Tinha tudo para dar errado, mas Valérie Donzelli e Jérémie Elkaïm acertaram em cheio. O filho do casal de atores franceses teve diagnosticado um tumor cerebral. E eles resolveram contar a experiência real num filme fictício escrito por ele e dirigido por ela
Apesar da morbidez do tema, fizeram um belíssimo drama de celebração da vida, que transpira leveza e está recheado de sutilezas e autoironias. A Guerra Está Declarada causou comoção ao ser exibido na abertura da Semana da Crítica do Festival de Cannes, em maio do ano passado. Ficou de fora do Oscar, mas foi o eleito pelos franceses para representá-lo no prêmio da indústria de Hollywood, além de conquistar seis indicações ao César, o prêmio da Academia Francesa. Pena que estreia em Porto Alegre apenas nesta sexta-feira, um tanto escondido em meio à enxurrada de
candidatos às estatuetas a serem entregues no próximo dia 26.
No filme, Valérie virou Julliette, e Jérémie, Roméo. Seu filho Adam é interpretado pelo ator-mirim Gabriel Elkaïm (há ainda César Desseix, que vive o personagem na
idade adolescente), e alguns personagens e cenários (enfermeiras, hospitais) são os mesmos que o casal visitou na vida real. Acompanhamos o caso desde o princípio
de seu relacionamento, mas algumas imagens que vemos têm nada de documentais ou naturalistas, ao contrário: são simbólicas de suas projeções, o que incluiu os anseios e, sobretudo, as suas frustrações.
É nesse jogo entre o real e o que é fruto de uma imaginação afetada pelo drama que A Guerra Está Declarada encontra sua riqueza. A alusão ao casal shakespereano que simboliza a tragédia no imaginário ocidental, o choque de realidade num hospital de Marselha. Uma sequência com ar de videoclipe, outra com um plano longo que permite ao espectador observar detalhadamente a expressão dos dois protagonistas. E tudo sem resvalar para o sentimentalismo e com um distanciamento suficiente para que não se perca de vista o humor.
Parece impossível. Valérie Donzelli e Jérémie Elkaïm mostraram que não é.
