Em uma passagem de O céu de Lima, a jovem Georgina Hübner descreve, em uma carta de dezembro de 1904, a capital peruana como se estivesse no alto da catedral da cidade. Trata-se de um dos tantos trechos em que o escritor Juan Gómez Bárcena apresenta de de modo sensível e convincente a paisagem e o modo de viver da América Latina do início do século 20. Depois da leitura do romance, o que parece inverossímil é a descrição do autor na orelha do volume: Bárcena tem apenas 31 anos – e nem latino-americano é.
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Natural de Santander, na Espanha, o escritor estará na Feira do Livro para um bate-papo nesta sexta-feira, às 18h, na Sala Leste do Santander Cultural, seguido de autógrafos, às 20h, na Praça da Alfândega. Com formação em literatura, história e filosofia, Bárcena estreou na literatura com a reunião de contos Los que duermen (2012, ainda sem tradução no Brasil), cotado entre os melhores do ano em jornais como El Cultural e El Mundo. O céu de Lima, seu primeiro romance, também está fazendo uma boa carreira: lançado originalmente em 2014, já ganhou edições nos Estados Unidos, no Reino Unido, na Alemanha, na Itália e no Brasil – uma tradução para a Grécia já está em curso.
A narrativa é inspirada em uma história real, mas pouco conhecida, do poeta Juan Ramón Jimenez (1881 – 1958). Um dos maiores nomes da poesia espanhola, Jimenez foi enganado por dois boas-vidas peruanos, que escreveram cartas ao autor fingindo ser uma donzela que jamais existiu, a jovem Georgina Hübner. A partir desse mote, Bárcena desenvolve ficcionalmente a relação entre os estudantes peruanos José Galvez e Carlos Rodriguez, que iniciaram a correspondência falsa com o poeta apenas para conseguir um exemplar de seu mais novo livro, mas acabaram se envolvendo com a farsa profundamente.
Nas páginas do romance, o leitor mergulha no cotidiano limenho dos anos 1900, com sua rígida estratificação social, na qual raça, gênero e sobrenome eram determinantes da vida dos indivíduos – uma sociedade claustrofóbica até para os economicamente privilegiados.
No entanto, mais do que um retrato sobre o passado latino, O céu de Lima oferece uma original reflexão sobre o fazer literário. O romance avança na medida em que Galvez e Rodriguez se dão conta de que estão criando eles próprios uma grande personagem ficcional. Georgina cresce em importância não apenas para a vida de Jimenez, mas também para o dia a dia de seu próprios criadores – e de modo indomável.
É um romance valioso para quem procura melhor entender relações sociais que se repetem até hoje em todo o continente latino, além de refletir sobre o misterioso – e às vezes incontrolável – ofício criativo.
O céu de Lima
Juan Gómez Bárcena
Alfaguara, 248 páginas, R$ 44,90.
Encontro com o autor nesta sexta-feira, às 18h, na Sala Leste do Santander Cultural (Rua 7 de Setembro, 1.028).
Autógrafos às 20h, na Praça de Autógrafos.