Na cobertura em que Millôr trabalhava, numa rua resplandecente da luz de Ipanema, estava exposta uma ilustração de Jaguar na qual o cartunista havia rabiscado certa frase:
"Millôr, que tudo sabe, querendo saber mais".
Foi precisamente essa a impressão que tive daquele senhor de corpo mirrado e cintilantes olhos azuis que me recebeu numa manhã de sábado verde-azul do Rio de Janeiro, em 2007, a fim de entrevistá-lo para Zero Hora: Millôr parecia saber de tudo.
Falou de damas deslumbrantes agora decaídas, de ex-presidentes, artistas, atores e escritores renomados, mas que ele conheceu quando não tinham nome algum. Falou de poesia e filosofia, falou de política e futebol, falou de tudo sem presunção, mas com a segurança de quem tudo sabe. Mas, para minha surpresa, ele, que tanto sabia, também perguntou. Queria saber do Rio Grande do Sul, que havia tempo não visitava. E depois, não para a minha surpresa, mas para meu autêntico espanto, quis saber sobre o livro que eu levava sob o braço. Mostrei-lhe. Era um volume antigo de uma coleção que tenho com textos acerca do Rio de Janeiro. Millôr pediu o livro, folheou-o e viu que eu sublinhara algumas frases.
- Por que você sublinhou isso? - indagou.
Expliquei.
- E isso? - insistiu, virando a página.
Contei por que aquele trecho me chamara a atenção.
- E essa parte? E essa?
Assim foi até o fim do livro. Saí do seu apartamento não entendendo o que tanto o interessara. Mais tarde, ao lembrar da frase de Jaguar, entendi: Millôr queria, simplesmente, saber. Era quem mais sabia, mas, como todo sábio, sempre queria saber mais.