Um dos grandes sucessos do cinema nacional, Nosso Lar foi lançado em 2010 e levou mais de quatro milhões de pessoas às salas de exibição, fixando-se entre as 30 maiores bilheterias do país. A produção, à época, apostou em efeitos especiais, o que não era — e ainda não é — comum por estas terras, misturando com a temática espírita, que fascina multidões país afora — mesmo que o Brasil tenha apenas 3% de pessoas que sigam a doutrina, segundo pesquisa Datafolha de 2020.
Agora, 14 anos depois, chega aos cinemas, nesta quinta-feira (25), a sequência Nosso Lar 2: Os Mensageiros, que adapta o livro Os Mensageiros, de 1944, psicografado por Chico Xavier tendo o espírito André Luiz como autor. Ou seja, a obra completa oito décadas no ano em que, por coincidência, ganha uma adaptação cinematográfica. E a expectativa do diretor e roteirista, Wagner de Assis, é tentar tocar o público da mesma forma que o longa-metragem de 2010 conseguiu, independentemente da religião.
Mas, afinal, o que instiga o público a consumir obras espíritas? E não é exagero em dizer que o tema é muito explorado no audiovisual nacional e, apenas nos últimos cinco anos, saíram nos cinemas títulos como Divaldo: O Mensageiro da Paz (2019), Predestinado: Arigó e o Espírito do Dr. Fritz (2022), Nada é Por Acaso (2022), Kardec: A História por Trás do Nome (2019) e Ninguém é de Ninguém (2023) — estes dois últimos dirigidos por Assis, que acredita que a questão da vida após a morte fascina as pessoas e, por isso, conversa com todos de maneira universal.
— A doutrina espírita estudou, codificou e desenvolveu a ideia de que a vida continua, através do trabalho do (Allan) Kardec, mas ela não é dona da ideia de que reencarnamos com propósitos específicos e de que existem espíritos nos protegendo. O grande desafio da humanidade é conhecer e expandir a sua consciência a respeito de si mesma como o espírito imortal que é. E isto, talvez, provoque transformações sociais nunca antes vistas. Um filme não faz isso, ele só conta história. Mas esse tema é atraente por conta disso — explica o cineasta.
Segundo Assis, pessoas do mundo inteiro que tiveram contato com Nosso Lar — com mídia física e streaming, a estimativa é de que mais de 50 milhões tenham assistido ao longa-metragem de 2010, em mais de 40 países. Mesmo os espectadores que não conhecem a doutrina espírita e Chico Xavier, de acordo com o diretor, se conectam com a história, pois ela fala de grandes temas da humanidade: quem somos? De onde viemos? Para onde vamos?
Anjos
No novo longa, André Luiz (Renato Prieto), personagem principal de Nosso Lar, entra para um grupo de espíritos que têm a missão de ser mensageiros. Eles são liderados por Ancieto (Edson Celulari), que se torna o protagonista da nova aventura. Os seres de luz, que atuam como anjos, partem para a Terra para acompanhar uma missão que tem o risco de fracassar. O propósito é ligar o mundo espiritual e a Terra por meio de três pessoas: Otávio (Felipe de Carolis), um jovem médium, Isidoro (Mouhamed Harfouch), um líder de casa espírita, e Fernando (Rafael Sieg), um empresário.
A história se passa nos anos 1940, década em que o livro Os Mensageiros foi lançado — o que gera um interessante contraste entre a direção de arte que remonta à época com o cenário futurista e carregado de efeitos visuais da cidade espiritual Nosso Lar, que sobrevoa a Terra. Porém, segundo a equipe do longa-metragem, a narrativa poderia ser transferida para qualquer década, pois a trama é atemporal.
— O Aniceto desce, com outros mensageiros, como anjos, para colaborar na transformação de famílias, de pessoas que estão ali, tentando evoluir. Isto poderia ser em qualquer momento, em qualquer lugar do mundo. Isso que é bacana, porque a proposta é a reflexão sobre a condição humana. E isso atravessa o espaço e o tempo. A gente vê que a história do filme é maior do que a doutrina espírita, ultrapassa — afirma Edson Celulari, em entrevista para GZH.
O ator ainda ressalta que Nosso Lar 2: Os Mensageiros busca contar uma história com final feliz, para dar esperança às pessoas. Os 14 anos que separam o primeiro do segundo filme proporcionou uma mudança na audiência que, inclusive, viveu uma pandemia neste espaço de tempo:
— Acho que o público de hoje precisa até mais dessa mensagem, dessas histórias, desses personagens. Atualmente, a gente vê muita coisa radical, ruim, ódio. O filme traz uma reflexão sobre outros valores.
Outro plano
A questão da vida e da morte, que é tratada como apenas uma etapa da evolução espiritual, dentro da proposta do filme, é representada por diversos personagens, que encarnam e desencarnam, ocupando o plano astral ou terreno. Um exemplo é Isis, interpretada por Fernanda Rodrigues, que transita entre as realidades, mostrando os dois lados da vida.
— Foi muito legal viver a Isis, mas, ao mesmo tempo, muito desafiador. Não me inspirei em ninguém em específico, porque ela vive e morre, vive e morre, vive e morre, então foi uma coisa instintiva que fui tentando criar. Tentando ficar bem focada na história que a gente precisava contar — ressalta a atriz, que contou com transformações promovidas por maquiagem, figurino e, claro, interpretação para o desafio.
Mas representar quem está vivo e quem está morto em Nosso Lar 2: Os Mensageiros vai além. A produção também utiliza efeitos visuais para fazer a distinção, tirando a cor dos personagens ou, então, colocando mais brilho neles. Tudo depende em que estágio do desencarne eles estão. Parece simples, mas, de acordo com Wagner de Assis, é um processo trabalhoso e que precisa explorar o que é feito no cinema estrangeiro:
— A gente procurou usar o efeito visual somente quando necessário, mas acabou sendo preciso em 90% do filme. Mas ele não é o protagonista, só vem ajudar para indicar quem está vivo, quem está morto, ou quando você precisa mostrar que está em uma cidade pairando sobre o planeta Terra. É sempre um desafio, porque a gente não lida com as mesmas realidades de quem usa efeitos visuais nesta proporção e com valores absolutamente diferentes. Espero que a gente tenha conseguido que o efeito ajude a contar a história, que é humana e, também, sobre seres espirituais.
O diretor já adianta que vem mais por aí: Nosso Lar 3, 4 e 5 já estão sendo preparados e devem ganhar as telas nos próximos anos. Assim, no que diz respeito à cinema com a temática espírita, tanto o mundo terreno quanto o astral estarão bem servidos.