A Feira ficou setentona. Criou casca e mostrou que sabe resistir apesar das adversidades: pandemia, falta de verba, enchente. Longe de estar obsoleta, cada vez mais é provocada a se abrir para o novo, ampliando o debate sobre raça e gênero. Experiente e antenada, ocupará a Praça da Alfândega entre esta sexta-feira (1º) e o dia 20 de novembro, com 72 bancas de livros funcionando juntas, entre 10h e 20h.
A cerimônia de abertura, com as presenças do patrono Sergio Faraco e da ministra da Cultura, Margareth Menezes, está marcada para as 18h no Teatro Carlos Urbim, montado entre o Museu de Arte do RS (Margs) e o Memorial do RS.
Criada em 1955, é considerada a mais antiga feira literária realizada no Brasil de forma ininterrupta. Tanto que, entre alguns, é chamada de "A Feira Mãe". Já não é grandiosa como chegou a ser no começo dos anos 2000, quando tinha em torno de 130 bancas que se espalhavam até o Cais Mauá e ocupavam a beira do Guaíba.
Enfrentou reveses sucessivos nos últimos anos, começando em 2020, quando teve de abandonar a Praça de forma inédita, aprendendo a existir na realidade virtual; passando por 2023, quando perdeu o apoio da Lei de Incentivo à Cultura (LIC) e quase ficou impedida de acontecer pela falta de verba; e chegando a 2024, quando Porto Alegre viveu a maior cheia de sua história, sem poupar livrarias, editoras, distribuidoras e gráficas.
Além do tom de comemoração, a edição de 70 anos será mais uma em que a Feira deverá mostrar a resiliência aprendida ao longo das décadas, diz Maximiliano Ledur, presidente da Câmara Rio-Grandense do Livro (CRL), entidade que organiza o evento desde 1963.
— Será uma feira de retomada para o setor. Entre as editoras associadas que expõem no evento, 27 tiveram suas sedes alagadas. Isso é muita coisa. As outras, indiretamente, também foram atingidas. Tem editoras que ainda não reabriram e só vão reabrir para a Feira, para conseguirem alguma receita. A Feira também vai representar o recomeço do próprio Centro Histórico de Porto Alegre, que ainda está meio vazio depois da enchente, ainda não voltou a todo vapor.
O orçamento projetado pela CRL para esta edição foi de cerca de R$ 3,5 milhões, dos quais foram arrecadados aproximadamente R$ 3,3 milhões. A cifra inclui verbas captadas pela Lei de Incentivo à Cultura do Estado (LIC-RS) e pela Lei Rouanet do governo federal, além de aporte direto do Banrisul e outros patrocinadores. Faltaram, assim, R$ 227 mil. A lacuna, diz Ledur, é resultado da falta de engajamento de quem poderia, mas não quis se tornar apoiador.
— A Feira poderia ser muito maior se houvesse participação das empresas. Ela é tida como a Feira Mãe pelo governo federal, foi chamada desse jeito inclusive na abertura da Bienal do Livro de São Paulo. Isso enche a gente de orgulho. Mas passamos uma dificuldade gigantesca para arrecadar 5% do que uma Bienal arrecada. É difícil. A Bienal arrecadou R$ 40 milhões. Talvez uma Feira do Livro não dê a visibilidade que as empresas querem, mas as empresas deveriam entender que o livro é uma fonte inesgotável de conhecimento — lamenta.
Lugares que costumam fazer parte do roteiro de um passeio pela Praça da Alfândega, o Margs e o Memorial do RS ainda estão se recuperando da enchente e não irão abrir as portas para receber eventos da programação. Atividades como bate-papos com escritores e oficinas ocorrerão no Espaço Força e Luz e no Clube do Comércio, ambos na Rua dos Andradas, e no Teatro Carlos Urbim.
Considerado um dos maiores contistas do país, o patrono Sergio Faraco, 84 anos, está lançando o livro de memórias Digno É o Cordeiro, sequência de Lágrimas na Chuva (2002), ambos publicados pela L&PM. No domingo (3), às 16h30min, ele participa de um bate-papo sobre sua carreira e produção literária, na Sala Noé de Melo Freitas no Espaço Força e Luz. Às 18h, faz uma sessão de autógrafos na Praça da Alfândega.
