Foi um ano muito rico para a música pop mundial. Em 1971, John Lennon imaginava todas as pessoas vivendo em paz em tempos de guerra, Joni Mitchell cantava sobre seu coração partido e músicos iniciantes do mundo inteiro dedilhavam no violão Stairway to Heaven, do Led Zeppelin. No Brasil, Roberto Carlos prospectava o que aconteceria se um outro cabeludo aparecesse na rua de sua amada e Chico Buarque desafiava a ditadura militar com sua poesia. Uma safra histórica de discos que se tornaram clássicos foi produzida em 1971. É um desafio fazer uma compilação dos 10 mais sem deixar muita coisa boa de fora. GZH apresenta aqui uma lista de grandes álbuns que completam 50 anos em 2021. Buscou-se um equilíbrio entre o pop e o rock, entre artistas internacionais e brasileiros e entre homens e mulheres. Confira.
John Lennon - Imagine
O segundo disco da carreira solo de Lennon (depois de um trabalho mais experimental com a Plastic Ono Band) traz como faixa-título a canção que se tornou uma das mais tocadas no século 20, conforme a empresa de direitos autorais Broadcast Music, Inc. Ao longo de 50 anos, a música foi reproduzida em diferentes linguagens e ambientes: em versões instrumentais de flauta de pã ou de piano para ser tocada em elevador, interpretadas por nomes que vão de Madonna a Paulo Ricardo e ainda como trilha sonora de slides ou videoclipes com mensagens edificantes.
Aliás, Imagine se consagrou como um hino da paz, cuja letra encoraja imaginar um mundo não mais dividido por religiões ou fronteiras. O disco traz também sucessoscomo como Jealous Guy e How Do You Sleep? — com participação do ex-clega de Beatles George Harrison na guitarra, Lennon alfineta Paul McCartney em versos como "A única coisa que você fez foi Yesterday" (The only thing you done was Yesterday).
Produzido por Lennon, Phil Spector e Yoko Ono (que também foi a fotógrafa da capa), além de contar com uma sonoridade mais comercial, Imagine atingiu o primeiro lugar nas paradas dos Estados Unidos e da Inglaterra e foi o trabalho solo de maior sucesso do eterno beatle.
Roberto Carlos - Roberto Carlos
Sem título, o disco emblemático que Roberto Carlos lançou em 1971 marcou sua transição para um romantismo adulto. As festas de arromba e os carrões da a Jovem Guarda ficavam para trás. Ainda haveria rescaldos de sua fase soul (Todos Estão Surdos, Como Dois e Dois e Eu Só Tenho um Caminho), mas é aqui que começaria seu reinado como maior cantor romântico do país.
Naquele momento, o Brasil vivia um turbilhão por conta da ditadura militar. Alguns apontaram que o Roberto Carlos seguiria um caminho seguro e romântico. Mas é neste disco que ele canta sobre seu amigo exilado, Caetano Veloso, em Debaixo dos Caracóis dos Seus Cabelos. Aliás, Como Dois e Dois foi composta pelo músico baiano. Todos Estão Surdos é o hino pacifista de Rei, cantando por um mundo sem guerras.
É um disco que abre com Detalhes, uma das canções mais marcantes da história da música popular brasileira, desde então, presença obrigatória em qualquer show do Rei. Composta em parceria com Erasmo Carlos, a música é cantada por um sujeito muito confiante, que afirma que irá permanecer na memória de sua ex-companheira para sempre ("Detalhes tão pequenos de nós dois/ São coisas muito grandes pra esquecer/ E a toda hora vão estar presentes/ Você vai ver").
Joni Mitchell - Blue
O quarto disco da cantora folk canadense surgiu do fim do seu relacionamento com o músico Graham Nash, referenciado em faixas como My Old Man e River. O pivô do álbum é James Taylor, que inspirou as faixas Blue e All I Want. Já a avassaladora A Case of You especula-se que possa ser sobre Leonard Cohen.
Seja com lindas harmonias e melodias no violão, isso quando não há influência do jazz no piano, o legado de Blue é tremendo e ressoa até hoje. Com estilo confessional em suas composições, Joni pavimentou o caminho para cantautoras de décadas posteriores, de Patti Smith a Taylor Swift.
O jornal The New York Times apontou que Blue é um dos 25 álbuns que representaram "um ponto de virada para a música do século 20". Para a revista Rolling Stone, é o segundo melhor disco feminino de todos os tempos, atrás apenas de I Never Loved a Man The Way I Love You (1967), de Aretha Franklin.
Marvin Gaye - What's Going On
Temos aqui o maior disco de todos os tempos, segundo a revista Rolling Stone. Trazendo funk, gospel, jazz e fortes elementos percussivos, o álbum é considerado o primeiro trabalho conceitual da soul musica.
What’s Happening Brother assume o ponto de vista de um veterano do Vietnã (assim como o irmão do cantor) perplexo com as mudanças na América e em busca de trabalho. Mercy Mercy Me (The Ecology) traz uma ode ao meio ambiente. Flyin' High (In the Friendly Sky) aborda o vício em drogas. Já a faixa-título é um relato sobre a brutalidade policial.
