Dizer que Mariza é uma das principais cantoras de fado da atualidade faz justiça a ela, mas talvez já não dê conta da pluralidade de referências que a intérprete portuguesa nascida em Moçambique tem acrescentado a seu repertório desde que estreou em disco, em 2001, com Fado em Mim. Se nos primeiros tempos ela reverenciava Amália Rodrigues, nome incontornável do nostálgico gênero musical, Mariza soube encontrar sua voz, o que a levou a ser considerada uma artista de world music — rótulo um tanto genérico, mas que expressa o caráter multifacetado de seu trabalho.
É essa artista de timbre potente, característico da música portuguesa, que canta pela primeira vez em Porto Alegre nesta quarta-feira (29), às 21h, no Teatro do Bourbon Country (Av. Túlio de Rose, 80), divulgando seu sétimo disco de estúdio, chamado simplesmente Mariza (2018). Acompanhada de Pedro Joia (violão), José Neto (guitarra portuguesa), Fernando Araujo (baixo acústico), Hugo Marques (bateria e percussão) e João Frade (acordeão), ela apresentará canções do mais recente trabalho, como Quem me Dera, Oração (a primeira letra escrita por ela, parceria com Tiago Machado) e Semente Viva (gravada com o violoncelista brasileiro Jaques Morelenbaum, que havia produzido seu terceiro álbum, Transparente), e outras que não podem faltar nos show, como Ó Gente da Minha Terra, do primeiro álbum.
Nome é homenagem a cantora brasileira
Batizada em homenagem à cantora brasileira Marisa Gata Mansa (1938-2003), que seu pai admirava, Mariza se mudou com a família de Moçambique para Portugal ainda na infância. Cresceu no tradicional bairro lisboeta de Mouraria e começou a cantar ainda pequena no restaurante dos pais.
O reconhecimento internacional começou já no primeiro disco, e vem crescendo com o passar dos anos. Um exercício de leitura dos títulos dos álbuns, em ordem cronológica, evidencia os passos da artista entre a tradição e a inovação: Fado em Mim, Fado Curvo, Transparente, Terra, Fado Tradicional, Mundo e Mariza. Nesta entrevista, a cantora fala sobre como será o show na Capital, sobre as transformações do fado e a conexão entre Portugal e Brasil.
Mariza: "O principal é o sentimento que se transmite às pessoas"
Esta é sua primeira vez cantando em Porto Alegre. Poderia revelar um pouco do que o público da cidade pode esperar do show da noite desta quarta?
O show é o que estamos apresentando em vários países na turnê internacional que termina em dezembro. É sempre um prazer voltar ao Brasil e poder partilhar com todos a minha música. Vou promover ao vivo o meu último disco, Mariza, e claro que trago comigo também temas que muitos conhecem, como Ó Gente da Minha Terra e Chuva, entre outros. Dos temas novos, Oração, Quem me Dera e Semente Viva estão entre os que vamos apresentar. Eu diria que é uma viagem entre todos os meus discos. Será a minha primeira vez em Porto Alegre e acredito que será memorável!
O fado tem sido reinventado por destacadas intérpretes, como você, Carminho e Mísia. Como busca sua singularidade, sua voz dentro dessa tradição tão antiga e viva?
Todas as pessoas têm a sua história de vida. Eu tenho a minha, e é isso que eu canto. Canto o que me faz ser a pessoa que sou e não poderia ser de outra maneira. O fado, como tantas outras músicas urbanas, move-se com a sociedade, vai se transformando, se reinventando. Portanto, o que eu canto hoje é o que me representa neste momento de minha vida.
Muitos a consideram uma artista de world music pelas criativas fusões que realiza em seu trabalho. Como você lida com o que é próprio do fado e as demais referências?
Eu me vejo como uma intérprete e acho que o principal é o sentimento que se transmite às pessoas. Não importa muito de onde vem o que se canta. Eu cresci em dois mundos: o africano, que sempre foi muito forte na minha mãe, e o português, de meu pai. Esses mundos se misturaram em minha cabeça e me fizeram o que sou. A minha vida inteira eu ouvi world music dentro de casa sem ninguém me dizer que era world music (risos). Eu concordo muito com aquela frase maravilhosa do Dizzy Gillespie: existem dois tipos de música, a boa e a má.
Temos visto muitas parcerias entre artistas de Portugal e do Brasil. A propósito, Jaques Morelenbaum participou da gravação da faixa Semente Viva no seu mais recente disco. Mesmo assim, muitos ainda têm a impressão de que as culturas de Portugal e do Brasil poderiam se aproximar mais, tendo em vista nossa identificação linguística. Qual a sua visão a respeito disso?
Eu sempre acho que a gente pode estar mais próximo, que a gente poderia fazer mais músicas, mas essa é uma visão minha. Agora, eu também acho que existe uma consciência muito grande do Brasil sobre Portugal, que não existia. Era ao contrário: nós sempre amamos os artistas brasileiros, os atores, as novelas brasileiras, e hoje em dia isso é recíproco. Vocês conhecem mais o nosso Portugal, e isso é maravilhoso.
Para uma artista tão inquieta e criativa como você, quais serão as invenções e fusões que pretende realizar em seus próximos trabalhos?
A questão é que isso não é pensado, é sentido (risos)! Quando eu estou no estúdio é que as coisas acontecem. Eu nunca sei se vou fazer isso ou aquilo, se quero inovar aqui, fazer algo diferente ali, para mim não funciona dessa forma. O estúdio é uma espécie de laboratório com o coração, então, as coisas só funcionam no momento, eu nunca sei o que vai acontecer.
MARIZA
Nesta quarta-feira (29), às 21h.
Teatro do Bourbon Country (Av. Túlio de Rose, 80), em Porto Alegre.
Duração: 90 minutos. Classificação: livre.
Ingressos: R$ 240 (cadeiras extras na plateia baixa). Os demais setores estão esgotados. Desconto de 50% para os cem primeiros sócios do Clube do Assinante e 10% para os demais. À venda na bilheteria do teatro.