A canção vestiu gala na noite de sábado (22/10) no Theatro São Pedro. Mais especificamente, terno e gravata. Foi assim, elegantemente trajado, que Vitor Ramil subiu ao mais nobre palco de Porto Alegre para um concerto com a Orquestra de Câmara Theatro São Pedro (OCTSP), regida por Antônio Borges-Cunha. O programa teria, ainda, uma reprise no domingo – os ingressos para ambas as apresentações estavam esgotados desde o início da semana.
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Anunciado pelo maestro como solista, seguindo o protocolo da música de concerto, Vitor era bem mais do que isso: para o público, tratava-se da estrela da noite. Entrou em cena depois que a orquestra tocou o prelúdio das Bachianas brasileiras nº 4, fazendo graça com modéstia:
– Será que vão querer me ouvir depois de Villa-Lobos?
Apesar do belo número de abertura, foi quando Vitor empunhou o violão que o show realmente começou.
Conforme o cantautor pelotense interpretava seus grandes sucessos ao lado do conjunto, borrava-se a tênue fronteira entre música de concerto e música popular. Estavam todos – solista, maestro e orquestra – à vontade fazendo simplesmente música. Os arranjos de Vagner Cunha (e Celso Loureiro Chaves em Indo ao pampa) entrelaçavam-se ao canto e ao violão como fita de Möbius, adequando-se ao ritmo, à harmonia e à melodia. Foi-se o tempo dos velhos acompanhamentos de cordas empolados que tinham como missão conferir certo grau de erudição à música popular; hoje a canção é Nobel de Literatura.
Entre os pedidos da plateia, por sinal, esteve Joquim, versão de Joey, de Bob Dylan, que não estava no programa. Vitor brincou que esta precisaria de um concerto exclusivo, em referência a sua longa duração. A descontração era tanta que, lá pelas tantas, cantor e maestro satirizaram até mesmo os cabelos grisalhos de ambos.
O programa foi um passeio por diversas fases da carreira de Vitor, que está produzindo um novo disco, ainda sem previsão de lançamento. Dialogou com a tradição musicando poemas de Fernando Pessoa (Noite de São João) e João da Cunha Vargas (Querência e Deixando o pago) e colocando letra em um prelúdio de J.S. Bach (Perdão).
Não faltaram clássicos como Milonga de sete cidades e, para encerrar, Estrela, estrela e Astronauta lírico. Em uma noite dedicada, em parte, à milonga, não poderia faltar no bis Ramilonga, que foi pedida pelo público mas já estava prevista desde antes. Mango, outra com poema de João da Cunha Vargas, fechou a noite. Frente a uma plateia lotada, Vitor garantiu ao maestro que eram todos familiares de Pelotas. Enganou-se em um aspecto: na verdade, vinham de Satolep.