1924
Nascido Milton Fernandes, no Meyer, em 16 de agosto. Ou em 27 de maio? Ou em 27 de maio do ano anterior? Há desencontros de opinião na família. Na carteira de identidade: 27-05-1924. Meu amigo, Frederico Chateaubriand, sempre repetia, quando se falava que alguém estava "muito moço", isto é, aparentava menos que a idade que tinha: "Idade é a da carteira".
1941
Descubro, aos 17 anos, que não me chamo Milton, mas Millôr. Acho bom, não mudo, e o nome logo 'pega'.
1945
Getúlio Vargas, o chefe danação, é maior que Vargas Villa. É um Vargas Vilão
1945
No começo de 1945 começam os anos gloriosos da revista O Cruzeiro, que um grupo de meninos levaria dos estagnados 11.000 exemplares tradicionais a 750.000, numa época em que a população do país era de 40 milhões (de pessoas bem melhor alimentadas do que hoje)
1960
Minha peça Um Elefante no Caos estreia depois de uma briga enorme com a censura, transformada num excelente espetáculo pela genial direção de João Bittencourt. Uma das poucas vezes que um diretor melhorou um trabalho meu.
1960
Brasília é o desnecessário tornado irreversível
1962
Fidel Castro é uma espécie de São Jorge que foi salvar a donzela e acabou se casando com o dragão
1964
Em 1964, deposto, João Goulart voou para Brasília. Foi a primeira vez na história em que um presidente deposto fugiu pra capital.
1965
Liberdade, Liberdade - Fizemos, em suma, uma liberdade como podia concebê-la a modéstia e as limitações de nossas mentalidades - minha e de Flávio Rangel - sottoviluppatas. Mas também vocês não iam querer um liberdadão enorme feito aquele que está na entrada de Nova York.
1966
Cada vez me meto mais, profissionalmente, no teatro. Traduções, adaptações, originais. Representamos, no Largo do Boticário, a versão musical de "Memórias de um Sargento de Milícias", só com atores negros.
Ditadura Militar
Da pretensão intelectual de Castello Branco passamos à grossura paternal de Costa e Silva, que foi substituída pela algidez paternal de Costa e Silva, que deixou o lugar para a altanaria romano-prussiana de Geisel, que o entregou a seu delfim (não neto) o ego-sum-qui-sum João Figueiredo, todos bem diferentes mas com uma identidade em comum - o absoluto desprezo pelo civilis vulgaris.
1974
Aos cinquenta você já é um eco de muitas cicatrizes.
1977
É... - Esta peça é um discurso sobre a falência das ideologias. Mais obviamente, um trabalho sobre a inutilidade das teorias. Todas as palavras, ações e referências, inclusive a mitos (deuses gregos), emprestam-lhe o angustiante clima, sempre presente em tudo que tenho feito - inclusive nas artes plásticas - a partir de certo momento de minha vida - do sentido metafísico da existência, da ocasionalidade da vida e, consequentemente, da história. Não há leis.
1980
Entramos definitivamente na Idade Mídia.
1983
Sejamos justos: pra que a volta aos quartéis seja realmente eficiente, é preciso que os militares levem com eles uma boa penca de civis.
1984
O general Figueiredo quer ser esquecido. Mas o povo jamais o esquecerá, general. O senhor será sempre lembrado como o homem que, no momento inoportuno, em tom inadequado, em local impróprio, com roupas inconvenientes, disse coisas inqualificáveis.
1985
Políticos são personalidades decompostas, que escapam à minha compreensão e consequente admiração. Tancredo, por exemplo: como pode um homem ter vivido 75 anos só dizendo o que é conveniente?
1986
Sarney me fascina. Nunca vi tanto talento pra ignorância.
1987
O futuro chega com tal rapidez que começo a desconfiar que agora já está atrás de mim.
1990
Mas craque verdadeiro em correção política era o cara que xingou o Collor na rampa, lembram? Disse que o presidente era indivíduo do sexo masculino com preferência sexual conflitante; e descendente direto de pessoa acostumada a cobrar por suas transas sexuais.
1990
O eterno desdém das novas gerações: 1930 - "Ele ainda usa polainas!"; 1940 - "Ele ainda usa chapéu!"; 1950 - Ele ainda usa suspensórios!"; 1960 - "Ele ainda usa gravata!"; 1970 - "Ele ainda usa paletó!"; 1980 - "Ele ainda usa ponteiros!"; 1990 - "Ele ainda usa mulher!"
1994
Determinismo histórico está bem - mas, e o impulso? E as circunstâncias? E o pênalti que o Baggio perdeu?
2000
Internet. Aberta pro mundo, alheia ao que a faz.
* Fonte: Millôr Definitivo - A Bíblia do Caos (L&PM, 2011)