Depois de What's Going On, os músicos negros da Motown (gravadora de Marvin na época) e de outros lugares sentiram uma nova possibilidade de expandir os limites musicais e políticos de sua arte.
Chico Buarque – Construção
Com suas ironias poéticas, Construção virou um símbolo de confronto à ditadura que o Brasil vivia na época do lançamento. E também um dos discos brasileiros mais importantes do século 20. Só pelos créditos, constata-se o peso do álbum: MPB-4, Tom Jobim, Trio Mocotó e Toquinho.
Na faixa-título, Chico traz uma crônica de um trabalhador da construção civil, responsável pelo desenvolvimento do país, que morre "na contramão atrapalhando o tráfego". A ideia inicial de Chico era fazer uma "experiência formal", com estrofes terminadas em proparoxítonas. A poesia, somada aos arranjos do maestro tropicalista Rogério Duprat, dão a forma a uma das canções mais celebradas do cantor.
Samba de Orly, parceria com Toquinho e Vinicius de Moraes, chegou a ter uma versão censurada. Nesta canção, Chico fala sobre o exílio: "Vai, meu irmão/ Pega esse avião/ Você tem razão/ De correr assim". Antes de Construção, o músico esteve exilado na Itália.
Em Deus lhe Pague, Chico critica a situação repressiva imposta pela ditadura. Com sua ironia, ele simula um agradecimento ao governo por permitir ao cidadão realizar atos básicos, como respirar e dormir ("Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir / A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir").
The Rolling Stones - Sticky Fingers
Primeiro álbum de estúdio da banda integralmente gravado pelo guitarrista Mick Taylor, substituto de Brian Jones, morto em 1969. O icônico disco se destaca já na capa, concebida pelo artista Andy Warhol: traz a foto da virilha de um modelo vestido com uma calça jeans e um zíper real. É a estreia também do famoso logotipo da língua.
Entre os destaques do disco estão o rock puro de Brown Sugar, Can't You Hear Me Knocking e Bitch, a balada Wild Horses, o blues de You Gotta Move, o country sarcástico de Dead Flowers. O disco está no top 5 da discografia dos Stones.
Led Zeppelin - IV
Um dos melhores discos do Led Zeppelin. Deparamos com quatro integrantes virtuosos, que proporcionam um diálogo entre heavy metal. É aqui que temos a balada épica Stairway to Heaven, mas também outras faixas que entraram no panteão do rock, como Black Dog, Misty Mountain Hop, Going to California e, óbvio, Rock and Roll.
Tim Maia - Tim Maia
O segundo disco de Tim Maia consolida o trabalho apresentando em seu álbum de estreia. A obra já começa grandiosa na mistura de soul com o baião de A Festa do Santo Reis. Aliás, ele promove uma fusão de ritmos brasileiros com ritmos americanos. É aqui que ouvimos alguns de seus maiores sucessos: a animada Não Quero Dinheiro (até hoje presente em festas e blocos de Carnaval), a incendiária Não Vou Ficar e a balada Você. Um dos maiores êxitos da carreira de Tim, o álbum também marca presença na lista de melhores discos brasileiros de todos os tempos da Rolling Stone.
Carole King - Tapestry
Carole King foi outra cantautora que pavimentou caminhos para ícones do pop feminino. Em Tapestry, é possível ouvir canções que inspirariam nomes como Adele, Amy Winehouse e Lana del Rey. É só prestar atenção em faixas como I Feel the Earth Move, It's Too Late, So Far Away e You’ve Got a Friend, que seria gravada no mesmo ano por James Taylor.
Há sentimentalismo, descontração, sinceridade e, é claro, uma qualidade indiscutível. Quando foi lançado, Tapestry ficou no topo da Billboard por 15 semanas consecutivas, sendo até o hoje o álbum de uma artista feminina que permaneceu mais tempo nesta posição. O disco ainda faturou quatro Grammys, incluindo álbum do ano.
Tapestry é atemporal e envelheceu muito bem: em 2019, o site Pitchfork revisitou o álbum em uma resenha e deu nota 10.
Janis Joplin - Pearl
Janis Joplin foi uma das melhores vocalistas de rock/blues de sua geração. Pearl é seu trabalho mais consistente, quiçá o melhor. E seu canto do cisne: o álbum foi lançado três meses após a sua morte (por overdose em 4 de outubro de 1970).
Aqui a voz de Janis vai da doçura e suavidade ao registro áspero e selvagem, entre o country rock e o blues, em faixas como os sucessos Me and Bobby McGee, Mercedes Benz e Cry Baby.
Outros discos clássicos de 1971
- Os Mutantes — Jardim Elétrico
- David Bowie — Hunky Dory
- The Who — Who’s Next
- Sly and the Family Stone — There's a Riot Goin' On
- Black Sabbath — Master of Reality
- Jethro Tull — Aqualung
- The Doors — L.A. Woman
- Funkadelic — Maggot Brain
- Genesis — Nursery Cryme
- Rod Stewart — Every Picture Tells a Story
- Yes — The Yes Album
- Al Green — Gets Next to You
- Leonard Cohen — Songs of Love and Hate
- Santana — Santana III
- Pink Floyd — Meddle
- T. Rex — Electric Warrior
- Erasmo Carlos — Carlos, Erasmo