Passar quase dois anos viajando pelo mundo com a turnê de Remonta (2016) teve uma consequência inesperada em Liniker: longe de casa, a cantora voltou-se para si. Não que as composições da paulista alguma vez tenham sido expansivas, sobre temas amplos ou festivos. Mas em Goela Abaixo, disco que Liniker & Os Caramelows lançaram em março passado e apresentam nesta quinta-feira (25) na Capital, em show no Opinião, as faixas estão mais introspectivas do que nunca. Tratam de momentos íntimos, angústias pessoais, conquistas particulares e, principalmente, a aceitação de quem se é.
É natural que, em um segundo disco, artistas aprofundem-se em temáticas e ambientes que apresentaram na estreia. Mas no caso de Liniker tudo isso foi turbinado pela primeira grande turnê internacional – foram mais de 20 países entre 2017 e 2018, entre eles Estados Unidos, Inglaterra, França, Portugal, Colômbia e Angola.
Foi nesse processo que a artista compôs faixas como Intimidade (“Sem pressa, você chega e fica, eu finco afeto nesse peito”), Gota (“Fica mais um pouco ni mim, que a gente trilha junto o mapa do lugar”) e Claridades (“Esqueço o final, e o ar da noite é tudo o que eu preciso a noite inteira”).
– É um mergulho para dentro, uma conexão comigo. Mais do que músicas dedicadas a alguém, são músicas sobre o que eu precisava dizer para mim mesma – conta a cantora, por telefone, antes de embarcar no voo para Porto Alegre.
Goela Abaixo, nesse contexto, talvez surja como um processo de autoanálise de Liniker. Aos 23 anos, a mulher negra e trans nascida no interior de São Paulo acostumou-se (ou não) a um ambiente opressor, em que “os recortes que trago na minha existência não são bem quistos”. Não por coincidência, a sonoridade do disco – cru, para usar o termo que deu nome ao primeiro EP da banda – também transparece essa gama de sentimentos.
– É um processo de validar minha existência. Tenho sentido cada vez mais vontade de existir com verdade, com coisas que me potencializem, sem esperar que nada venha do outro. Principalmente neste momento político que vivemos, é um processo de me bem querer e de querer que a banda esteja viva. Os meninos tiveram bastante sensibilidade no que diz respeito ao som – avalia, referindo-se à produção do álbum, feita pelo baixista da banda, Rafael Barone, em parceria com os outros instrumentistas.
Nesta quinta-feira, em cima do palco, Liniker deve despejar sobre o público esse conjunto de sentimentos em forma de performance. Mas pode não acontecer: segundo a própria, apresentações ao vivo são momentos que prolongam esse respeito da artista em relação a si mesma. Portanto, há pouco pensado previamente, movimentos ensaiados ou frases feitas.
– O show transcorre com o que o meu dia pede, com o que a troca com o público oferece. Entendi que sou uma artista que quer perceber as coisas de fato, não me enrijecer para estar a favor delas. É sentir o momento e ir. Tem que ser gostoso para mim.
Liniker & Os Caramelows
Quinta-feira, às 21h.
Opinião (Rua José do Patrocínio, 834).
Ingressos: R$ 70 (solidário, mediante doação de 1kg de alimento) e R$ 120 (inteira, no terceiro lote) , com desconto de 50% para sócios do Clube do Assinante.
Pontos de venda: lojas Multisom do shopping Iguatemi (sem cobrança de taxa); da Rus dos Andradas 1.001 e dos shoppings Praia de Belas e Barra ShoppingSul (com cobrança de taxa).