano em que Dom Pedro II, ainda criança, subia ao trono brasileiro - por isso a escolha do nome: em 7 de abril, Dom Pedro I entregou a coroa ao filho. A inauguração do novo prédio foi realizada antes mesmo da conclusão das obras. O teatro abriu as suas portas em 2 de dezembro de 1833 (aniversário do imperador), com a apresentação de um elogio dramático, gênero destinado às solenidades da monarquia. O imperador esteve no teatro duas vezes. Na primeira, em fevereiro de 1846, além de assistir aos espetáculos, Dom Pedro II jantou no salão do teatro. Na segunda, em 1865, o imperador não dispensou a visita apesar da forte chuca em Pelotas.
A maior de todas as divas
Com mais de dois metros de altura e andar desengonçado, a americana Abomah surpreendeu Pelotas no inverno de 1909. Como conta O Teatro do Imperador, ela subiu ao palco do Sete de Abril para desfilar seu gigantismo por três noites e colecionou vaias e aplausos na mesma intensidade. Abomah se hospedou em um hotel ao lado do teatro, não pela proximidade, mas por um singelo detalhe semântico: o proprietário era da família "Del Grande". O dono chegou a cobrar oito diárias da gigante diante da voracidade com que ela comia (só no café da manhã, eram dois a três litros de leite).
Na cidade, estabeleceu-se uma polêmica sobre a verdadeira altura de Abomah. A propaganda de que ela media 2m35cm de altura, descalça, não convenceu. Com a confusão, o major subtenente, autoridade policial da época, mediu a gigante no palco e verificou que ela tinha, na verdade, 2m02cm, incluindo a espessa cabeleira e os sapatos de salto alto. Os anúncios de seu freakshow mambembe tiverem que ser retificados.
Cinema no teatro
A partir de 1920, o Sete de Abril passou a incluir o cinema na sua programação. Por muitos anos, o teatro permaneceu como sala exibidora de mascates do cinema. Antes, eram as lanternas mágicas que atraíam o público. Um exemplo é a trajetória de Faure Nicolay, famoso ilusionista da época: ele esteve em Pelotas em 1888, quando fez projeções ópticas de paisagens da Europa. A foto acima retrata a época em que o teatro era alugado por companhias de cinema: em cartaz, O Mágico de Oz (1939).
Alojamento na guerra
Com a Guerra dos Farrapos, em 1835, as apresentações no Sete de Abril foram suspensas. O recém-inaugurado teatro, símbolo de prosperidade, se transformou em alojamento de soldados. A máscara foi substituída pela farda. O rico guarda-roupa foi saqueado, e os cenários destruídos. A guerra chega ao fim com um acordo de paz em 1º de março de 1845 e já no dia 25 o palco do Sete de Abril volta a abrigar apresentações teatrais, sendo reinaugurado com um drama do poeta e comediógrafo português Antônio Xavier Ferreira de Azevedo.
Botequim do Sete
Ao completar três décadas, o Sete de Abril inaugurou, em 1861, um botequim no seu interior. E as artes cênicas passam a disputar a predileção da sociedade com os pudins, chocolates e biscoitos servidos no local. Em dias de espetáculo, os chás e cafés fumegantes eram uma atração à parte. O local era administrado por Joaquim Leite de Farias Pinto, conhecido como Marquês de Loulé - uma figura folclórica que permaneceu por 35 anos no teatro.
De portas fechadas
> O Theatro Sete de Abril está com as portas fechadas desde o dia 15 de março de 2010, quando foi determinada a interdição pelo Ministério Público Federal. Um laudo técnico de segurança apontava o comprometimento do telhado e da estrutura de alvenaria. A prefeitura de Pelotas finalizou o projeto de restauração em setembro do ano passado e encaminhou a documentação ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
> No início do mês, o governo federal liberou R$ 1,5 milhão para o início das obras de restauro. De acordo com a secretaria municipal de Cultura, o valor cobre apenas uma etapa do projeto, que é a cobertura do prédio. A fase é de licitação da empresa que executará a obra. Depois de contratado, o serviço deve demorar 180 dias.
> Para a segunda etapa, que é o restauro no prédio e na caixa cênica, estão previstos mais R$ 5,3 milhões. Ainda não há data definida para o cumprimento do projeto, nem para a reabertura do Sete de Abril.