Aos 41 anos, Kleber Cavalcante Gomes, o Criolo, surpreendeu muita gente no último dia 28, ao lançar, sem muito alarde, o disco Espiral de Ilusão, com 10 sambas inéditos. Saíam de cena as picapes para dar lugar ao cavaquinho e ao violão de sete cordas.
– Não pude avisar muito. A gente pegou e pum – resume o cantor, que afirma estar vivendo uma grande aventura na carreira. – É um sonho de mais de 10 anos.
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O novo álbum de Criolo surge para consolidar trabalhos esporádicos do artista no gênero musical que completou cem anos em novembro do ano passado. Em Nó na Orelha, de 2011, disco divisor de águas na carreira do rapper, ele cantava, em Linha de Frente, que "o nó da tua orelha ainda dói em mim". Os sambas apareceriam novamente em 2014 com Fermento pra Massa (Convoque seu Buda) e em 2016 com Até Amanhã (single da coletânea Se Assoprar Posso Acender de Novo, na qual artistas interpretaram músicas até então inéditas de Adoniran Barbosa). No ano que passou, ainda participou de duas faixas do mais recente disco de Martinho da Vila, De Bem com a Vida.
Mas a história de Criolo com o samba começou ainda durante a infância, no bairro do Grajaú, zona sul de São Paulo.
– O samba sempre esteve dentro da casa do trabalhador. Para a gente que nasceu em favela, que é de quebrada, sempre foi a coisa mais natural. Estranho era naquela época, em 1987, você escrever uma letra de rap – afirma o dono da canção-hino Não Existe Amor em SP. – A grande parada de memória afetiva é o que o meu pai e a minha mãe escutavam, no vinilzinho, na rádio: Martinho da Vila, Moreira da Silva, mas, ao mesmo tempo, embolado, tinha Raul Seixas, Scorpions, Nat King Cole. Também Luiz Gonzaga, tudo junto ali. A memória que tenho é da minha mãe cantando essas canções, as suas serestas, e o meu pai escutando samba dentro da nossa casa.
Criolo afirma ter se reconectado com esse passado no meio de 2016, quando tomou coragem para juntar suas composições e mostrá-las para os amigos da turma, entre eles Daniel Ganjaman e Marcelo Cabral, produtores de Espiral de Ilusão, "para ver o que a gente podia fazer".
– Gerou-se uma grande energia de retomar e buscar coisas antigas, deixar para desaguar tudo que tinha de samba nesse nosso novo momento – explica o rapper.
Das 10 músicas do disco, duas não são assinadas somente por ele: Hora da Decisão é de Ricardo Rabelo e Dito Silva, e Filha do Maneco, uma composição de Criolo, Rabelo e Jefferson Santiago. De cunho político o cantor apresenta Cria de Favela e Menino Mimado, primeiro single do álbum, no qual projeta a eleição do ano que vem e defende que "meninos mimados não podem reger a nação".
As dores de um coração machucado, tema pouco tratado em seus trabalhos anteriores, aparecem na faixa Espiral de Ilusão, em que questiona: "Me magoou, me destruiu, me desandou / Como você dorme tranquilo?". A sofrência também está presente em Dilúvio da Solidão e Calçada.
A inspiração para as letras, filosofa Criolo, vem "desse tanto que visita a gente, dessa coisa que existe dentro da gente e que a gente vai descobrindo. E desse tanto de coisas externas que acontecem, que mexem com a gente ou com alguém próximo da gente". E complementa:
– Nasceram assim. Desse jeitinho que cantarolei, a gente gravou. Os diretores musicais optaram por fazer uma preservação disso que nasceu. E aí foi pro mundo.
Ao vivo, os "lararás" de Criolo serão ouvidos pela primeira vez em Porto Alegre, no Auditório Araújo Vianna, no dia 27 de maio, quando estreia a turnê de Espiral de Ilusão.
– É um momento muito especial. Estou numa ansiedade para fazer esse show que você não acredita, é como se fosse a primeira vez indo para o palco – afirma o artista.
E a galera do hip hop, como fica agora com o Criolo sambista?
– Uma coisa não anula a outra. Mas vai saber se não vão estar passando uns raps loucos na minha cabeça neste mês? A gente não pode pegar a mente e colocar em compartimentos, limitá-la. Ainda mais em arte. Seria uma coisa sufocante.
CRIOLO
27 de maio, às 21h30min (abertura dos portões: 19h30min).
Auditório Araújo Vianna (Avenida Osvaldo Aranha, 685).
Classificação: 14 anos.
Ingressos: R$ 70 (plateia alta lateral), R$ 90 (plateia alta central), R$ 80 (plateia baixa lateral), R$ 100 (plateia baixa central) e R$ 150 (plateia gold).
Pontos de venda sem taxa: bilheterias do Teatro do Bourbon Country e do Auditório Araújo Vianna (somente no dia de apresentação).
Pontos de venda com taxa: Universidade Feevale – Campus II, Bourbon Shopping Novo Hamburgo – Quiosque Feevale (pagamento somente com cartão), Agência Brocker Turismo (Gramado), site ingressorapido.com.br e telefone 4003-1212.
Ouça agora Espiral de Ilusão:
ESPIRAL DE ILUSÃO
De Criolo
(Samba, Oloko Records, 10 faixas, disponível nos serviços de streaming e para download em criolo.net)
Cotação: bom (3/5)