Apesar dos contratempos, a Feira ainda é um dos principais palcos do Brasil para novos escritores projetarem-se para o público e autores renomados encontrarem-se com os fãs. Haverá nomes importantes da literatura contemporânea, como Jeferson Tenório, Ruy Castro, Natalia Borges Polesso, José Falero e Aline Bei, além de nomes que formam filas gigantescas para autógrafos, como Martha Medeiros e Fabrício Carpinejar. Serão 13 autores internacionais, 29 nacionais e 270 gaúchos somente na área adulta. Confira a programação completa aqui.
Pela primeira vez na história, a Câmara criou uma curadoria para literatura negra, posto assumido pela poeta e musicista Lilian Rocha. O objetivo é ampliar a diversidade étnico-racial dos autores presentes no evento e estimular o debate sobre raça e classe. Além disso, personalidades do mundo pop vão discutir temas pulsantes em uma sociedade em transformação, como a apresentadora Bela Gil falando sobre democratizar a alimentação saudável e Rita Von Hunty, personagem drag do ator Guilherme Terreri, refletindo sobre gênero, sexualidade e a história do movimento LGBT+.
— A produção trabalhou mais ainda para trazer gente para a Praça. A minha preocupação é que os editores consigam vender — diz Ledur.
Confira destaques da programação da 70ª Feira do Livro de Porto Alegre:
- 2/11, às 14h: Taiasmin Ohnmacht, autora de Uma Chance de Continuarmos Assim (2023, Diadorim), lança seu primeiro livro de poemas, Quimeras Feito Incensos (Bestiário, 2024). Na Sala O Retrato do Espaço Força e Luz;
- 2/11, às 17h30min: Participação do escritor alemão Guy Helminger, de Luxemburgo, autor de Rost (2021, Bestiário) e Nada É Suficiente (2022). Na Sala Noé de Melo Freitas do Espaço Força e Luz;
- 3/11, às 16h: O escritor Afonso Cruz, de Portugal, autor de O Vício dos Livros (Dublinense, 2024), conversa com a jornalista Fê Pandolfi no Auditório Barbosa Lessa do Espaço Força e Luz;
- 3/11, às 16h30min: O patrono da 70ª Feira do Livro de Porto Alegre, Sergio Faraco, vai conversar sobre sua carreira e produção literária. O bate-papo será conduzido por Lea Masina e Sergius Gonzaga e ocorre na Sala Noé de Melo Freitas no Espaço Força e Luz. Depois, às 18h, o escritor autografa seu novo livro de memórias, Digno É O Cordeiro (L&PM, 2024), na Praça de Autógrafos;
- 3/11, às 17h: O quadrinista Fredrik Strömberg, da Suécia, fala sobre quadrinhos e cultura na Sala O Retrato do Espaço Força e Luz;
- 3/11, às 17h30min: Feda Shtia, escritora da Jordânia e autora de Quatro Zero Oito (Editora Rua do Sabão, 2023), conversa com Anna Claudia Ramos no Auditório Barbosa Lessa do Espaço Força e Luz;
- 3/11, às 17h30min: o músico Vitor Ramil apresenta o livro A Primavera da Pontuação (Faria e Silva, 2024). Haverá pequena apresentação musical. No Teatro Carlos Urbim;
- 3/11, às 18h: O escritor argentino Santiago Craig, autor de Animais (Rua do Sabão, 2023), e a escritora uruguaia Fernanda Trías, autora de Gosma Rosa (Moinhos, 2022), conversam sobre literatura latino-americana com o mediador Ruben Daniel Méndez Castiglioni. O encontro ocorre na Sala O Retrato do Espaço Força e Luz;
- 6/11, às 16h: O escritor Gustavo Grandinetti fala sobre o livro O Passarinho do Contra (Alta Books, 2024), biografia que escreveu do poeta Mario Quintana. Na Sala O Retrato do Espaço Força e Luz;
- 6/11, às 17h30min: A apresentadora e chef de cozinha Bela Gil conversa com Elaine Maritza sobre o livro Quem Vai Fazer Essa Comida? Mulheres, Trabalho Doméstico e Alimentação Saudável (Elefante, 2023) e sobre os caminhos para democratizar a alimentação saudável no Brasil. No Teatro Carlos Urbim;
- 7/11, às 18h: A escritora Eliane Marques, autora de Louças de Família (Autêntica Contemporânea, 2023), conversa com Taiasmin Ohnmacht e Ana Dos Santos sobre literatura negra. O encontro ocorre na Sala O Retrato do Espaço Força e Luz;
