— A sociedade quis me botar como bandido e hoje eu tô gerando 1,5mil empregos.
Foi com esta frase que o DJ Rennan da Penha iniciou o show de gravação do DVD Segue o Baile na madrugada desta quarta-feira (15), no Espaço Hall, na zona oeste do Rio de Janeiro.
Apesar de não citar diretamente, a afirmação era uma contestação à condenação do DJ a seis anos e oito meses de prisão em regime fechado por associação ao tráfico. Ele chegou a ficar preso por sete meses no ano passado, mas foi solto após ser beneficiado por uma decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que seguiu o novo entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal) contra prisão depois de condenação em segunda instância.
Além da frase, a gravação lembrou o caso com a montagem de manchetes remetendo à prisão do funkeiro e recordando os nove mortos após uma intervenção policial em um baile em Paraisópolis, na zona sul de São Paulo, em dezembro do ano passado.
Os áudios e palavras se embaralham até a palavra "favela" dominar a tela e caixas. Na sequência entram fragmentos de vídeos mostrando pipas, futebol, pessoas, cortes de cabelo "na régua" e vários outros elementos coloridos e alegres da vida na favela, junto de depoimentos de "crias" das comunidades.
Rennan emerge, solta um beat de funk 150 BPM e começa a trocar ideia com a plateia. Bailarinas tomam a cena e fica claro que não seria como outras gravações de DVD convencionais, marcadas por repetições e intervalos silenciosos para troca de cenário e figurinos.
A estrela da noite permaneceu no palco o show todo, soltando vários hits, beats e demonstrando sua vocação de mestre de cerimônias, tal como fez por vários sábados seguidos por horas a fio no saudoso Baile da Gaiola.
A primeira participação especial da noite foi de MC Livinho, que apareceu no meio de uma das duas passarelas anexas ao palco tocando a intro de Hoje Eu Vou Parar na Gaiola no piano. Só a introdução, mas logo o beat explode e ele se levanta e faz uma volta olímpica pelas passarelas mostrando seu lado dançarino. Em seguida, executa, pela primeira vez, Depressão, sua nova parceira com Rennan composta logo após o DJ deixar a prisão e que tem sample da banda californiana Cake.
Em entrevista exclusiva ao UOL, Livinho explana a parceria:
— Essa palavra, a depressão, é um bagulho doido, que só quem tem sabe, e na letra eu quis relacionar como ela é uma passagem da vida e não uma parede ou um final. Também falo de bipolaridade.
Parceiro do DJ em Hoje Eu Vou Parar na Gaiola, vencedora do Prêmio Multishow 2019, o MC conta que não foi à cerimônia em respeito a Rennan, que estava preso na época.
— A música foi uma parceria, mas quem merecia estar lá era a galera dele, a mulher dele. Não fazia sentido eu estar e ele não. Hoje somos uma força juntos.
Após as apresentações dos convidados, Rennan elogiou cada um dos artistas e grupos que fizeram parte do DVD. "Bonito e gostosão" foi o elogio a Kekel, a quem deu a deixa para puxar seu hit Namorar Pra Quê a capella.
E foi nesses intervalos que Rennan parecia se divertir mais, assumindo o microfone com várias chamadas e brincadeiras que quem já o viu tocar conhece.
— Cadê o grito da mulher solteira? Que não depende de homem para porra nenhuma? Que não quer ver o ex de jeito nenhum? Abraça sua amiga mais piranha que está do seu lado — foi apenas uma das frases disparadas.
— Nesses momentos livres eu posso tocar o que gosto — disse, antes de entoar Eu Tou Voando Alto, hit do MC Poze adotado pela torcida do Flamengo.
Teve até espaço para uma música inédita feita com o MC Poze, que não participou do DVD por ter show na mesma data.
Após sumir rapidamente para uma troca de figurino, Rennan traz pela mão a mãe e a noiva ao palco.
— Quero agradecer a essas duas mulheres, se não fosse por elas, eu estaria perdido, achando que buc*** a metro é vida — brincou.
Em seguida, ele se ajoelha e pede a mão de Lorena em casamento.
Rennan foi além do funk que o consagrou. Além de MCs como Rebecca, TH e Pocah, o show teve passeios por outros beats periféricos como um som com o grupo Parangolé marcando um encontro do pagodão baiano com um tamborzão acelerado.
Na sequência, emendou brega-funk.
— Quem gosta de brega funk levanta a mão! É, papai, tem que se atualizar, senão fica para trás que nem vários aí — provocou.
A diversidade foi uma constante no show, que ainda teve um bloco de funks "das antigas" (obviamente com espaço pro Rap da Felicidade, aquele do "eu só quero é ser feliz, andar tranquilamente na favela onde eu nasci"). Teve também proibidão e saudações para os bailes da Nova Holanda, Cidade de Deus, Colômbia e Jacaré, além do Baile da Gaiola.
Após a execução de todos os hits (apenas a parceria de Luísa Sonza com 3030 teve de ser repetida), Rennan chamou Livinho mais uma vez ao palco e rolou a première do clipe de Depressão gravado no Jardim Peri, zona norte de São Paulo.
Do sucesso à prisão Rennan começou 2019 voando alto com hits como Hoje Eu Vou Parar na Gaiola" e Me Solta.
Porém, em abril, Rennan foi preso em razão de sua condenação em segunda instância por associação ao tráfico no Rio de Janeiro, sob pena de seis anos e oito meses de prisão em regime fechado.
Ele foi acusado de ter a função de "olheiro", relatando "a movimentação dos policiais através de redes sociais e contatos no aplicativo WhatsApp".
No processo, Rennan ainda é apontado por outra testemunha como o "DJ dos bandidos" e que organiza bailes funks nas comunidades do Comando Vermelho para atrair mais pessoas e aumentar as vendas. O DJ nega as acusações.
Em outubro, Rennan da Penha venceu o Prêmio Multishow de Canção do Ano por Hoje Eu Vou Parar na Gaiola. Na ocasião, a namorada e o empresário do artista subiram ao palco para receber o troféu e pediram liberdade ao DJ, entre gritos de apoio da plateia. Ele também foi indicado ao Grammy Latino.
No mês seguinte, o funkeiro deixou a penitenciária Alfredo Tranjan, conhecida como Bangu 2, beneficiado por uma decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) que seguiu o novo entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal) contra prisão após condenação em segunda instância.
Após uma semana de férias em um cruzeiro, onde se apresentou no mesmo palco que Anitta, anunciou a assinatura de contrato com a Sony e a gravação do DVD Segue o Baile, realizada nesta terça-feira (14(. O DJ ainda foi convidado para produzir a parceria de Ludmilla com a americana Cardi B. A defesa do músico recorreu ao STJ contra a sentença que o levou à cadeia por sete meses.