A moçambicana criada em Portugal Maria do Céu Harris, 56 anos, que pleiteia na Justiça o reconhecimento de união estável com o pai da bossa nova, João Gilberto, morto no último dia 6, aos 88 anos, concedeu uma entrevista exclusiva ao jornal O Globo, publicada neste domingo (14).
Na conversa, realizada no escritório de seu advogado, Roberto Algranti, Maria do Céu reivindica o status de companheira e herdeira, o que a coloca em posição de conflito com parte da família. Enquanto ela alega ter sido companheira de João Gilberto desde 1984, a filha dele, a cantora Bebel Gilberto, não reconhece essa condição, diferentemente de João Marcelo, outro filho.
Maria do Céu viveu, nos últimos meses, no apartamento do músico no Leblon, no Rio, e presenciou sua morte. Segundo O Globo, ela consta no testamento que o músico elaborou em 2003 (revogado em 2017), mas no mesmo documento João afirma que não tinha companheira.
— É uma contrariedade. É a cabeça da pessoa. Mas a minha herança é o que aprendi com ele. Os livros que me deu, o Brasil que me fez conhecer, o que me tornei, a música dele que está em mim – declarou, na entrevista ao jornal.
Questionada sobre a motivação do reconhecimento da união estável, ela respondeu:
— Isso é a minha vida. Não posso abrir mão, é a minha dignidade.
Maria do Céu se recusou a falar sobre Cláudia Faissol, com quem João teve a filha Luisa Carolina, nascida em 2004. Maria responsabiliza Cláudia pelos problemas financeiros e emocionais do cantor.
Ex-miss Portugal que trabalhou como modelo e queria ser atriz, Maria conheceu João em 1984, poucos dias depois de ter assistido a um show dele. O músico teria dito: "Como é seu nome? Maria do Céu? Vem aqui".
— João me falou: "Venha pro Brasil". Ele teve que pedir dinheiro emprestado pra comprar minha passagem. Veio antes, eu vim em setembro. Saí de lá e passaram-se seis anos sem ninguém da minha família saber de mim. Minha mãe achou que eu tinha morrido. Acho que eu era meio exótica. Minha mãe chorou muito. Quem falou com ela foi João. Eu era doida, né? Depois ele demorou a fazer show lá, eu perguntava por que e ele dizia: "Eu só fui a Portugal pra buscar você".
Maria do Céu também contou detalhes a respeito da intimidade do músico. Sobre seu temperamento, disse que "o gênio é genioso" ("Por mais que fosse a Nova York, Tóquio, ele sempre era de Juazeiro"). Também declarou que ele gostava de andar de carro à noite, que fumou skunk (maconha mais forte) até morrer e que em casa só andava de pijama ("Mas era cada pijama... Ele comprava na Harrods").
Interrogada se ela mesma é temperamental, declarou:
— As pessoas chegam... Elas vêm com tudo pra cima. No início, tem essa timidez. Eu fico freando, aí quando eu vou, é pra não perder. Vou pra te botar no lugar. E eu te boto.
Sobre a turnê de 80 anos de João anunciada para 2011 mas não realizada, alfinetou:
— Não existe uma turnê de 80 anos, isso foi inventado. Quem está em volta é meio vampiro para o artista.