Na primeira vez em que convidou Gabriel Selvage para participar de seu show, Luiz Marenco encontrou-se com o instrumentista só em cima do palco: não precisaram nem ensaiar, pois o jovem músico sabia dedilhar todas as canções do compositor – um dos mais populares nomes da música regionalista gaúcha. Da mesma forma foram o segundo, o terceiro e o quarto encontros da dupla, que, neste sábado, sobe junta ao palco pela quinta vez, para o espetáculo Pra o Meu Consumo. Só que agora os dois vão precisar se encontrar e repassar as milongas – não só porque a apresentação é em um palco sagrado do Rio Grande do Sul, o Theatro São Pedro, mas também porque Marenco deve apresentar músicas que nunca antes foram tocadas ao vivo, nem por Selvage, nem por ele.
– É o folclore do teu Estado entrando em um teatro – comenta o músico, que faz um paralelo entre a grandiosidade do espaço físico e a trajetória de um cantor e seu repertório: – Quando tu chegas em um teatro que tem essa história e quer contar um pouquinho da tua própria história, é especial. Estradeiro, uma composição que fiz para minha esposa, por exemplo, eu nunca cantei ao vivo. Vou cantar pela primeira vez – empolga-se.
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Pra o Meu Consumo, como o próprio título (tirado de uma das melhores músicas da carreira de Marenco) diz, é um show intimista: com apenas um instrumentista o acompanhando no palco, o cantor interpreta milongas que vêm desde seu primeiro disco, com composições de Jayme Caetano Braum, ao mais recente, Sul, em que fala sobre sua terra. Entre todas elas, cerca de 20, um fio condutor: a vida, as impressões, as histórias e os pontos de vista de Luiz Marenco – gaúcho de Porto Alegre, 52 anos, quase 30 de carreira, morador de Santana da Boa Vista, pai de um casal de crianças e dono de vasta cabeleira e longa barba, esta já branca:
– É um show para o meu consumo, para as coisas que me fazem bem. E para aquelas pessoas que vão estar no espetáculo, que adoram ouvir milonga – conta, antes de explicar as peculiaridades que um show com menos elementos no palco permite:
– A poesia tem que ter consistência. Tu pode colocar um ritmo diferente, mas o que dá consistência é a poesia. É ela que vai te dizer algo, que vai te trazer uma imagem, que vai abordar um assunto. A melodia é o veículo para que esse poema chegue aos teus ouvidos, e este show permite às pessoas apreciarem a letra, mastigarem o poema, verem as imagens. Principalmente com uma guitarra bem tocada e com arranjos bem-feitos.
E Marenco não fala por falar: se o show é para o consumo dele, os fãs foram atraídos. Durante a entrevista, na tarde de quinta-feira, o cantor recebeu a notícia de que os cerca de 660 ingressos disponibilizados para o espetáculo haviam se esgotado. Agora, resta ao gaúcho de cabeleira basta e barba branca resgatar as composições que aprecia, ajustar os pontos com Gabriel Selvage e subir ao palco sagrado do Theatro São Pedro lotado:
– É um templo. As pessoas vão ao teatro, se sentam e querem ouvir. Aquela aura que flutua, aquela energia do teatro... É maravilhoso. Olha, tchê, este show vai ser bem diferente!