A Cachorro Grande acabou. E, com o fim, ficam para trás também memórias, delírios, ilusões e catarses típicas de uma década – talvez a última delas – em que o cenário de Porto Alegre era composto por jovens caminhando com guitarras a tiracolo, “rock gaúcho” ainda era uma expressão que fazia sentido e bandas, divididas entre gravatinhas (mods, como a Cachorro Grande) e jaquetinhas (os indies), ansiavam por dar voos mais altos, impulsionadas por shows intensos no circuito de inferninhos da cidade. Depois de 20 anos de carreira, a banda liderada pelo vocalista Beto Bruno retoma sua formação mais conhecida para dar adeus aos fãs.
Neste sábado, os músicos tocam juntos pela última vez. A última parada da turnê de despedida será em Porto Alegre, com duas sessões, às 18h e às 20h, no bar Opinião. Emotivo desde que decidiu, junto aos outros integrantes, pelo fim da banda, Beto Bruno inevitavelmente derramará lágrimas ao reinterpretar faixas que fizeram história na cidade e além, como Sexperienced, Lunático, Sinceramente, Bom Brasileiro e Dia Perfeito.
– O fim foi horrível para mim. Na frente dos outros, eu queria parecer forte, mas fiquei muito mal. O que me salvou da depressão foi pegar meu violão e voltar a tocar. Fiquei trancado no quarto sozinho e saí de lá com 10 músicas novas, que vão estar no meu disco solo. Como fã, não gosto de bandas que acabam de uma hora para a outra, com briga – conta, meio lacrimoso, Beto Bruno.
Nostalgia
Quando a Cachorro Grande decidiu que era hora de acabar, muitos de seus membros já tinham planos definidos, ou pelo menos encaminhados, para o futuro: o guitarrista Rodolfo Krieger está de mudança para a Europa, o baterista Gabriel Boizinho deve investir em produção musical, o tecladista Pedro Pelotas planeja tocar projetos pessoais, e o guitarrista Gustavo X se junta a Bruno na carreira solo do vocalista. Marcelo Gross, guitarrista e sócio fundador da Cachorro Grande, que saiu da banda em 2018 e já tem dois álbuns solo, volta a subir ao palco com os antigos parceiros, em benefício da nostalgia.
O fim da Cachorro Grande foi anunciado por Beto Bruno no final do ano passado.
– Eu já estava em processo de gravação do meu disco solo, quando falei: “Vamos pegar 20 cidades, fazer 20 shows de despedida, trazer o Gross de volta, esquecer tudo que aconteceu de ruim e terminar todo mundo abraçado em cima do palco”. Criamos um grupo de WhatsApp, voltamos a nos falar e conseguimos criar um clima de muita emoção – comemora Beto.
Para as apresentações deste sábado, além dos grandes sucessos dos oito discos de estúdio – do urgente e roqueirão Cachorro Grande (2001) ao eletrônico e manchesteriano Electromod (2016) –, a banda deve reservar algumas surpresas para os fãs mais antigos: lados B, faixas raramente tocadas e as preferidas de cada um dos músicos também devem aparecer no repertório.
Sobre o futuro, Beto Bruno diz que não há mistério:
— Vamos continuar fazendo rock, cada um do seu jeito. Daqui a dois fins de semana eu estou na estrada com a minha banda.
O vocalista Beto Bruno concedeu uma entrevista ao Timeline, da Rádio Gaúcha, e se emocionou ao relembrar de fatos marcantes da história da Cachorro Grande:
Cachorro Grande
- Sábado, às 18h e às 20h
- Opinião (Rua José do Patrocínio, 834)
- Ingressos (disponíveis apenas para a sessão das 18h): R$ 160 (inteira) e R$ 85 (solidário, mediante doação de 1kg de alimento no momento da entrada)
- Pontos de venda: loja Multisom Iguatemi (sem taxa), lojas Multisom restantes ou pelo site sympla.com.br (com taxa).
Três lembranças de Beto Bruno
O primeiro disco
“Existia um movimento, nós tínhamos um baita público, mas o mais importante era o disco. Lançamos no Teatro Bruno Kiefer, mas não tínhamos músicas para a duração que o teatro pedia, então compusemos Hey, Amigo! e Que Loucura! para aquela noite.”
Acústico bandas gaúchas
“A turnê foi um desastre. Um mês antes, tinha saído o Pista Livre e nós lotamos a agenda. O bom é que nessa época fomos contratados pela Deck e começamos a aparecer muito na MTV, no Altas Horas e no Jô.”
Com os Rolling Stones
“Não é o momento mais importante da minha carreira, mas da minha vida. Quando terminou a turnê com o Oasis, falei: ‘Agora só falta abrir para os Stones no Beira-Rio’. O encontro com eles no camarim durou 14 minutos, os 14 minutos mais absurdos de toda a minha vida. Lembro de cada segundo.”