Foi com a inconfundível tranquilidade da sua voz, que soa aos ouvidos quase como um abraço, que Paulinho da Viola atendeu à ligação de GZH. Fazendo "como um velho marinheiro que durante o nevoeiro leva o barco devagar" — verso que ele canta em Argumento —, conversou sem pressa com a reportagem sobre os seus 80 anos, completados em novembro do ano passado, e o show que faz em Porto Alegre às 21h deste sábado (15), no Auditório Araújo Vianna, em alusão à efeméride de vida.
A apresentação ocorre pouco mais de um ano após a última vinda de Paulinho da Viola à Capital, em fevereiro de 2022. O marco dos 80 anos ainda não havia sido alcançado naquele mês, mas o músico já se via cercado por convites para todo tipo de homenagem. Era algo que lhe causava um certo estranhamento, conforme chegou a contar em entrevista concedida a GZH na época.
Humilde, Paulinho da Viola continua sem entender muito bem o porquê de tanto alarde. Para ele, foi somente mais um aniversário seu. Para todos, foi o aniversário de 80 anos do grande Paulinho da Viola, um dos maiores baluartes da música popular brasileira.
— Foi legal, mas uma badalação (risos). Recebi várias homenagens, dei muitas entrevistas, muita coisa foi publicada sobre isso. O que eu vou dizer? Fico agradecido, né (risos) — conta ele.
Apesar da falta de palavras, é para celebrar os 80 anos junto aos seus fãs que Paulinho da Viola vem rodando o país com a turnê comemorativa da qual faz parte o show deste sábado. Um show que tem mais cara de festa de aniversário com os amigos que de homenagem — a autorreferência não é a praia de Paulinho da Viola. O público não assistirá a um espetáculo disposto a sintetizar a trajetória musical do artista, mas terá a oportunidade de passar cerca de 1h30min ouvindo Paulinho da Viola cantar e tocar o que ele mais gosta no seu repertório. Será uma festa imperdível.
— Dei preferência para músicas que fazem parte da minha vida e que eu gosto de cantar, gosto de mostrar para as pessoas. Há algumas músicas que não cantei no último show em Porto Alegre e algumas que cantei, mas é uma estrutura de show diferente. Algo simples, mas muito especial — explica Paulinho da Viola.
Entram na lista alguns dos maiores sucessos dele. Músicas como Pecado Capital, Bebadosamba, Argumento, Foi um Rio que Passou em Minha Vida, Timoneiro, Dança da Solidão e Sei lá, Mangueira, entre outros hits. Tampouco ficarão de fora regravações que se tornaram célebres na voz dele, tais como Acontece, de Cartola, e Nervos de Aço, do gaúcho Lupicínio Rodrigues.
Esta, ele conta, é praticamente obrigatória.
— Não posso deixar de cantar Lupicínio. Nervos de Aço é uma canção que, em alguns lugares a que vou, se eu não cantar, as pessoas me batem (risos) — brinca o artista, confirmando que Porto Alegre é um desses locais.
Além das muitas canções indispensáveis, uma música nova, ainda não gravada, faz parte do repertório do espetáculo. Trata-se da canção Ele, que Paulinho da Viola cantou pela primeira vez no show de abertura da turnê, em março, em São Paulo, bem ao seu modo: acompanhado somente do batuque de uma caixinha de fósforo.
É provável que a canção venha a integrar o álbum de inéditas que o público tanto cobra — o último lançado por ele foi Bebadosamba, de 1996. O artista garante que vai atender ao pedido dos fãs, pois tem material para um novo disco. Só não tem pressa.
— É uma cobrança justa — concorda. — Com essa pandemia, eu voltei a tocar violão, pois estava tocando mais cavaquinho, e comecei a fazer algumas músicas para violão. É algo que não fazia havia muito tempo. Eu acho que em algum momento vou sentir a necessidade de registrar esses trabalhos e ver o que acontece, mas não é uma coisa que está me incomodando muito. Eu sei que vou fazer em determinado momento — explica Paulinho da Viola.
O músico confessa que se sente um tanto desmotivado por conta das mudanças no mercado de produção musical. Essa coisa de lançar músicas somente em plataformas de streaming não faz o olho de Paulinho da Viola brilhar, mas ele está disposto a evocar essa luminosidade.
— Sou daqueles caras que ainda ouvem CD e vinil. Eu brinco com meus amigos – veja bem, é uma brincadeira – que sou um cara do século 19. Mas não sou um saudosista, não tenho aquilo de "no meu tempo era melhor". Acho que só fiquei um pouco assustado com o modo como as coisas mudaram rápido — reflete ele.
Aos 80 anos, Paulinho da Viola viu muitas coisas mudarem, tanto na música quanto nele mesmo. E tudo bem mudar, ele acredita. Mesmo com a chancela de suas oito décadas vividas, o músico não crava verdades absolutas, não se mostra irredutível. Com a compreensão de que tem muito a ensinar, mas também de que sempre se pode aprender, Paulinho da Viola segue se deixando navegar conforme o mar. Bem como ele canta em Timoneiro: "Não sou eu quem me navega / Quem me navega é o mar / (...) O leme da minha vida / Deus é quem faz governar".
Há coisas, porém, que ele sabe que nunca irão mudar:
— O meu sentimento pela música, a minha raiz musical, é algo que não muda.
Paulinho da Viola - Turnê "80 anos"
- Neste sábado (15), às 21h, no Auditório Araújo Vianna (Av. Osvaldo Aranha, 685), em Porto Alegre.
- Ingressos inteiros a partir de R$ 220, disponíveis na plataforma Sympla.
- Desconto mediante a doação de um quilo de alimento não perecível no local e desconto de 50% para sócios do Clube do Assinante e acompanhante sobre o preço do ingresso inteiro.