Com 48 anos de carreira, Chitãozinho & Xororó poderiam pensar em aposentadoria ou até em diminuir o ritmo de shows para descansar e festejar os louros de uma trajetória bem-sucedida. Mas, com pique de guris, os paranaenses não param e se revelam atentos aos novos rumos da música nacional.
Nos palcos, entram no embalo do empoderamento feminino que vem se mostrando tão necessário, rompendo barreiras. Ao gravar um disco exclusivamente com cantoras, os irmãos mostram que, além de generosos, estão ligados nos movimentos da sociedade atual. Chitãozinho, 63 anos, e Xororó, 60, quebram paradigmas com o novo álbum, em um meio historicamente machista.
Constelação de estrelas
Para a gravação do álbum Chitãozinho & Xororó - Elas em Evidência, lançado como CD (R$ 25, preço médio), DVD (R$ 35) e nas plataformas digitais, os irmãos, naturais de Astorga, no interior do Paraná, convocaram um verdadeiro exército de mulheres que ganharam destaque na música nacional, nos últimos anos.
No show gravado no dia 4 de outubro de 2017, no Km de Vantagens Hall, no Rio de Janeiro, os sertanejos receberam no palco Simone & Simaria, Maiara & Maraisa, Anavitória, Ana Clara, Tânia Mara, Marília Mendonça, Bruna Viola, Kell Smith, Alcione e Paula Fernandes.
Lançamento
Com elas, passaram em revista 27 dos sucessos que compõem os 48 anos de carreira dos músicos.
Em entrevista por telefone, de Campinas, no interior de São Paulo, onde mora, Xororó comenta que a ideia do DVD surgiu durante os ensaios para a nova turnê.
— Quando a gente viu o roteiro, comentamos: "Tá com cara de DVD". Então, veio a ideia de convidar a mulherada, para fazer um show diferente — relembra Xororó.
Imediatamente, os artistas, que são do cast da gravadora Universal Music no país, ligaram para o presidente da empresa, Paulo Lima, e falaram sobre o projeto que viraria um DVD.
— Ele disse: "Temos que pra fazer para ontem, para lançar neste ano ainda (o álbum chegou às lojas e plataformas digitais poucos dias antes do Natal de 2017)". E ainda gravamos no Rio de Janeiro, com ingressos esgotados — conta Xororó, orgulhoso do feito da dupla:
— Entre gravação, mixagens e tudo mais que envolve um lançamento deste tamanho, foram dois meses, um recorde na nossa carreira! Uma força-tarefa, que nos deu orgulho quando vimos o resultado. É bem difícil completar todos esses processos em menos de três meses.
"O sol brilha para todos"
Com a força que a mulherada vem mostrando na música sertaneja nos últimos anos, principalmente em 2017, com o chamado "feminejo", nada mais natural que elas fossem chamadas para gravar um álbum com uma das principais duplas da história da música do gênero no país.
— Até o nome do projeto casou com o momento delas. Elas estão com tudo no Brasil e no mundo. Por isso, resolvemos juntar grandes vozes femininas de vários ritmos e estilos diferentes para montar esse trabalho. A ideia é, justamente, mesclar tudo e mostrar a força e a independência feminina — afirma Xororó sobre o trabalho lançado.
Chitãozinho reconhece as diferenças musicais entre as convidadas, mas nada que atrapalhe:
— Mesmo assim, existe entre elas uma ligação, algo que as une. No caso dessas mulheres em especial, é a música.
Generosidade
Apoiadores de todos os segmentos do sertanejo,os músicos lembram das reações adversas que tiveram quando deram espaço para novos nomes do gênero em um dos discos comemorativos. Em Chitãozinho & Xororó - 40 Anos - Nova Geração (2010), eles dividiram os vocais com nomes recém-surgidos para o grande público, como Luan Santana.
— Ouvimos muitas críticas dos conservadores: "Esse movimento chamado de sertanejo universitário não dará em nada, é modismo". Mas a gente acredita que esses movimentos ajudam a fortalecer o segmento. Luan era um menino, mal tinha se lançado — relembra Xororó, que completa em tom generoso:
— A gente sempre pensou desta maneira, o sol brilha para todos. A cada estrela que surge, o céu fica mais bonito.
Por trás do sucesso, disciplina profissional
Em uma conversa que deveria durar 15 minutos, mas acabou sendo de mais de meia hora, tamanha a empolgação de Xororó com o DVD e a sua vontade de contar histórias, o cantor falou sobre os novos sertanejos, os cuidados com a voz e, claro, sobre a sua relação com os gaúchos, já que tem genro e nora daqui.
Hoje, o crescimento dos festivais sertanejos deixou os shows grandiosos, megaespetáculos, com palcos luxuosos. Como tu vês isso tudo? E como era no tempo de vocês?
Eu costumo dizer que essa juventude da música sertaneja abriu um leque gigante. Lembro que, durante uns três anos, no começo da nossa estrada, tudo o que a gente ganhava, investia em instrumentos. Eu chegava a dirigir o nosso caminhão. Hoje, o palco deles é de Rock in Rio, o investimento dos jovens sertanejos beneficia toda a música sertaneja e o público, claro. Temos vários festivais que levam milhares de pessoas por ano a vários locais. Inclusive, para o Rio Grande do Sul.
No meio musical, é possível notar cantores que tiveram problemas com a voz, como Zezé Di Camargo (que teve de fazer uma cirurgia nas cordas vocais, por conta de um cisto congênito, em 2007). Como, em mais de 40 anos de carreira, tu consegues manter a tua voz intacta?
Eu tive uma grande lição na juventude. Era solteiro, há uns 40 anos. E, como todo jovem, depois do show, eu ia pra noite, né? Tomava um "traguinho" para relaxar e tal, mesmo nunca tendo sido de bebida. Nesse dia, a gente estava fazendo um show em São José do Rio Preto(no interior de São Paulo), e estávamos em um hotel, na frente da rodoviária. Encontramos Tonico & Tinoco e convidamos ele para tomar alguma coisa. Tonico me disse: "Não, rapaz, vai tomar leite quente, porque você tem que acordar com a voz boa amanhã". Naquela noite, fui para o hotel e nunca mais saí depois de um show.
Quais são os teus cuidados, além de não ir para a noite depois dos shows?
Ah (risos), vários. Álcool e cigarro não fazem bem para a voz. Hidratar as cordas vocais com água é um segredo. Acredito que o fato de eu ser diurno também ajuda. Quando um show passa das 22h, fico p... da vida, rapaz. Não gosto de cantar tarde da noite, acho falta de respeito com o público e comigo. Se eu quero cantar, tenho que me cuidar. Fiquei mais caseiro. Meu irmão sempre diz que eu pareço o cuco: só saio de casa para cantar.
Como é a relação de vocês com a música gaúcha?
Sempre gostamos, desde jovens. Sempre cantamos vanerão, por exemplo. Já cantamos o clássico Guri com o Gaúcho da Fronteira e gravamos com o Borghettinho. Ah, e regravamos É Disso Que o Velho Gosta, da Berenice Azambuja, que é uma grande cantora.
Com um genro gaúcho (Lucas Lima, casado com Sandy) e uma nora daqui (Monica Benini, casada com Junior), os costumes gaúchos tomaram conta da família?
(Risos) Pior que tomaram conta mesmo! Está tudo misturado. Já tomo chimarrão direto. E sabe que a gente tenta combinar de passar um fim de semana em Garibaldi (terra de Monica) para fazer turismo? Mas anda complicado conciliar as agendas. A gente quer ter contato com as pessoas, conhecer as adegas da região. É um lugar muito gostoso.