Com o show Música e Poesia, o cantor e compositor Moraes Moreira volta a Porto Alegre nesta quinta-feira (25). A partir das 21h, no Theatro São Pedro, ele sobe ao palco com uma apresentação intimista, tocando sucessos de sua trajetória e declamando versos. Ocupante da cadeira de número 38 da Academia Brasileira de Literatura de Cordel, Moraes tem se envolvido cada vez mais com a poesia.
– Estou na minha fase Maria Bethânia (risos). Tem sido muito bacana misturar música com poesia. Posso fazer homenagens a nomes locais, como Erico Verissimo, Mario Quintana, Lupicínio Rodrigues, além de trazer poesias do Sertão – destaca o artista de 72 anos.
Além da poesia, Moraes deve explorar seus mais de 50 anos de carreira musical no repertório. Estão previstas músicas da época em que integrava o mítico Novos Baianos – como Mistério do Planeta e Preta Pretinha – até Ser Tão, álbum mais recente de sua carreira solo. Lançado em 2018, Ser Tão traz influências da literatura de cordel e do repente, com tom declamatório em faixas como Origens e O Nordestino do Século, marcando uma transição de Moraes na canção autoexplicativa De Cantor pra Cantador. Nascido em Ituaçu (BA), cidade tida como porta de entrada da Chapada Diamantina, o cantor usou o disco como volta às origens.
– Desde menino ouvia muito os sanfoneiros e cantadores. Esse disco serve para resgatar essa veia. Sempre tive de fazer algo voltado para as minhas próprias raízes – explica.
Junto aos ritmos nordestinos e à viola onipresente, Ser Tão também tem espaço para o blues-country I Am the Captain of My Soul. Com título em inglês, mas cantada em português, a faixa reproduz os versos de Invictus, poema do escritor inglês William Ernest Henley (1849-1903).
– Cheguei a esse poema lendo sobre Nelson Mandela (1918-2013). Quando estava preso, ele citava esse verso. Corri atrás desse poema, achei lindo e comecei a fazer uma música sobre isso. Uma homenagem não só ao poeta como também ao Mandela – relata.
Elegia
No show está prevista uma homenagem ao seu amigo João Gilberto – morto aos 88 anos no início de julho. A lenda da bossa nova influenciou diretamente Acabou Chorare (1972) – disco fundamental da MPB. Moraes cogita tocar duas músicas em tributo a João, uma delas Chega de Saudade.
– Fiquei bem triste. Era um amigo. Um mito. Esse é o verdadeiro mito. Foi o produtor espiritual do Acabou Chorare. Tivemos momentos maravilhosos no apartamento que os Novos Baianos moraram em Botafogo, no Rio – lamenta.
Além da perda do amigo, Moraes não esconde a consternação com o cenário em que a cultura se encontra sob o atual governo brasileiro:
– Tudo está acontecendo inesperadamente. Às vezes eu acho pior que na ditadura. Naquela época, nós sabíamos: era tiro e pronto. Ainda assim, tocava-se muita música brasileira na época. Não tinha uma relação determinada contra a cultura.
Essa preocupação entra no roteiro do show:
– Pergunto em um poema no show: dá para viver sem cultura? A humanidade toda foi permeada pela cultura. A arte sempre sobreviveu a perseguições ao longo da história. A cultura há de resistir a este momento.