- 7/11, às 17h30min: Rita Von Hunty, a persona drag do ator e professor Guilherme Terreri, conversa com Paula Taitelbaum sobre gênero, sexualidade e a história do movimento LGBT+ no Teatro Carlos Urbim;
- 8/11, às 9h: A escritora Kiusam de Oliveira, reconhecida por tratar de temas étnicos-raciais para o público juvenil, participa de encontro com alunos no Teatro Carlos Urbim;
- 8/11, às 15h30min: Poeta, ficcionista e dramaturgo, Cuti participa do bate-papo Ciclio Preto Sou — A Negritude na Poesia Brasileira Contemporânea, com Elizandra Souza, Ronald Augusto e Duan Kissonde, no Auditório Barbosa Lessa do Espaço Força e Luz;
- 9/11, às 16h: O poeta e tradutor mexicano Eduardo Langagne conversa com Leonardo Garzaro e Benhur Bortolotto sobre seu mais recente livro, A Mesa do Escriba (Rua do Sabão, 2024), no Auditório Barbosa Lessa do Espaço Força e Luz;
- 9/11, às 16h: O escritor e jornalista cultural uruguaio Pablo Silva Olazábal conversa com Luís Augusto Fischer e Andrea Barrios sobre o livro Conversas com Mario Levrero (Coragem, 2024), um guia para escritores em formação. O encontro será na Sala O Retrato do Espaço Força e Luz;
- 9/11, às 17h30min: A escritora Aline Bei, autora de O Peso do Pássaro Morto (Editora Nós, 2017) e Pequena Coreografia do Adeus (Companhia das Letras, 2021), encontra a poeta Mar Becker, autora de A Mulher Submersa (Urutau, 2020), Sal (Assirio & Alvim, 2022) e cova profunda é a boca das mulheres estranhas (Círculo de poemas, 2024) para falar sobre suas inspirações, desafios e processos criativos. O encontro ocorrerá no Auditório Barbosa Lessa do Espaço Força e Luz;
- 9/11, às 17h30min: Lilia Guerra, autora de O Céu para os Bastardos (Todavia, 2023), é a convidada dos Diálogos Literários e Antirracistas, com Winnie Bueno e Nathallia Protázio, na Sala Nóe de Melo Freitas do Espaço Força e Luz;
- 9/11, às 17h30min: A mestra zen Monja Coen e o escritor e poeta Fabrício Carpinejar se encontram para falar sobre amor e compaixão. O encontro será no Teatro Carlos Urbim;
- 10/11, às 17h30min: A escritora Claudia Piñeiro, da Argentina, autora de Catedrais (Primavera Editorial, 2024), conversa com Lu Thomé sobre corrupção, violência e temas obscuros que moldam suas obras no Auditório Barbosa Lessa do Espaço Força e Luz;
- 12/11, às 17h30min: Raízes Sustentáveis: os autores indígenas Daniel Munduruku, Auritha Tabajara e Yaguarê Yamã participam de bate-papo com mediação de Raquel Kubeo no Teatro Carlos Urbim;
- 14/11, às 17h30min: Fernanda Takai, vocalista da banda Pato Fu, encontra-se com Arthur de Faria e Katia Suman para um bate-papo sobre música. No Teatro Carlos Urbim;
- 15/11, às 15h30min: A escritora argentina Dolores Reyes, autora de Cometerra (Moinhos, 2022), conversa com Verena Cavalcante e Irka Barrios sobre suas obras e o impacto do horror no cotidiano. O encontro será no Auditório Barbosa Lessa do Espaço Força e Luz;
- 16/11, às 15h30min: O escritor argentino Fabián Restivo conversa com o ex-governador e ex-senador Olivio Dutra e com o tradutor Rogério Tomaz Jr. sobre seu livro Palavras para Depois: Conversas com Pepe Mujica (Coragem, 2024). O encontro ocorre no Auditório Barbosa Lessa do Espaço Força e Luz;
- 16/11, às 17h30min: O escritores Ruy Castro (O Ouvidor do Brasil: 99 Vezes Tom Jobim, Companhia das Letras, 2024) e Heloisa Seixas (O Livro dos Pequenos Nãos, Companhia das Letras, 2021) conversam com Arthur de Faria sobre suas trajetórias literárias no Auditório Barbosa Lessa do Espaço Força e Luz;
- 16/11, às 17h30min: Bate-papo com os escritores Marcelino Freire, autor de Contos Negreiros (Record, 2005), Jeferson Tenório, autor de O Avesso da Pele (Companhia das Letras, 2020), e José Falero, autor de Os Supridores (Todavia, 2020). Com mediação de Nanni Rios. O encontro ocorre no Teatro Carlos Urbim.